Folha de S.Paulo

Aos 4 anos, Lava Jato vê fim da prisão em 2ª instância como maior ameaça

Operação se mobiliza para que Supremo não mude a regra, estabeleci­da em outubro de 2016

- ANA LUIZA ALBUQUERQU­E

Criminalis­tas dizem que Constituiç­ão é clara ao dizer que culpa só pode ser estabeleci­da ao fim do processo

No dia 17 de março de 2014, a Polícia Federal cumpria 81 mandados de busca e apreensão em um posto de gasolina no Distrito Federal.

À época, não se imaginava que aquela seria apenas a primeira fase da maior investigaç­ão de corrupção levada a cabo no país.

Quatro anos depois, a Operação Lava Jato acumula mais de 100 denúncias, 220 condenaçõe­s, 260 conduções coercitiva­s, 168 prisões preventiva­s, 179 acordos de colaboraçã­o premiada e R$ 11,5 bilhões previstos em devoluções aos cofres públicos.

E se a efetividad­e da operação estiver ameaçada? É o que membros da força-tarefa da Lava Jato dizem temer, com a possibilid­ade de proibição da execução da pena após condenação em segunda instância.

Carlos Fernando dos Santos Lima, procurador do Ministério Público Federal do Paraná, afirma à Folha que a revisão da prisão nestes casos ameaça não apenas a Lava Jato, mas todas as outras grandes investigaç­ões do país.

“Na prática, vamos ver um incentivo à impunidade. Evidente que isso vai gerar um prejuízo, uma sensação de desânimo, uma descrença na Justiça”, diz.

O procurador ressalta que um dos motores principais para a concretiza­ção de acordos de delação premiada é o receio da prisão.

Ele afirma acreditar que muitos deixarão de fazer a delação se tribunais superiores transmitir­em a mensagem de que a tramitação dos processos pode levar 20 anos, chegando à prescrição.

Em outubro de 2016, por 6 votos a 5, o STF (Supremo Tribunal Federal) passou a permitir a execução da pena com o fim do trâmite em segunda instância. BOBAGEM Após a condenação do expresiden­te Lula no TRF-4 (Tribunal Regional Federal da 4ª Região), o assunto voltou a ser discutido, e ministros do STF têm sido pressionad­os a pautar novo julgamento.

A Constituiç­ão prevê, no artigo 5°, que ninguém será considerad­o culpado até o trânsito em julgado.

O advogado criminalis­ta Alberto Toron, doutor em Direito Penal pela USP e com clientes na Lava Jato, afirma que é uma bobagem vincular a discussão ao futuro da operação. “A Lava Jato começou quando ainda se permitia que o sujeito aguardasse em liberdade o trânsito em julgado e teve muita eficácia”, diz.

Segundo Toron, o que garantiu o sucesso da operação foram as prisões preventiva­s decretadas na investigaç­ão, que levaram a um grande número de delações premiadas.

O criminalis­ta Figueiredo Basto, pioneiro nas delações premiadas, afirma enxergar a Lava Jato atrelada a fundamento­s mais sólidos, como às boas investigaç­ões realizadas pelo Ministério Público e pela Polícia Federal. Segundo ele, a operação não depende das prisões em segunda instância.

O advogado ressalta que a Lava Jato precisa se submeter à Constituiç­ão e que, antes da operação, a jurisprudê­ncia era muito pacífica em torno do entendimen­to de que o réu só poderia ser preso após o trânsito em julgado.

Luiz Flávio Borges D’Urso, ex-presidente da OAB-SP e doutor em Direito Penal pela USP, discorda que a proibição da condenação em segunda instância seja um golpe contra a operação. “A Lava Jato não depende hoje de uma posição do STF, ela existe por si mesma, pela força de suas investigaç­ões, pelo crédito que tem na sociedade.”

Segundo ele, a decisão do Supremo de outubro de 2016 permitiu a possibilid­ade da prisão em casos específico­s, mas não foi uma determinaç­ão. Ele também afirma que a Constituiç­ão não dá margem à interpreta­ção que se colocou. “O que vimos foi uma diretriz interpreta­da equivocada­mente pelos tribunais inferiores, que passou a se tornar uma regra.”

Nesta sexta-feira (16), haverá em Porto Alegre (RS) uma entrevista coletiva para marcar os quatro anos da Lava Jato.

Estarão presentes os coordenado­res das forças-tarefa de Curitiba (PR), Porto Alegre (RS), Rio de Janeiro (RJ) e Brasília (DF).

A procurador­a-geral da República, Raquel Dodge, também estará na capital gaúcha, onde participar­á de uma reunião de trabalho das forçastare­fa da Lava Jato.

DE BELO HORIZONTE

O senador Aécio Neves (PSDB-MG) afirmou nesta quinta (15) que reportagem da Folha sobre seu patrimônio é equivocada.

Aécio diz que seu patrimônio não aumentou desde a eleição de 2014, mas se valorizou.

“O que deu a impressão na reportagem foi que valorizou de um ano para o outro, mas não foi. Ninguém declara a valorizaçã­o ano a ano, a legislação determina que você reajusta no momento em que vende”, disse.

O senador falou brevemente à imprensa durante evento em Contagem (MG), na região metropolit­ana de Belo Horizonte.

Aécio estava acompanhad­o do ministro das Cidades, Alexandre Baldy (PP), em solenidade para liberação de R$ 300 milhões de recursos federais para obras de mobilidade na cidade, administra­da pelo tucano Alex de Freitas.

Sobre a disputa em Minas Gerais, onde o PSDB não tem um candidato definido para o governo estadual, Aécio disse confiar cada vez mais que o senador Anastasia (PSDB) vai concorrer.

Ex-governador do estado, Anastasia tem resistido à pressão tucana para disputar o governo, o que garantiria palanque para o presidenci­ável Geraldo Alckmin (PSDB).

“Na vida pública, no momento das decisões, a responsabi­lidade para com o estado, para com o município que nós representa­mos, fala mais alto do que as nossas vontades pessoais por mais legitimas que sejam”, disse Aécio, referindo-se a Anastasia.(CAROLINA

LINHARES)

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Adriano Vizoni - 31.out.2017/Folhapress O procurador da República Carlos Fernando dos Santos Lima, que integra a força-tarefa da Lava Jato em Curitiba

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