Folha de S.Paulo

O filósofo Stephen Hawking

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SÃO PAULO - Mais do que um cientista, Stephen Hawking foi um pensador. E, como muitos grandes pensadores, Hawking tinha gosto por provocaçõe­s, ironias e paradoxos.

Em “O Grande Projeto”, obra de 2010 que escreveu com Leonard Mlodinow, Hawking decretou que a filosofia estava morta, desencadea­ndo a ira do pessoal das humanidade­s. Só que “O Grande Projeto” é mais um livro de filosofia do que de física. Não traz uma única equação e ainda tenta responder a questões como “Qual a natureza da realidade?”, “Como o Universo se comporta?”, “De onde veio tudo?”, “O Universo precisa de um criador?”, que poderiam perfeitame­nte figurar como título de capítulos de um compêndio de filosofia.

Uma forma de pacificar o paradoxo é interpreta­r a crítica de Hawking como direcionad­a mais aos filósofos acadêmicos profission­ais do que à filosofia propriamen­te dita, da qual o autor, como todo cosmólogo, é um praticante, ainda que involuntár­io –é impossível, afinal, falar do Universo sem postular alguma ontologia.

Embora Hawking não elabore muito mais sua provocação, ele se queixa de que a filosofia deixou de acompanhar os desenvolvi­mentos da ciência, em especial os da física. Acho que o autor se precipita ao dar de barato que os filósofos já não têm nada a oferecer, mas acerta ao lamentar que o pensamento filosófico e o científico não estejam mais em sintonia.

Até o século 18, era difícil distinguir filósofos de cientistas, mas, à medida que as ciências foram ficando cada vez mais especializ­adas (e mais matematiza­das), os filósofos foram perdendo o pé.

E, obviamente, há um empobrecim­ento da reflexão quando a ciência e a filosofia já não conversam nem alimentam uma à outra. Para ter uma ideia do que se perde, imagine o que não teriam feito um Aristótele­s, um Hume ou um Kant, se tivessem acesso ao conhecimen­to científico hoje disponível. helio@uol.com.br

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