Criticados, juízes dizem que greve não foi só sobre auxílio
Paralisação teve adesão de 62% dos magistrados federais, afirma entidade
Sob críticas de defender privilégios, movimento grevista se apresentou sob ataque de interesses da classe política
Após serem criticadas por convocar uma greve supostamente em defesa de privilégios, associações de juízes federais adaptaram nesta quinta (15) o discurso para tentar desvincular o movimento da manutenção de benefícios como o auxílio-moradia.
A mobilização foi convocada no dia 1º de março como protesto contra a possibilidade de revisão do benefício pago aos juízes. A questão será discutida pelo Supremo Tribunal Federal no próximo dia 22. A tendência é que a corte restrinja os pagamentos.
A pauta, porém, acabou “diluída” em meio a outras bandeiras. Citando a Operação Lava Jato, juízes disseram que a classe está sob ataque por ir contra interesses da classe política e lembraram o projeto de lei que prevê punição a magistrados e integrantes do Ministério Público por abuso de autoridade.
Em São Paulo, em uma reunião com 150 juízes e procuradores, representantes de associações falaram que o ato era uma manifestação contra ameaças ao Judiciário. Segundo eles, a manutenção do auxílio-moradia era só uma das várias reivindicações.
Entre as entidades presentes estavam a Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe) —principal mobilizadora—, a Associação Nacional dos Magistrados do Trabalho (Anamatra), a Associação Nacional dos Procuradores da República (ANPR) e a Associação Nacional dos Procuradores do Trabalho (ANPT).
“Nós estamos defendendo a nossa independência funcional, a nossa liberdade de atuação e a nossa dignidade remuneratória”, afirmou o desembargador Carlos Delgado, diretor da Ajufe.
As associações reclamam de defasagem salarial de 40% desde 2005 e dizem que isso Total: 30 mil vai contra a Constituição, que prevê ajuste salarial anual.
“Essa mobilização não é uma defesa de privilégios, [...] de salários de marajás”, disse Bruno César Lorencini, da Associação dos Juízes Federais de São Paulo e Mato Grosso do Sul (Ajufesp).
O juiz Marcelo Pallone, da Associação dos Magistrados do Trabalho da 15ª Região (Amatra 15), afirmou que o movimento “vai muito além de uma insurgência qualquer com a possível perda da ajuda de custo para moradia”.
O recebimento de auxíliomoradia por um juiz que possui imóvel na cidade onde trabalha não é ilegal, mas provoca questionamentos. Na prática o valor é incorporado ao salário do magistrado, mas não conta para o teto constitucional dos vencimentos do setor público, de R$ 33.763.
No Rio, cerca de cem juízes se reuniram em um prédio da Justiça Federal no centro da cidade, perto de onde centenas de manifestantes protestavam contra a morte da vereadora Marielle Franco (PSOL). Lideranças reforçaram o discurso de que a mobilização era uma resposta ao “ataque velado” contra o Judiciário e pediram reajuste salarial como forma de fortalecer a categoria.
“Entendemos as críticas de quem critica o auxílio-moradia, mas não somos tratados com isonomia pela opinião pública e pela imprensa. São benefícios concedidos ao Legislativo e Executivo, além do Judiciário”, disse Eduardo André Fernandes, vice-presidente da 2ª região da Ajufe.
Em São Paulo, as lideranças evitaram chamar o movimento de paralisação ou de greve, já que, segundo eles, o trabalho não parou.
A direção nacional da Ajufe, porém, reafirmou que o que estava convocado era um movimento com paralisação. Disse ainda que não houve prejuízo para o atendimento.
Segundo a entidade, 1.100 juízes federais aderiram ao movimento, o equivalente a 62% dos associados. Na Justiça do Trabalho, segundo a Anamatra, 1.210 juízes aderiram, o que representa 36% do total na ativa.
(JOELMIR TAVARES, LETÍCIA CASADO E LUISA LEITE)