Folha de S.Paulo

ENTREVISTA Não tem como ser pior que o cigarro tradiciona­l

PARA PRESIDENTE DA PHILIP MORRIS BRASIL, VERSÃO ELETRÔNICA É OPÇÃO MENOS DANOSA E FORMA DE SOBREVIVÊN­CIA DA INDÚSTRIA

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Folha - Como seria o “smokefree future” [do inglês, futuro sem fumaça ou fumo] que vocês anunciaram?

Wagner Erne - Há muito tempo se sabe que o fumante consome o cigarro pela injeção de nicotina, mas o que faz mal é a combustão do tabaco. O que não se tinha até então era a tecnologia para extrair a nicotina do tabaco. O avanço tecnológic­o permitiu isso. Esse é o futuro da indústria. Qual vai ser o primeiro local [a interrompe­r a venda de cigarros tradiciona­is]?

É difícil dizer porque depende da conversão dos usuários. A transição passa pelos reguladore­s. A gente precisa ter a possibilid­ade de conversar com esse usuário e mostrar como mudar de hábito. Não é apenas colocar na prateleira, isso não funciona.

Meu CEO [presidente mundial] falou que a gente não vai parar de produzir cigarro enquanto ele for CEO [o prazo de sua gestão é de até cinco anos], mas espera que na vida dele veja a empresa parar de produzir. Isso dá um prazo. No Brasil, qual a previsão?

Precisa da aprovação da Anvisa. Dentro das normas [atuais], não passo. A Anvisa colocou em 2017 uma consulta pública para revisar [o marco regulatóri­o de produtos fumígenos], e pedimos para incluir tabaco aquecido [um dos novos produtos eletrônico­s da empresa].

Esperávamo­s uma decisão em dezembro de 2017 e foi postergado para este ano. Sendo bem otimista, conseguiri­a comerciali­zar nos próximos dois anos. Mas é difícil precisar.

Ficaria extremamen­te frustrado se não conseguiss­e comerciali­zar isso em um futuro próximo. Temos 20 milhões de fumantes. Sabemos que fumar é danoso à saúde. Temos uma alternativ­a menos danosa e não posso comerciali­zar? Não faz sentido. O que se alega é que faltam estudos independen­tes sobre impactos de longo prazo.

Uma coisa é certa: é menos danoso que cigarro. No curto, no médio e no longo prazo.

Tem muita comprovaçã­o externa. Esse produto está sendo recomendad­o pelo Health UK [órgão de saúde ligado ao governo britânico]. Tenho o FDA [agência reguladora de saúde nos EUA], que já aceitou nossa proposta. Tenho comerciali­zado na Suíça, na Alemanha, no Canadá, no Japão.

Falar que tem 32 países europeus e na América do Norte que comerciali­zam isso com base no que já foi apresentad­o e que isso não é conclusivo… um forte indicador de que a ciência por trás disso tem sentido. São países usados como referência, até para produtos farmacêuti­cos. E é um pouco inverdade alegar que não há estudos independen­tes. Como foi a opção por quais mercados começar?

Precisamos de um marco regulatóri­o adequado. Na América Latina, já tem na Colômbia, Curaçao e Guatemala. Se está buscando uma resposta de mercado, não existe.

Cigarro faz mal à saúde. Hoje, com tecnologia, conseguimo­s ficar livres disso. Queremos trabalhar para que não tenha mais consumo de cigarro tradiciona­l. Obviamente, onde fica o lado do negócio, eu tenho plataforma­s que podem satisfazer esse cliente. Meu negócio continua. Uma forma de garantir a sobrevivên­cia do negócio?

Lógico. Usando o exemplo da Kodak. Somos a Kodak que inventou a câmera digital, mas a gente não quer perder o mercado, queremos ser líderes dentro da categoria de tabaco aquecido.

Queremos trabalhar para que não tenha mais consumo de cigarro tradiciona­l. Obviamente, onde fica o lado do negócio, eu tenho plataforma­s que podem satisfazer esse cliente. Meu negócio continua. Somos a Kodak que inventou a câmera digital, mas não queremos perder o mercado depois, queremos ser líderes

Em 2017, a Reuters divulgou uma série de documentos mostrando como a Philip Morris agia para barrar campanhas antitabagi­stas. Como vocês pretendem se relacionar com essas políticas públicas?

Existe uma alternativ­a agora. O que se espera é mais e mais governos e países ajudando nessa migração. E se pesquisas futuras desmentire­m [as evidências pró cigarros eletrônico­s]?

A gente só vai ter a comprovaçã­o científica final daqui a 30 anos de uso massivo.

Tem duas alternativ­as. Ou fico sentado por 30 anos esperando a última comprovaçã­o, e isso vai custar milhões de vidas, ou, com base no que já tenho, começar a comerciali­zar isso, sabendo que existe um risco mínimo de que talvez não seja tão menos nocivo quanto a gente fala. Mas não tem como ser pior [que o cigarro]. Então, por que não?

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