Marcha em Washington tem lágrimas, silêncio e apelo ao voto
Ato por restrições ao porte de armas reúne 800 mil na capital dos EUA, segundo organizadores
Houve outras 800 manifestações nos EUA e no exterior; público era majoritariamente formado por jovens
A estudante Emma Gonzalez, 18, ficou pouco menos de 6min20s em silêncio no palco. Foi o tempo que durou o ataque a tiros em sua escola na Flórida, onde 17 pessoas morreram em fevereiro.
Numa multidão de milhares que se reuniram em Washington no sábado (24) para pedirrestriçõesaoportedearmas nos EUA, era possível ouvir a respiração de quem estava ao lado.
Lágrimas escorriam pelo rosto de Gonzalez, que virou símbolo do movimento capitaneado por jovens.
“Lutem por suas vidas, antes que esse seja o trabalho de outra pessoa”, arrematou ela, ao final dos seis minutos.
Foi o ponto alto de um protesto pautado pela emoção. Também no sábado, outros 800 atos ocorreram em cidades americanas e do exterior —porexemplo,emBerlim,Paris, Tóquio e Sydney.
Os sobreviventes do massacre na Flórida, que organizaram a marcha na capital,elegeram como alvo o banimento dos fuzis automáticos —e pediram o engajamento dos jovens pelo voto.
“Vote para tirá-los” era o bordão mais repetido nas ruas, onde cerca de 800 mil pessoas se reuniram, segundo os organizadores —o metrô da cidade, por sua vez, disse que, até as 13h (14h, em Brasília), haviam passado por suas catracas 207 mil pessoas, bem menos do que na Marcha das Mulheres de janeiro de 2017 (470 mil).
“Preparem seus currículos”, discursou David Hogg, 17, sobre legisladores que não assumirem compromisso com o controle de armas no país. Em novembro, os americanos elegem novos representantes para Congresso e assembleias estaduais.
O protesto também contemplou a questão da violência urbana. Crianças chamaram a atenção para as mortes de negros, hispânicos e mulheres por armas de fogo.
“Essas mortes não chegam às primeiras páginas dos jornais”, disse a estudante negra Naomi Wadler, 11. REVOLUÇÃO No palco, apenas crianças e adolescente, entre nove e 18 anos,discursaram.Criticaram a “epidemia” das mortes por armas de fogo e afirmaram ter dado início a uma revolução.
Entre os principais temas das falas e dos cartazes estavam o fim da venda de fuzis automáticos como o AR-15; a extensão da checagem de antecedentes a todas as compras de armas no país (inclusive em sites ou feiras de usados) e a crítica aos políticos financiados pela NRA (Associação Nacional do Rifle), lobby pró-armas.
“Isso não é um golpe publicitário, ou apenas um dia, um evento. É um movimento”, afirmou Delaney Tarr, 17, estudante da Flórida.
Não eram poucos os manifestantes que comparavam a marcha ao movimento por direitos civis nos EUA, na década de 1960.
O reverendo Martin Luther King Jr., morto em 1968, foi lembrado em vários discursos —em especial, no de sua neta, Yolanda Renne King, 9.
“O meu avô tinha um sonho: que seus quatro filhos não fossem julgados pela cor de sua pele, mas por seu caráter”, discursou. “Eu tenho um sonho: basta é basta”, gritou, em alusão a um bordão dos manifestantes.
Estudantes formavam a maioria do público, mas haviatambémrepublicanos,donos de armas e caçadores.
O cartaz de Don Street, 66, pedia o fim da venda de cartuchos de alta capacidade, uma demanda-chave do movimento. “Caçadores de verdade não precisam de cartuchos de 30 rodadas”, dizia.
Muitas crianças marchavam com os pais, como as irmãs Maggie Perry-Moffit, 4, e Ally, 7. A primeira escolheu o desenho de um cocô para criticar as armas. A segunda dizia em seu cartaz: “Gosto de unicórnios, não de armas”.
Os alunos da Marjory Stoneman Douglas eram identificados por moletons de cor vinho e pelo símbolo da águia em suas camisetas. Recebiam abraços frequentes.
“Isso se tornou muito maior do que nós”, disse à Folha a estudante Karen Villancio, 15, sobrevivente do massacre na Flórida.
Contraprotestos também foram vistos no meio do evento —como os de pequenos grupos antiaborto e a favor das armas. Não houve registro de confrontos.
OpresidenteDonaldTrump não estava em Washington. Viajara na sexta para sua propriedade na Flórida.
Em nota, a Casa Branca afirmou que “aplaude a coragem de tantos jovens americanos que exercitaram seu direito à liberdade de expressão” e informou que “manter as crianças seguras é a prioridade número um do presidente”.
YOLANDA RENNE KING
neta de Martin Luther King
[Trump] aplaude a coragem de tantos jovens americanos que exercitaram seu direito à liberdade de expressão [...] manter as crianças seguras é a prioridade nº 1 um do presidente
COMUNICADO DA CASA BRANCA