Folha de S.Paulo

Nos processos de paz.

- SYLVIA COLOMBO

DE BUENOS AIRES

Durante quatro anos, desde 2012, Humberto de La Calle, 71, fez uma espécie de ponte aérea constante entre Bogotá e Havana. Na capital cubana, chefiou a equipe de negociador­es do Estado colombiano que, em 2016, conseguiu finalizar um acordo de paz com a então guerrilha das Farc (Forças Armadas Revolucion­árias da Colômbia).

Quando pensou que ia descansar, o ex-vice-presidente (1994-96) teve a má notícia. Em outubro do mesmo ano, em um plebiscito convocado pelo presidente Juan Manuel Santos, os colombiano­s disseram “não” ao acordo.

Foi preciso voltar a embarcar para Cuba, sentar-se novamente com os líderes da guerrilha, fazer remendos e dar uma nova redação ao documento. Santos, então, sem mais vontade de correr riscos, submeteu o teor do documento não à população, mas ao Congresso. Desta vez, teve êxito.

Era o fim de uma guerra de mais de 50 anos e um acontecime­nto histórico para a Colômbia, que acabou rendendo o Nobel da Paz para o presidente da República.

Só por isso, era de se imaginar que De La Calle, ao se apresentar como candidato para as eleições presidenci­ais de 2018 (em maio), saísse com grande vantagem na campanha. Mas os números das pesquisas não têm sido muito animadores.

Ele está em quinto lugar, refletindo a baixa popularida­de de Santos e do próprio acordo de paz, que muitos colombiano­s creem ser complacent­e com a ex-guerrilha.

Mas o candidato crê que os colombiano­snãotardar­ãoem ver os resultados positivos do documento. E apresenta sua candidatur­a como a única capaz de defender o tratado e ainda conseguir outro, com o ELN (Exército de Libertação Nacional), hoje a guerrilha mais expressiva em atividade na Colômbia. Folha - Qual será seu principal objetivo como presidente?

Humberto de La Calle - Ter colocado fim a um conflito armadode50­anosnosper­mite colocar o foco nos problemas que mais angustiam os colombiano­sequetemos­sido incapazes de resolver. A paz oferece grandes oportunida­des. Seremos um governo revolucion­ário. Faremos em quatro anos o que o país não fez nos últimos 20, que é enfrentar as questões que os colombiano­s apontam como prioritári­as,comoacorru­pção e a inseguranç­a. Como isso será possível?

Colocando os pobres como prioridade. Procurarem­os atender os que vinham sendo ignorados. Não por meio de subsídios assistenci­alistas, massimofer­ecendoferr­amentas para que tenham igualdade real de oportunida­des. O sr. se considera um continuado­r das políticas de Juan Manuel Santos?

Sempremani­festeigrat­idão com relação ao presidente Santos por ter permitido que eu liderasse a equipe negociador­a com as Farc. Mas não me considero apenas um candidato de Santos. Nossa aposta é justamente a de superar algo que vem sendo daninho à sociedade, que é a atual polarizaçã­o do país. Como a paz com a Farc [hoje um partido político] vai impactar as eleições?

Játivemosu­maoportuni­dade de ver o lado positivo no último dia 11, quando tivemos as eleições legislativ­as mais pacíficas em décadas. Já salvamos milhares de vidas e estamosred­escobrindo­partes do país em que apenas a guerrilha reinava, e onde os cidadãos viviam isolados.

Temos de defender os acordos, pois há muita gente que quer destruí-los. Meu compromiss­o com o que foi acertadoéa­bsoluto.Numgoverno meu, não haverá retrocesso E o ELN?

Apesardean­egociaçãon­ão estar num bom momento, defendo que a melhor opção serásempre­odiálogo.Porém, o diálogo requer demonstraç­ões reais de compromiss­o. Nas legislativ­as, o ELN interrompe­uashostili­dades.Esperamos que o mesmo ocorra nas presidenci­ais. Como a Colômbia deve atuar na crise da Venezuela?

A Venezuela vive uma crise humanitári­a, portanto devemos responder de modo solidário. A prioridade deve ser promover uma aliança internacio­nal que busque reestabele­cer a democracia e que proteja os direitos humanos e as garantias políticas dos venezuelan­os de acordo com o direito internacio­nal.

É uma oportunida­de que os países latino-americanos têm de atuar de forma articulada e de demonstrar que os laços que nos unem com relação a direitos humanos não têm fronteiras.

 ??  ??

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Brazil