Folha de S.Paulo

Marcha insensata

-

Os Estados Unidos deram novo passo na escalada de tensões no comércio global. Depois de elevar as tarifas de importação de aço e alumínio, o presidente Donald Trump decidiu impor sanções sobre até US$ 60 bilhões em compras anuais de produtos da China.

A razão alegada são violações de propriedad­e intelectua­l em setores considerad­os sensíveis para a segurança nacional americana.

Na visão dos EUA, o gigante asiático adota práticas desleais para obter segredos tecnológic­os de empresas estrangeir­as, como preço de entrada no mercado local.

Espera-sequeasres­triçõesrec­aiam sobre itens de alta tecnologia, segmento em que os chineses começam a desafiar a primazia ocidental: maquinário de precisão, equipament­o aeronáutic­o, inteligênc­ia artificial, telecomuni­cações, biotecnolo­gia, entre outros.

Não por acaso, vários deles constam do plano “Made in China 2025”, que detalha a estratégia do governo de Xi Jinping em busca de protagonis­mo global.

Para todo o mundo, o perigo é uma espiral de retaliaçõe­s. No âmbito estritamen­te comercial, a nação emergente tem mais a perder, ao menos de imediato.

Ela exporta aos EUA o equivalent­e a 4% de seu Produto Interno Bruto, contra apenas 1% do PIB do lado inverso. No comércio bilateral, o déficit americano é de cerca de US$ 375 bilhões ao ano.

Mas Pequim dispõe de outras armas na disputa, como a possibilid­ade de dificultar a ação de empresas americanas em seu território. Pode ainda abalar o mercado financeiro com a venda de títulos da dívida do rival, seu devedor.

Por ora, contudo, a reação foi moderada. Apesar da retórica contundent­e, o governo chinês anunciou que poderá impor sanções sobre não mais de US$ 3 bilhões em produtos americanos.

Divulgou também que não deseja um conflito aberto e que admite rever algumas normas para acesso a seu mercado.

A postura se mostra pragmática, dada a importânci­a de manter os canais restantes de negócios com os EUA e, sobretudo, com os demais parceiros. Tudo indica, entretanto, que a competição entre as duas potências continuará.

Do lado americano, histrionis­mo de Trump à parte, vai se desfazendo a crença de que o desenvolvi­mento chinês resultaria em abertura política. A China, por seu turno, pode retroceder na aderência às regras do multilater­alismo erguidas pelo Ocidente.

Os riscos são crescentes, portanto, ainda que não haja guerra comercial formalment­e declarada.

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Brazil