O único direito que o trabalhador, o mau trabalhador, perdeu [com a reforma trabalhista] foi o de mentir
Apoiado pelo MBL (Movimento Brasil Livre) e em negociação com partidos como o PRB, braço político da Igreja Universal, o empresário Flávio Rocha acha que agora vai.
Ele tentou ser presidente em 1994, mas saiu daquela corrida antes do pleito. Desta vez, vê como trunfo o déficit “de nomes liberais na economia e conservadores nos costumes”. É aí que ele entra.
Afinal, de liberal mesmo, diz, só Jair Bolsonaro e João Amoêdo. Na “direita globalista”, Geraldo Alckmin, Marina Silva e Álvaro Dias. E como “esquerda revolucionária” (que lhe dá calafrios), Guilherme Boulos, “a gaúcha” (Manuela D’Ávila), Ciro Gomes “e quem quer que seja do PT”.
“Caso [o quadro] evolua para uma candidatura realmente competitiva, estou pronto para assumir”, diz o dono da Riachuelo, uma das maiores varejistas do Brasil.
Ele tem até 7 de abril para se filiar a uma legenda, e um encontro domingo (18) com o líder do PRB e bispo licenciado da Universal, Marcos Pereira, que à Folha o define como “excelente nome”.
Bolsonaro parece concordar. Tanto que já o sondou para ser seu vice, segundo Rocha. “Essa possibilidade já foi ventilada. Não prosperou.” Bolsonaro pode até carregar nas tintas, mas o empresário diz “admirar sua coragem para abraçar temas órfãos”, como posições linha-dura em segurança e valores familiares.
“Mas nos afasta nossas visões diferentes de economia”, afirma ele, que vê Bolsonaro “como esquerda” na área.
E que ninguém duvide de suas credenciais liberais. Vide seu júbilo com recente decisão judicial que condenou um homem a pagar R$ 750 mil ao antigo empregador —tudo com base na nova reforma trabalhista, que prevê indenização para os custos com advogado da parte vencedora.
“É muito educativo esse episódio. O único direito que o trabalhador, o mau trabalhador, perdeu foi o de mentir, porque era o que acontecia, principalmente da parte do advogado, que puxava um cardápio e colocava mais 30 demandas mentirosas [na ação trabalhista]”, afirma o filho do 39º homem mais rico do Brasil segundo a “Forbes”, Nevaldo Rocha, dono do potiguar Grupo Guararapes Confecções (que abarca a Riachuelo). FÃ DE C AMPOS Pedradas voaram desde que Flávio começou a ensaiar voos eleitorais. Blogueiros esquerdistas, por exemplo, resgataram perfil publicado pela Folha em 1994, quando ele, então deputado, disputava a Presidência pelo Partido Liberal (atual PR). O texto dizia que, aos 36, Rocha recebia mesada. “Financeiramente, sou dependente do meu pai. São transferências regulares para minha conta”, afirmou.
Hoje o sexagenário minimiza. “Fiz meu primeiro milhão aos 24, com a Jeans Pool, que era ‘top of mind’”. diz sobre a marca, uma costela do conglomerado têxtil do patriarca.
Um empréstimo de R$ 1,4 bilhão que a Riachuelo tomou do BNDES pôs Rocha em maus lençóis com militantes de esquerda e direita. Os dois lados acharam hipócrita um defensor do Estado mínimo recorrer aos cofres públicos.
O empresário lembra que o BNDES “foi fundado pelo maior dos liberais, Roberto Campos”. Diz que sua companhia “já pagou R$ 1 bilhão” e que o dinheiro “gerou 15 mil empregos”. “A diferença entre veneno e remédio está na dose.”
Errado mesmo é o banco injetar “dezenas de bilhões para
FLÁVIO ROCHA
Dono da Riachuelo financiar ditaduras bolivarianas”, afirma em sua mansão nos Jardins paulistanos, a duas quadras da de Paulo Maluf.
Foi lá que, em dezembro de 2015, Geraldo Alckmin declarou pela primeira vez que João Doria era seu tucano predileto na disputa municipal de São Paulo. “Victor Hugo dizia, João, que nada segura a ideia de que chegou o seu tempo”, afirmou nas bodas de prata de Rocha e a esposa, Anna Cláudia.
Uma supermesa comportou 140 convidados, refastelados com o menu político e o buffet L’ Épicerie. Uma “decoração do tipo ‘uau’, com hortênsias brancas e velas”, descreveu o site “Glamurama” à época.
Líder do MBL, Kim Kataguiri conta que também esteve na casa de vastos jardins, guardanapos com o “R” de Rocha impresso, uma adega com o vinho favorito do anfitrião, o Haut-Brion (há safras que superam os R$ 5.000) e obras de arte que vão de Ai Weiwei (bicicletas douradas empilhadas) a Andy Wahrol (Mao-Tsé Tung em pop art).
“Para tomar um café”, diz Kataguiri, empenhado em “buscar estratégias para viabilizar a candidatura” de Rocha. Uma delas: usar redes sociais do movimento para divulgar a campanha dele.
Vem de 2015 o “encanto com os jovens tão intelectualmente maduros” do MBL, diz Rocha, que lamenta ter sido “de esquerda” na faculdade de administração da Fundação Getúlio Vargas. Primeiro empresário de peso a apoiar o impeachment de Dilma Rousseff, ele foi procurado pelo grupo.
Apreciador do Ponte para o Futuro, programa econômico de Michel Temer, Rocha aposta que “a eleição vai ser impregnada do debate dos costumes”, do qual também é fã. Em janeiro, discursou num evento de sua igreja, a evangélica Sara Nossa Terra, ao lado do ministro Henrique Meirelles.
Rocha diz que não exploraria sua fé em campanha. Em seguida, refere-se a “esta parcela do eleitorado que percebe mais facilmente que a coisa que se acirrou muito, o chamado marxismo cultural.”