Portugal, com resultados notáveis, é exemplo de descriminalização do uso de substâncias proibidas
SEMANAS ATRÁS esta coluna entrou em controvérsia com o ministro do Desenvolvimento Social, Osmar Terra (MDB-RS), sobre como avançar em estratégias para lidar com o drama da dependência química. Defendeu-se aqui que concebê-la como doença passou a fazer parte do problema, não da solução.
O ministro, adepto do conservadorismo proibicionista, discordou. Atribuiu as mortes causadas por drogas no Brasil à política de redução de danos e prescreveu abstinência e repressão como remédio para o “holocausto” e a “epidemia” das drogas.
Dizendo apoiar-se em fatos, afirmou que “a violência e o número de dependentes marginalizados diminuíram em todos os países que atuam com rigor contra o comércio e o consumo de drogas”, mas não os apresentou para corroborar a afirmação. de mortos na “guerra às drogas” no México e nas Filipinas contradiziam a tese do emedebista. Havia, contudo, um contraexemplo melhor, o de Portugal, cuja política de descriminalizar o uso (mas não o tráfico) de substâncias proibidas tem obtido resultados notáveis, lá, e pouca atenção, aqui.
Reparo agora essa omissão reproduzindo um sumário de avanços conquistados em nossa antiga metrópole a partir de 2001, quando a descriminalização se implantou em associação com políticas generosas de redução de danos que o correligionário de Michel Temer deplora.
O resumo foi compilado pela ONG Drug Policy Alliance (DPA):
Entre 1998 e 2011, o total de dependentes químicos portugueses em tratamento subiu de 23.600 para 38.000. Mais de 70% receberam terapia de substituição de opioides (como heroína).
O número de infecções com HIV, muitas desencadeadas pelo compartilhamento de seringas, caiu de 1.575 (ano 2000) para 78 (2013), e 100 mil da época em que a política de drogas foi reformada.
Em 1999, 44% dos encarcerados em Portugal cumpriam penas por delitos relacionados com drogas. Essa parcela caiu para 24% em 2013.
No Brasil, a Lei de Drogas adotada em 2006 pretendeu reduzir o punitivismo e revogou a pena de detenção de seis meses a dois anos para usuários anteriormente prevista, substituindo-a por advertência sobre das presidiárias.
A descriminalização, ao menos da posse de drogas, tem apoio até do ministro Gilmar Mendes, que não pode ser acusado de esquerdista nem de ingênuo.
Quem se opõe com unhas e dentes contra ela em geral o faz por oportunismo político, para atender ao senso comum e angariar votos conservadores. A verdade que se dane.