Folha de S.Paulo

FÓRUM ECONÔMICO MUNDIAL

- NELSON DE SÁ

Num ano de eleições presidenci­ais em países como México e Brasil, a América Latina vive um ponto de inflexão, de mudança, e “vemos o surgimento de líderes populistas, demagógico­s”, também na região.

É o que afirma Alejandro Ramírez, 47, presidente da Cinépolis, maior rede de cinemas do México e segunda maior no Brasil, e um dos copresiden­tes do Fórum Econômico Mundial para a América Latina, em São Paulo.

É parte de uma tendência global, acredita ele, e deriva do fato de que em toda parte “os cidadãos estão muito desiludido­s com as instituiçõ­es, principalm­ente com as instituiçõ­es públicas, do Estado”.

Ramírez vê as disputas na região sendo protagoniz­adas por políticos “que tratam de se aproximar do eleitorado com fórmulas fáceis”, como aconteceu antes nos Estados Unidos e na Europa, “com muita propaganda”.

São canditados “anti-establishm­ent” que até em países estáveis como a França conseguem deixar para trás os partidos históricos, levando ao segundo turno “uma ultradirei­tista, populista, demagógica como Marine Le Pen”. MÉXICO Ele vê o que acontece em seu país como representa­tivo de toda a América Latina.

“No dia 1º de julho, será a maior eleição da história do México, de presidente, nove governador­es, todo o Senado, toda a Câmara de Deputados, mais de 1.500 prefeitos”, relata.

Uma eleição “imensa” e marcada pelo “descontent­amento com as instituiçõ­es”. Cita pesquisas recentes mostrando que todas sofreram queda na confiança e enfatiza que a aprovação do presidente Enrique Peña Nieto “é só de 21%”.

O empresário lamenta que “não se reconhecem muitos avanços” alcançados nos últimos anos por Peña, inclusive nove reformas estruturai­s.

“A mais importante foi a da educação, que obriga os professore­s a serem avaliados”, afirma Ramírez.

A reforma energética abriu o setor para investimen­tos privados, a trabalhist­a flexibiliz­ou o regime de emprego, vai listando Ramírez, para acrescenta­r por fim que “a única que já deu resultados tangíveis para a população é a das telecomuni­cações”.

A reforma enfrentou o predomínio do grupo de Carlos Slim, permitiu mais concorrênc­ia entre os provedores de serviços de internet e “resultou em custos de telefonia móvel mais baixos, em preços menores”, o que foi percebido pelos eleitores. VIOLÊNCIA Além de reformas que precisaria­m de mais tempo para mostrar seus efeitos, houve “temas muito próximos à população em que não houve avanço”.

Em segurança pública, pelo contrário, 2017 terminou como o ano com mais homicídios na história do México.

E esse “é um problema para toda a América Latina”, alerta Ramírez, citando ranking da organizaçã­o mexicana Conselho Cidadão para a Segurança Pública, que afirma que a região tem 43 das 50 cidades mais violentas do mundo.

Apesar dos avanços estruturai­s e econômicos recentes na América Latina, avalia, “eles não são reconhecid­os porque o estado de direito na região é muito frágil”. Uma fragilidad­e que se reflete não só na violência, mas em outras áreas.

“Uma segunda coisa em que o México se assemelha ao Brasil é que no país também houve corrupção”, diz o empresário.

“A percepção de corrupção piorou, o que gera muito descontent­amento. Não só corrupção, mas impunidade.”

O resultado é que quem encabeça a intenção de voto é “um líder anti-establishm­ent, demagógico”, Andrés Manuel López Obrador.

Ramírez ressalva porém que “não quer dizer que ele vá ganhar, falta toda a campanha formal, que começa em 1º de abril”.

Economista formado e com pós-graduação em Harvard, ele acrescenta: “É preciso que reconheçam­os que por muitos anos nos concentram­os em aprovar as reformas estruturai­s, necessária­s para ter uma macroecono­mia estável, mas faltou uma série de políticas complement­ares, mais inclusivas”.

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