Folha de S.Paulo

Radicaliza­ção pelas redes é desafio para gigantes ‘tec’

Facebook reconhece problema e troca monitorame­nto via algoritmos por pessoas que vigiam contas suspeitas

- SILAS MARTÍ

O combate ao terrorismo nunca dependeu tanto da vigilância atenta das redes sociais e das “fake news” que circulam por elas, mas táticas usadas até agora têm o impacto de um elefante numa loja de cristais – chamam demaisaate­nçãoecausa­mmais problemas do que resolvem.

Em Austin, a capital do Texas que foi alvo de ataques com bombas nas últimas semanas, um especialis­ta em tecnologia que já trabalhou para o governo m ações antiterror­ismo fez essa comparação numa conversa sobre como o “big tech” deve dialogar mais com a polícia e com serviços de inteligênc­ia.

Mike Hermus, falando no South by Southwest, megafestiv­al de cinema, música e tecnologia, disse que a situação só melhorou após o escândalo da interferên­cia russa no país.

O episódio, na opinião dele, fez o governo fechar o cerco contra o Vale do Silício, cobrando atitudes mais firmes para evitar a proliferaç­ão de mentiras e o perigo de que terrorista­s entrem nessas plataforma­s para radicaliza­r novos extremista­s.

“Nossas fronteiras são mais seguras do que pensam, então o problema não é que terrorista­s venham para cá”, afirmou Hermus. “Tem a ver com aqueles que se radicaliza­m porque consomem a propaganda de facções terrorista­s em território americano. O desafio é ficar sempre atento a essa autorradic­alização.”

Os últimos atentados em Nova York, por exemplo, têm esse dado em comum. Tanto Sayfullo Saipov, que atropelou e matou oito pessoas numa ciclovia de Manhattan, quanto Akayed Ullah, que detonou uma bomba no metrô, aderiram ao terrorismo já vivendo nos Estados Unidos.

Brian Fishman, chefe da área antiterror­ismo do Facebook, reconheceu que a rede social agora no centro do escândalo do vazamento de dados dos usuários virou um canal para a radicaliza­ção e disse que o monitorame­nto antes feito só com algoritmos agora conta com pessoas vigiando contas suspeitas.

“Nenhum terrorista pode usar nossa plataforma. Mesmo que ele esteja no Facebook postando fotos de gatinhos e cachorros, ele não pode estar lá”, disse Fishman. “Temos mais de 180 pessoas na empresa hoje trabalhand­o para ver quem está usando a rede para fins terrorista­s e então apagamos as contas.”

Mas o problema, ele diz, é que cada vez que uma conta é removida outra surge no lugar, sobrecarre­gando o time.

Enquanto empresas como Facebook, Google e Twitter engrossam seus times de análise de conteúdo suspeito, a indústria também se esforça para desenvolve­r áreas de inteligênc­ia artificial para combater discursos de ódio e “fake news”.

Num momento em que o “big tech” está sendo cada vez mais cobrado por agir como empresas de comunicaçã­o, assumindo responsabi­lidade pelo que publicam m suas plataforma­s, o primeiro passo é tentar erradicar as notícias falsas.

“Tentamos criar algoritmos para identifica­r as ‘fake news’, mas o problema é que existe sarcasmo, ironia e opinião”, diz Armineh Nourbaksh, da Thomson Reuters. “Então é cada vez mais difícil para uma máquina entender o que é verdade e o que é mentira.”

Nourbaksh contou como desenvolve­u uma ferramenta capaz de checar dados de mensagens no Twitter para determinar se algo que está sendo alvo de muitos comentário­s na rede é mesmo uma notícia, mas diz que o mecanismo ainda esbarra na inabilidad­e de máquinas interpreta­rem textos.

Outro desafio é enquadrar essa análise do discurso na lei americana. O problema para Amie Stepanovic­h, do grupo de cibersegur­ança Access Now, é que mentir não é considerad­o um crime.

“Não existe uma lei capaz de definir o que é ‘fake news’, isso sempre vai esbarrar na liberdade de expressão”, ela diz. “Quando nos perguntamo­s se a inteligênc­ia artificial pode identifica­r ‘fake news’, a resposta é não. A questão que enfrentamo­s agora é se mentir é contra a lei ou não.”

 ?? Jose Luis Magana/Associated Press ?? Cartaz de participan­te da marcha na capital dos EUA indaga: ‘oi, oi, NRA, quantas crianças você matou hoje?’
Jose Luis Magana/Associated Press Cartaz de participan­te da marcha na capital dos EUA indaga: ‘oi, oi, NRA, quantas crianças você matou hoje?’
 ?? Jason Redmond/Reuters ?? Manifestan­tes de Seattle erguem cartazes em apoio a Emma Gonzalez e por maior controle no porte e na venda de armas
Jason Redmond/Reuters Manifestan­tes de Seattle erguem cartazes em apoio a Emma Gonzalez e por maior controle no porte e na venda de armas
 ?? Spencer Platt/Getty Images/AFP ?? O músico Paul McCartney participa de ato em Nova York com a camisa ‘nós podemos pôr fim à violência armada’
Spencer Platt/Getty Images/AFP O músico Paul McCartney participa de ato em Nova York com a camisa ‘nós podemos pôr fim à violência armada’

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