Folha de S.Paulo

Temer evita noticiário e altera rotina por medo de ‘efeito Sarney’

Com coberturas negativas para o governo, presidente se informa via relatórios de sua equipe

- MARINA DIAS

Prioridade dele tem sido fazer articulaçõ­es para não repetir caso do expresiden­te, que acabou gestão sem força política

Virou costume. Quase um ritual. Quando televisore­s e jornais dentro do Palácio do Planalto começam a priorizar notícias negativas para o governo, o presidente da República decide criticá-los ou, até mesmo, abandoná-los de vez.

Foi assim com Fernando Collor, que às vésperas da votação de seu impeachmen­t disse que a televisão servia apenas para “poluir sua cabeça”, com Fernando Henrique Cardoso, que classifica­va os jornais como “desastroso­s”, e com Luiz Inácio Lula da Silva e Dilma Rousseff.

A petista deixou de acompanhar tudo que lia sobre o Brasil —de colunas de opinião a revistas estrangeir­a— depois da Copa do Mundo de 2014, quando a crise de seu governo começou a recrudesce­r.

Não foi diferente com Michel Temer. Antes audiência assídua da maior parte dos jornais e revistas do país, o presidente tem diminuído a leitura que fazia dos principais veículos de imprensa e se informado com o resumo de relatórios elaborados por sua equipe de comunicaçã­o.

Com reportagen­s e análi- ses adversas para o governo desde maio do ano passado, quando a delação da JBS veio a público implicando-o diretament­e, Temer diminuiu o tempo dedicado às notícias diárias e se aprofundou nas articulaçõ­es para que não seja alvo do que auxiliares têm chamado de “efeito Sarney”.

“Ninguém gosta de noticiário negativo, ainda mais quem foi vítima de ‘fake news’ ou de ‘ilação news’ para derrubá-lo. Não se pode ficar feliz com meses de uma exploração midiática dessa”, diz Elsinho Mouco, marqueteir­o do governo, referindo-se às denúncias apresentad­as pela Procurador­ia-Geral da República.

“Agora, na média, Temer aceita o noticiário com serenidade. Ele sabe que quem tem coragem de mudar é criticado e demora a ser compreendi­do”, completa Mouco.

O presidente, porém, não quer parecer alienado e instalou alertas em seu smartphone que o avisam das notícias de última hora. No mais, prefere conversas com ministros, senadores e deputados, geralmente com a TV de seu gabinete desligada.

Os baixíssimo­s índices de popularida­de e as poucas chances de aprovar sua principal bandeira, a reforma da Previdênci­a, fizeram com que assessores passassem a temer que o presidente não tenha poder político suficiente para chegar ao fim do mandato com alguma influência eleitoral.

Ministros avaliam que, na ânsia de não ficar isolado na formação de uma aliança de centro, Temer tem feito movimentos erráticos e pode terminar como o ex-presidente José Sarney (1985-1990).

Alçado ao Planalto após a morte de Tancredo Neves, Sarney encontrou seu auge em 1986, com o Plano Cruzado. Após o fracasso das medidas, no entanto, terminou o governo com popularida­de baixa, reações negativas do mercado e sem força política —nem mesmo o candidato de seu partido, Ulysses Guimarães, defendeu seu mandato.

Assessores de Temer querem evitar repetir o histórico. NA PRÁTICA O presidente tem se movimento para tentar mostrar que ainda é capaz de liderar um bloco de centro-direita.

Publicamen­te, colocou restrições a uma possível candidatur­a do ministro da Fazenda, Henrique Meirelles (PSD), e tentou erguer barreiras às articulaçõ­es do presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM), enquanto ensaiava uma reaproxima­ção com Geraldo Alckmin (PSDB) —os três disputam o posto de candidato ao centro que pode ser apoiado pela coalizão governista.

O tucano, porém, não dá indícios de que se venderá como o nome do Planalto. Mas trabalha para ter as siglas da base de Temer em sua órbita.

Na outra ponta, a avaliação de aliados de Meirelles é a de que Maia conseguiu capitaliza­r melhor o debate da reforma da Previdênci­a. Se ela for aprovada, o deputado consegue surfar o sucesso da articulaçã­o do governo. Caso contrário, pode transferir o ônus do fracasso ao Planalto. Folha,

 ?? Bruno Santos - 18.jan.2018/Folhapress ?? O presidente Michel Temer (MDB) em seu escritório no Itaim Bibi, zona oeste de São Paulo
Bruno Santos - 18.jan.2018/Folhapress O presidente Michel Temer (MDB) em seu escritório no Itaim Bibi, zona oeste de São Paulo

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Brazil