Folha de S.Paulo

Historicam­ente, a Caixa tem sido crucial na execução de políticas econômicas e sociais

- FLAVIA LIMA

A Caixa não precisa de dinheiro novo para continuar emprestand­o neste ano e, talvez, nem mesmo em 2019, dizem especialis­tas e integrante­s do próprio governo.

Segundo fontes que acompanham de perto a questão, a capitaliza­ção de R$ 15 bilhões do banco com recursos do FGTS (Fundo de Garantia do Tempo de Serviço) teria como objetivo apenas elevar o crédito em ano eleitoral.

O presidente Michel Temer sancionou o socorro ao banco com recursos dos trabalhado­res no início de janeiro.

De lá para cá, a discussão sobre a liberação foi encoberta pelo escândalo envolvendo parte do comando do banco, acusado de corrupção.

O episódio acabou expondo o embate entre aliados do governo, que pressionam pelos recursos em ano de eleição, e membros da equipe econômica, contrários à capitaliza­ção, mesmo após mudança do estatuto do banco, que endurece as regras para a escolha de seus dirigentes.

“Olhamos os números e temos convicção que a Caixa não precisa de recurso nenhum”, diz fonte do governo.

Analistas da agência de risco Fitch, Claudio Gallina e Esin Celasun, concordam. “Provavelme­nte a Caixa não precisará de aporte em 2018, mesmo que não venha o dinheiro do FGTS.” AJUSTE Em longo relatório sobre a Caixa ao qual a Folha teve acesso, a Fitch diz que, mesmo em 2019, quando o banco terá que se ajustar às regras de Basileia 3 (acordo internacio­nal que busca dar mais solidez ao sistema financeiro), a necessidad­e de aporte não é dada como certa.

Ela dependeria de variáveis como rentabilid­ade do banco, apetite por crédito, revisão de custos e volumes de dividendos pagos à União.

Consultada, a Caixa disse que se esforça para elevar seu capital próprio, mas, segundo indicadore­s atuais, não se enquadrari­a na regra externa. Por esse motivo, afirma, o governo editou o projeto de lei que autoriza o repasse.

Segundo a Fitch, lucros futuros e amortizaçã­o de empréstimo­s existentes podem ajudar o banco a se enquadrar. Caso tenha problemas para atender exigências externas em 2019, diz, a Caixa tem ativos que poderia vender para reforçar o capital, como participaç­ões em subsidiári­as como a de seguro.

No imbróglio, além das interferên­cias político-partidária­s, está em jogo a redefiniçã­o do tamanho da Caixa.

Fonte do governo garante que a Caixa não precisa de recursos novos, desde que deixe aos poucos de atuar em linhas como crédito a veículos e privilegie a sua maior vocação: o crédito imobiliári­o.

O financiame­nto imobiliári­o tem 60% da carteira de crédito da Caixa, seguido por saneamento e infraestru­tura (11,4%), que ganha relevância ano após ano, e pelo consignado (9%), dentre outros. BAIXA RENDA relacionad­as à concessão de crédito para a população de mais baixa renda.

Justamente por focar créditos com menor risco — como o imobiliári­o—, a rentabilid­ade da Caixa é, em geral, menor que a de outros bancos grandes, explica a Fitch.

Após dois anos muito difíceis, o lucro líquido do banco subiu 80% para R$ 6,2 bilhões em 2017, até setembro.

A Fitch não descarta, porém, que calotes de empresas ameacem o lucro do banco.

Em março de 2017, o maior empréstimo da Caixa equivalia a 18% do seu patrimônio líquido, de R$ 65 bilhões.

A consultori­a GO Associados lembra que a Caixa não tem apresentad­o prejuízo contábil, mas algumas operações resultaram em perdas.

Em 2016, a Caixa provisiono­u R$ 700 milhões para cobrir o risco de calote da Sete Brasil, criada para fornecer sondas para exploração do pré-sal. Além disso, funcionári­os e aposentado­s da Caixa têm entrado com ações na Justiça pela má gestão da Funcef, fundo de previdênci­a dos servidores da estatal. Um dos piores investimen­tos foi justamente a Sete Brasil.

Caso fracasse na tentativa de votar a reforma da Previdênci­a em fevereiro, o governo trabalha com a hipótese de fazer um último esforço de aprovação, ainda na gestão Michel Temer, em novembro.

O plano A, tanto da área econômica como do Planalto, segue sendo fevereiro. Mas a alternativ­a B vem se cristaliza­ndo em conversas, ainda que não seja consensual.

Na hipótese de o novo presidente não ser contra a reforma, governista­s acreditam que haverá uma última janela, pois parte da base aliada não conseguirá se reeleger.

Assim, perderia efeito o discurso de que não dá para votar algo impopular temendo a punição nas urnas. Segundo o Departamen­to Intersindi­cal de Assessoria Parlamenta­r, nas últimas cinco eleições a renovação média da Câmara foi perto de 45%.

Nesse lago de 230 nomes, o governo precisaria pescar os 50 votos que, segundo suas contas, faltam para atingir os 308 necessário­s para aprovar a reforma em primeira votação. Um segundo turno na Câmara e mais duas rodadas no Senado viriam a seguir.

Um auxiliar de Temer, muito próximo dos trâmites congressua­is, é cético sobre essa leitura, acreditand­o que é melhor ganhar ou perder em fevereiro, para no mínimo obrigar o debate sobre a Previdênci­a na campanha.

Por óbvio, a hipótese de novembro demanda apoio ao Após mais de um ano de testes, a varejista Amazon abrirá, em Seattle, nos EUA, uma loja de conveniênc­ias em que a cobrança dos produtos é feita automatica­mente, apenas por meio de sensores e câmeras que acompanham o que os clientes retiram das prateleira­s

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menos tácito do eleito para o Planalto. Como diz um outro ministro, se o presidente eleito não disser nem sim, nem não, a senha estará dada.

O calvário da reforma da Previdênci­a, vista como essencial para atacar o problema fiscal do país nos médio e longo prazos, se arrasta desde a posse de Temer em 2016.

O presidente fez avançar a agenda e tinha sua aprovação provável no primeiro semestre de 2017. Mas a eclosão do escândalo da JBS, com Temer sendo gravado pelo empresário Joesley Batista, embaralhou o cenário em maio.

O emedebista conseguiu derrubar na Câmara duas denúncias da Procurador­ia-Geral da República, mas a operação custou-lhe o capital político. A reforma ficou, então, em banho-maria.

Aliados do governo temem o impacto de disputas na base sobre as negociaçõe­s. O ministro Henrique Meirelles (Fazenda, PSD) e Rodrigo Maia (DEM), o presidente da Câmara, buscaram ocupar espaços para viabilizar suas candidatur­as ou cacife político nas composiçõe­s para a disputa do Planalto. Com isso, Maia passou a disputar a paternidad­e da reforma.

O rebaixamen­to da nota de crédito do Brasil pela agência Standard & Poor’s alimenta esperanças. O fato de a agência ter apontado o dedo para o Congresso ao justificar a medida repercutiu mal — resta saber se o suficiente para fazê-lo votar reforma. A Caixa e o Banco do Brasil começam a pagar nesta segundafei­ra (22) os correntist­as que têm direito a valores depositado­s no fundo PIS/Pasep. O governo reduziu a idade mínima para acessar os recursos do fundo de 65 para 60 anos, para tentar estimular os saques.

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