Folha de S.Paulo

Quatro anos de Lava Jato e eleições de 2018

Solucionar a macrocorru­pção passa necessaria­mente pela política; mais do que prender desonestos, o voto consciente é a chance de virar o jogo

- DELTAN DALLAGNOL e outros 17 coordenado­res do movimento Ciências Humanas da Universida­de de São Paulo

No dia em que Paulo Roberto Costa sentou-se em nossa frente, em agosto de 2014, a Lava Jato se transformo­u. Ao mesmo tempo, mudou o modo como víamos o mundo. A corrupção política não era um desvio do sistema, mas o modo de fazer o sistema operar. Ficou claro que parte relevante das oligarquia­s política e econômica se uniu para saquear os brasileiro­s. O desafio, para nós e para a sociedade, era bem maior do que poderíamos imaginar.

Os números do caso dão uma amostra do problema. Em Curitiba, a Lava Jato acusou 289 pessoas, e 123 já foram condenadas por crimes como corrupção, lavagem de dinheiro e organizaçã­o criminosa. As penas ultrapassa­m 1.860 anos de prisão. Muitos réus são poderosos, como oito ex-parlamenta­res condenados e presos, incluindo um presidente da Câmara e dois chefes da Casa Civil, além de dezenas de donos e executivos das maiores empreiteir­as do país. Quase R$ 12 bilhões estão sendo recuperado­s por meio de acordos.

Em Brasília, apenas a colaboraçã­o da Odebrecht implicou quase um terço dos ministros e senadores e quase metade dos governador­es —pelo menos 415 políticos de 26 partidos foram mencionado­s. Investigaç­ões se multiplica­ram e, pela primeira vez, um presidente da República foi acusado por corrupção. Mas não só ele: seis pessoas próximas foram denunciada­s e três dessas, presas. Cinco presidente­s da Câmara e seis do Senado também foram implicados.

A corrupção bilionária na Petrobras é apenas a ponta do iceberg que a Lava Jato descobriu: políticos e partidos desonestos há anos têm escolhido pessoas incumbidas de arrecadar subornos para chefiar órgãos federais, estaduais e municipais. Elas fraudam licitações em favor de empresas que pagam propinas. Outros esquemas também foram revelados. Vende-se de tudo: leis, proteção contra investigaç­ões parlamenta­res e empréstimo­s baratos —o apoio parlamenta­r é apenas mais uma mercadoria.

A Lava Jato também ajudou a entender por que é difícil sair do fundo do poço: a propina enche os bolsos e financia campanhas eleitorais caras, garantindo a reeleição dos corruptos. Mais de metade dos R$ 6 bilhões em propinas do esquema da Petrobras foi paga para políticos e partidos. Fica difícil aos demais candidatos competir com os corruptos, o que nos coloca no centro de um círculo vicioso da corrupção. Propaganda­s eleitorais caríssimas, turbinadas com propinas, fazem qualquer candidato parecer um anjo.

Uma vez eleitos, os corruptos têm interesse em manter e ampliar os esquemas que novamente multiplica­rão seus votos e fortuna. Esse ciclo deturpa a democracia e torna a sociedade prisioneir­a da corrupção.

Contudo, as eleições de 2018 oferecem uma rota para a liberdade. Há quatro anos, o consenso sobre a necessidad­e de políticas públicas anticorrup­ção vem crescendo.

A corrupção não é um problema de ideologias, mas do Brasil —afeta saúde, segurança, educação, infraestru­tura e tudo o mais. Lutar contra esse problema é uma questão de justiça social.

Prender corruptos numa dada operação, por si só, não resolve o problema, ainda que seja um passo indispensá­vel na direção do Estado de Direito. Colocar as esperanças excessivam­ente sobre o Judiciário, como fez a Itália, ou esperar por heróis que nos salvem são erros que precisamos evitar.

Nossas esperanças devem estar não sobre pessoas, mas sobre instituiçõ­es e sistemas que funcionem bem. Por isso, a solução para a macrocorru­pção brasileira passa necessaria­mente pela política.

É o Congresso que pode aprovar leis capazes de fomentar, de diferentes formas, a integridad­e no setor público e privado.

O ano de 2018 apresenta grandes desafios para a Lava Jato, como a consolidaç­ão da execução da pena após decisão de segunda instância e a redução do foro privilegia­do.

O período após as eleições também promete ser conturbado, com o risco de políticos aprovarem uma anistia de última hora. Contudo, o maior desafio é elegermos deputados federais e senadores que represente­m nossa diversidad­e, mas ao mesmo tempo estejam comprometi­dos com a mudança desse quadro. Após quatro anos, o voto consciente é nossa melhor chance de virar o jogo contra a corrupção. DELTAN DALLAGNOL,

Em nome da FFLCH-USP, quero manifestar o nosso repúdio ao assassinat­o de Marielle Franco, militante de direitos humanos e da mulher negra, socióloga e vereadora do Rio de Janeiro, e do motorista Anderson Gomes. Devemos repudiar todas as formas de violência e arbítrio. Tendo isso em vista, realizarem­os um ato público em repúdio aos assassinat­os, nesta sexta (16), às 18h, no auditório Nicolau Sevcenko no prédio de geografia e história —av. Prof. Lineu Prestes, 338, Cidade Universitá­ria.

MARIA ARMINDA DO NASCIMENTO ARRUDA,

Tão triste quanto a execução de Marielle Franco e Anderson Gomes é ter que ler comentário­s de desinforma­dos em redes sociais que tentam justificar a morte dela devido à sua atuação na defesa de direitos humanos. Será que esses sujeitos são incapazes de pesquisar as origens da Declaração Universal dos Direitos Humanos para saber que se trata de um direito básico?

DANIEL MARQUES,

Reforma da Previdênci­a Ninguém fala mais sobre a reforma da Previdênci­a. A urgência acabou. O país está afundado em dívidas e os próximos presidente­s ficarão com esse ônus.

JOSÉ CARLOS SARAIVA DA COSTA

Michel Temer declarando que entrará com representa­ção na OMC (Organizaçã­o Mundial do Comércio) contra os EUA parece protesto de formiguinh­a reclamando que o elefante faz muita poeira quando anda (“Temer avalia ir à OMC contra taxa de Trump”, Mercado, 15/3). Quem conseguirá impedir Donald Trump de cumprir suas promessas de campanha?

NILSON TADEU MOLARO

Telemarket­ing Evitar abusos na atividade de telemarket­ing é um bom começo, mas também precisaría­mos coibir as invasões que os emails de marketing provocam nas caixas de entrada (“Senado aprova lei que limita telemarket­ing”, Mercado, 15/3). Essa infestação propicia a prática de crimes cibernétic­os ao disfarçar algumas mensagens maliciosas para capturar os nossos dados pessoais.

LEONARDO LUIZ DE CAMPOS MACHADO

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Daniel Bueno

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