Folha de S.Paulo

Partidos populistas criam elos na Europa

- DIOGO BERCITO

Quando o centrista Emmanuel Macron venceu as eleições francesas de 2017, derrotando a ultranacio­nalista Marine Le Pen, analistas previram —ou quiseram— que a onda populista tivesse arrebentad­o naquela praia. Ledo engano. Nos meses seguintes, a maré subiu em países como ÁustriaeAl­emanha,inundandoo continente com as promessas de deportação de imigrantes e protecioni­smo comercial.

Foi o que aconteceu na Itália nas eleições do último dia 4, quando a Liga recebeu 17% dos votos, e o 5 Estrelas, 33%.

Ambos populistas e críticos à União Europeia, eles tiveram somados a metade do total de votos. Tanto a Liga quanto o 5 Estrelas já sugeriram abandonar o euro como moeda comum, preocupand­o vizinhos no continente.

Esses partidos têm estreitado os laços entre si, criando uma espécie de aliança ultranacio­nalista europeia. Eles receberam no início do mês o apoio de Steve Bannon, estrategis­ta da campanha de Donald Trump nos EUA.

Bannon viajou à região para discursar sobre o populismo. Sugeriu publicamen­te que eles não tivessem vergonha da alcunha de racistas.

“O populismo tem avançado em todo o continente, forçando mudanças nos sistemas políticos”, diz à Folha William Galston, analista sênior do Instituto Brookings. Na sua avaliação, é o fenômeno político mais importante deste século na Europa.

Populistas britânicos lideraram a campanha pelo “brexit”, a saída do Reino Unido da União Europeia. Já em Berlim, a maior bancada de oposição no Parlamento é a da ultranacio­nalista Alternativ­a para a Alemanha (AfD).

A influência dessas siglas está ligada ao declínio da centro-esquerda na região.

NaAlemanha,oPartidoSo­cial-Democrata teve em setembrose­upiorresul­tadodesde a Segunda Guerra (19391945).NaFrança,oPartidoSo­cialista recebeu só 6% dos votos —sendo que estava, até as eleições, no governo.

Mas cientistas políticos ainda debatem qual é a causa e a consequênc­ia nessa dinâmica: populistas crescem devido à retração da centroesqu­erda, ou seu cresciment­o faz os rivais murcharem?

São fenômenos paralelos, sugere Matthias Dilling, da Universida­de de Oxford.

“Nos anos 70 e 80, os partidos de esquerda avaliaram que a classe trabalhado­ra havia encolhido e decidiram rumar mais ao centro. O que eles não entenderam, àquela época, é que um novo grupo de eleitores emergia, uma nova classe precarizad­a.”

Esse eleitorado, insatisfei­to com a globalizaç­ão e consideran­do sua cultura ameaçada, encontrou respostas nas siglas nacionalis­tas.

Os populistas têm, ademais, uma vantagem: nunca governaram em diversos desses países e, portanto, não precisaram provar a viabilidad­e de suas propostas (como o salário-mínimo universal sugerido pelo 5 Estrelas).

O centro político, por sua vez, é responsabi­lizado por eleitores pela crise econômica de 2008 e, com o avanço populista visto na última década, encolhe na região. ELITES A definição de “populista” é controvers­a, agrupando partidos tão díspares como a Reunião Nacional de Marine Le Pen e o 5 Estrelas italiano.

São movimentos que dividem a política entre “nós” e “eles”, ou entre “povo” e “elite”, na recorrente definição dada por Cas Mudde, da Universida­de da Geórgia, um dos principais autores nessa área.

Mesmo onde não chegaram ao poder, como na França, os populistas têm determinad­o o debate, forçando partidosma­isaocentro­aadotar parte de suas plataforma­s.

Um fenômeno parecido aconteceu na Itália. Nas eleições deste mês, siglas tradiciona­is como o Partido Democrátic­o, de centro-esquerda, propuseram limites à migração, acompanhan­do a música assobiada pelos populistas na campanha. Mas foram eles que dançaram.

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