Na Polônia, teatro volta à resistência, diz encenador
Aos 74, saudado como um dos maiores diretores teatrais na Europa, Krystian Lupa está acuado na Polônia. O governo do partido Lei e Justiça vem cercando as artes e outros setores, a ponto de o país estar sob ameaça de suspensão de seus direitos na União Europeia.
“As autoridades vão apagando teatros progressistas em nome da implantação de uma política cultural cada vez mais agressiva, que trata a arte como um instrumento de propaganda”, afirma em entrevista à Folha.
Na MITsp, Lupa apresenta “Árvores Abatidas”, adaptado do romance do austríaco Thomas Bernhard (193189). O espetáculo faz “uma vivissecção do conformismo dos artistas que facilitam aos políticos populistas manipular o clima social”. vão apagando teatros progressistas em nome da implantação de uma política cultural cada vez mais agressiva, que trata a arte como um instrumento de propaganda dos valores defendidos por essa política. Nas instituições culturais, museus, teatros, acontece uma substituição de diretores, que começaram a procurar artistas colaboracionistas para implementá-la.
O território da atuação dos artistas que lutam pelo progresso da arte e da liberdade de expressão artística está cada vez mais reduzido. Varsóvia, a cidade que até agora não foi dominada pelo Lei e Justiça, se tornou uma ilha dessa resistência artística. O teatro realizou na Polônia e noutros países um esforço de educação da sociedade, em favor do multiculturalismo, da Europa unificada. Esse esforço se perdeu? dos mais importantes centros de teatro progressista no país, foi criada, como forma de protesto contra esse tipo de ação do ministério da Cultura, a Guilda [associação] dos Diretores, que fez o boicote dos resultados do concurso e, em consequência, da nova diretoria. Qual foi o efeito?
Como consequência, as obras criadas em teatros favoráveis ao Lei e Justiça têm um nível vergonhosamente baixo e não têm público, porque ele também boicota as ações culturais das autoridades. Então, essa política acaba caindo no vazio.
Mas no longo prazo o boicote não vai ser o bastante. Os artistas livres devem unir forças e criar obras mais radicais, que lutem pelo homem livre e progressista, pela continuação da evolução humanista. A montagem de “Árvores Abatidas”, com aquele encontro de artistas e intelectuais, dialoga com essa situação, na Polônia e na Europa? aos políticos populistas manipular o clima social. É um lembrete sobre a missão do artista, que deve consistir em ser intransigentemente fiel à verdade humana e artística. Sobre a missão de permanecer na vanguarda do gene humanista da evolução da humanidade.
O que está em jogo hoje é especialmente importante: O descarrilamento da sociedade do caminho de desenvolvimento fará com que caia no abismo de processos negativos que podem levar a mais um desastre. Thomas Bernhard é muitas vezes crítico do catolicismo, em suas obras. Isso está presente no espetáculo? com as que não conhecemos, prestaríamos mais atenção na musicalidade.
É, por fim, um processo de escuta o que o diretor busca nos espectadores. “Os discursos não são fechados, estão abertos à interpretação de cada um. Mas, deslocando essas palavras, fazemos com que o público as escute de maneira diferente, chamamos a sua atenção para o que é dito.”
Para Lacoste, é nessa falta de escuta que se pautam muitos movimentos extremistas hoje em acensão não apenas na Europa, mas em países como os Estados Unidos.
“Hoje, com o aumento da produção de vídeos e a internet, a comunicação política está ficando cada vez mais oral. Há muito menos gente lendo, e fica muito mais difícil refletir sobre o conteúdo desses discursos.” DEZ DIAS Além de apresentar seu espetáculo, o francês fará na MITsp um ateliê, voltado a artistas, sobre sua pesquisa com discursos sonoros e participará de uma conversa com o brasileiro Nuno Ramos no dia 5/3, no Itaú Cultural.
A programação da mostra, que vem se firmando como um dos principais eventos do calendário teatral paulistano, reúne outras oito montagens de nomes de peso das artes cênicas mundiais, como o polonês Krystian Lupa e o suíço Christoph Marthaler (leia acima e ao lado). Muitas investigam questões como história, identidade, musicalidade e discurso.
Esta edição também terá a estreia, ainda em caráter experimental, da MITbr – Plataforma Brasil, que pretende auxiliar na exportação de espetáculos brasileiros. São 12 produções nacionais, legendadas em inglês, para serem assistidas por programadores de festivais estrangeiros —as sessões serão abertas ao público.
Há ainda debates, oficinas e projetos como o Audioreflex, um audiotour sobre imigração e identidade que poderá ser feito no Museu da Imigração.