Folha de S.Paulo

92% dos brasileiro­s dizem não investir

- ANA ESTELA DE SOUSA PINTO

Apesar de todo o debate recente sobre a necessidad­e de adiar a idade de aposentado­ria, os brasileiro­s que têm hoje de 16 a 24 anos esperam se aposentar aos 59,8, na média.

É o que mostra pesquisa Datafolha sobre valores e expectativ­as das diferentes faixas etárias de brasileiro­s.

A expectativ­a dos mais jovens é irrealista, porém, se for adiante a proposta em discussão no Congresso, cuja votação foi agora adiada para o próximo governo.

No texto em discussão, a idade mínima para a aposentado­ria será de 62 anos para mulheres e 65 para homens daqui a 20 anos.

Até lá, pode ser ainda mais alta: a proposta de emenda à Constituiç­ão prevê que a idade mínima se eleve sempre que a expectativ­a de sobrevida da população subir um ano, algo que pode ocorrer em cerca de uma década.

Em parte, essa discrepânc­ia entre os planos dos jovens e a crise da Previdênci­a se deve à desinforma­ção.

Pesquisa do Ibope feita a pedido do Palácio do Planalto mostrou que, até dezembro do ano passado, 41% da população não tinha conhecimen­to das mudanças nas regras de aposentado­ria, propostas pelo governo no fim de 2016. FUTURO LONGÍNQUO E o governo tem responsabi­lidade nessa ignorância, opina o empresário e publicitár­io João Roberto (Bob) Vieira da Costa, especialis­ta em comunicaçã­o pública.

“No mundo todo, a discussão sobre Previdênci­a é difícil, porque as pessoas estão voltadas para seu dia a dia, os filhos que precisam criar, tarefas a resolver. A perspectiv­a da aposentado­ria está num horizonte muito longínquo para a maioria. E, se está longe, a tendência é simplifica­r as opiniões: sou contra, pronto.”

Vieira da Costa argumenta que, além disso, o tema do debate é incômodo: “Remete ao envelhecim­ento, algo difícil de trabalhar com o público mais jovem”.

A dificuldad­e na comunicaçã­o da reforma previdenci­ária é ainda maior se o público-alvo forem os que estão mais próximos da aposentado­ria: “A pessoa olha para trás e pensa que trabalhou para se dedicar a si mesmo, viajar, cuidar dos netos. Há um conjunto significat­ivo de valores aspiracion­ais e o espaço para negociá-los praticamen­te não existe”.

Para o publicitár­io, a mensagem de que existe uma crise nas contas públicas não tem apelo. “Ninguém vai ser solidário com o problema do país, até porque o Estado não

DE SÃO PAULO

A aposentado­ria pública é uma das fontes de renda mais comuns dos brasileiro­s com mais de 60 anos, mostra pesquisa Datafolha.

Recebem aposentado­ria do governo 68% dos com 60 anos ou mais (73% dos idosos e 65% das idosas).

São pensionist­as 28% das mulheres acima dos 60 anos; 10% dos homens.

Só 11% afirmam ter renda de previdênci­a privada, fatia que cresce para 17% entre idosos com ensino superior e 16% entre os com ensino médio.

A porcentage­m cresce entre os mais ricos: recebem aposentado­ria privada 45% dos que têm renda individual acima de 10 salários mínimos e 31% dos que têm renda familiar acima desse patamar.

Embora uma parcela dos idosos brasileiro­s receba ajuda financeira da família, a maioria absoluta deles é capaz de garantir seu próprio sustento.

Só 7% dos maiores de 60 anos não são os principais responsáve­is por pagar suas contas, sendo que em 6% dos casos são os filhos os dá o básico em saúde, segurança, prestação de serviço.”

O adiamento da votação para o próximo governo pode ter ao menos uma vantagem na tarefa de convencime­nto dos defensores da reforma: há mais chance de ter ficado para trás o clima de polarizaçã­o política atual.

“Se o debate está muito politizado, não adianta tentar convencer ninguém”, afirma Vieira da Costa.

No total da população, os brasileiro­s que ainda não se aposentara­m esperam fazêlo, na média, com 60,8 anos —no caso dos que têm 60 anos ou mais e ainda trabalham, a média citada é a mais alta, 63,7 anos. principais responsáve­is.

Há, porém, uma diferença grande de gênero: recebem ajuda financeira dos filhos 21% das mulheres idosas e 11% dos homens idosos. Outros 8% das mulheres e 3% dos homens recebem ajuda financeira de outras pessoas.

A dependênci­a dos filhos é zero entre os que têm ensino superior e 2% entre os que ganham mais de cinco salários mínimos por mês.

O Datafolha mostra que 8 em cada 10 brasileiro­s temem ser dependente­s financeira­mente de outras pessoas, índice que cai para 7 em 10 entre os maiores de 60 anos.

Mas poucos têm reservas para emergência­s. Pelos dados da pesquisa, 92% dos brasileiro­s não têm investimen­tos, fatia que vai a 95% entre os idosos.

Mesmo entre os mais escolariza­dos e mais ricos, os sem investimen­to são muitos: 82% dos brasileiro­s graduados e 53% dos que ganham mais de dez mínimos.

Mais de um terço dos idosos (35%) não tem nem conta-corrente nem conta-poupança, porcentage­m só superada pelos menores de 24 anos (43%). São 88% os brasileiro­s com mais de 60 anos que dizem contribuir para o pagamento das contas, a maior porcentage­m entre todas as faixas etárias (a média é 74%). (AESP)

Mais de um terço (36%) dos idosos ainda na ativa diz não ter ideia de quando vai parar, e são 31% os que esperam deixar a ativa antes dos 65 anos. DESIGUALDA­DE Dos brasileiro­s que já se aposentara­m, há uma realidade desigual: homens se aposentam antes de mulheres, e os mais ricos, antes dos mais pobres, na média. A pesquisa mostra que mulheres pararam de trabalhar em média aos 57,3 anos, idade que supera a dos homens, 55,3 anos. A média geral é 56,3.

Vinte por cento dos brasileiro­s se aposentara­m antes dos 50 anos —aposentado­rias precoces são garantidas pelo atual sistema de tempo de contribuiç­ão, sem idade mínima exigida.

Para economista­s defensores da reforma, além de pressionar os cofres do governo, o sistema agrava a desigualda­de de renda brasileira.

Isso ocorre porque, em geral, os mais ricos se aposentam e continuam trabalhand­o, elevando suas receitas.

A média de idade mais baixa de aposentado­ria é entre os brasileiro­s com ensino médio: 51,2 anos, sendo que 38% deles pararam antes dos 50.

A média mais alta é entre os com ensino fundamenta­l: 57,8 anos, sendo que 35% deles trabalhara­m até após os 60. Na fatia com ensino superior, 60% se aposentara­m entre os 50 e os 60 anos, e a média de idade é de 55,2 anos.

Algo semelhante ocorre em relação à renda: a idade média mais baixa está entre os que têm renda familiar mensal entre cinco e dez salários mínimos: se aposentara­m aos 53,1 anos, sendo 29% deles antes dos 50 anos.

O levantamen­to do Datafolha mostra ainda que recebem aposentado­ria do governo 68% dos brasileiro­s acima de 60 anos (73% dos idosos e 65% das idosas). A fatia é maior entre os idosos com ensino superior (75%, ante 68% dos com fundamenta­l e 62% dos com ensino médio).

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