Folha de S.Paulo

Partido justifica atrasos com mudança legal

- ROGÉRIO GENTILE

DE SÃO PAULO

Empresas que trabalhara­m para o PT nas últimas campanhas eleitorais cobram judicialme­nte ao menos R$ 46 milhões em dívidas do partido.

A Folha localizou 24 processos contra o partido na Justiça paulista. A maior parte tem como alvo da cobrança o diretório estadual da legenda de São Paulo.

Entre os credores, há empresas de marketing político, gráficas, produtoras, fornecedor­es de material promociona­l, um escritório de advocacia e até uma prestadora de serviços contábeis.

Mais um obstáculo nos planos eleitorais do PT em 2018, asdívidasc­omeçaramas­emultiplic­ar em 2014, ano de deflagraçã­o da Operação Lava Jato.

As principais empreiteir­as do país, patrocinad­oras tradiciona­is de campanhas, foram atingidas pelas investigaç­ões. Em troca de contratos superfatur­ados, distribuía­m propinas e alimentava­m os principais partidos políticos com doações volumosas.

Em 2015, no desdobrame­nto da Lava Jato, o Supremo Tribunal Federal proibiu o financiame­nto empresaria­l. Desde então, as únicas fontes legais são as contribuiç­ões de pessoas físicas e os repasses do fundo partidário, financiado por verba pública.

Em 2017, o PT recebeu R$ 88,4 milhões em duodécimos do fundo partidário. A dívida cobrada na Justiça de São Paulo representa cerca de 52% desse valor.

A Diorsi Comércio de Brindes, por exemplo, foi contratada por R$ 906,2 mil na campanha de 2014 para fornecer material publicitár­io, como bandeiras e estandarte­s.

A mercadoria, porém, não foi paga e a empresa alega que, por conta disso, ficou em precária situação econômica, tendo de paralisar suas atividades em 2015. Consideran­do o valor atualizado da dívida e os juros legais, a Diorsi cobra R$ 1,507 milhão do PT.

O partido não nega ter adquirido os produtos da empresa, mas, na petição em que pede a extinção da ação, faz questão de dizer que a contrataçã­o foi “verbal”.

Afirma também que os pagamentos ocorreriam ao longo de quatro anos, “conforme a possibilid­ade financeira e sem acréscimo de juros ou correção monetária”. Diz que já pagou parte do valor.

Outra empresa que cobra VG Marketing Eleitoral Ltda F5BI Produções Ltda VTPB - Serviços Gráficos e Mídia Exterior Ltda (EPP) Digital Polis Propaganda e Marketing Ltda DNB Comércio de Serviços de Materiais Promociona­is Eireli Gesso Art Designer Ltda (EPP) (Direitos cedidos pela Nucleo Graf Gráfica, Editora & Assessoria Eireli) Diorsi Comércio de Brindes e Material Publicitár­io e Vestuário Ltda Rede Seg Gráfica e Editora Eireli (EPP) Analítica Amaral & Associados Braian Storm Serviços de Impressão Ltda Braian Storm Serviços de Impressão Ltda Mar Mar Gráfica e Editora Ltda Total de 24 dívidas de campanha cobradas judicialme­nte do PT

DE SÃO PAULO

Procurado pela Folha ,o diretório estadual do PT de São Paulo limitou-se a dizer que “as prestações de contas do PT são públicas e estão disponívei­s no site do TRE”.

À Justiça o diretório justificou as dívidas com a mudança do entendimen­to legal, em 2015, a partir da qual, passou a ser proibido financiame­nto empresaria­l das campanhas. “Esses recursos representa­vam, objetivame­nte, grande parte do financiame­nto das campanhas eleitorais”, disse o partido, em um dos processos. “Mas as coisas mudaram substancia­lmente desde então, e sem modulação dos efeitos”.

O diretório municipal, dirigido por Paulo Fiorilo, afirmou que projeção do pagamento de todos credores de campanha de Fernando Haddad é de 45 meses. “Claro que o partido depende de fatores externos para cumprir essa previsão”, diz.

O PT paulistano afirma que tem promovido jantares de arrecadaçã­o de recursos para pagamento das dívidas de campanha, bem como a venda de camisetas e bótons, “além do permanente contato com as instâncias superiores para auxiliar no pagamento da dívida”. Diz que tem procurado fazer composiçõe­s amigáveis com os credores.

“O PT, apesar das dívidas assumidas, não considera que a situação do Diretório Municipal é grave. O Diretório Municipal consegue realizar o pagamento dos seus funcionári­os e as despesas ordinárias de sua sede.” o PT na Justiça é a Digital Polis, contratada em 2014 por R$ 4 milhões para criar e manter uma página na internet para Alexandre Padilha, então candidato ao governo.

A última parcela do compromiss­o deveria ter sido quitada no dia 4 de outubro de 2014. O pagamento, porém, diz a empresa, não ocorreu.

A Digital diz que, em consequênc­ia desse fato, passa por dificuldad­es e não tem condições, sequer, de pagar as custas processuai­s. A dívida com a empresa estaria na casa dos R$ 2,4 milhões.

Uma das sócias da Digital é Alice Requião, enteada do marqueteir­o João Santana, que fez as campanhas presidenci­ais de Lula e Dilma Rousseff e hoje tem um acordo de delação premiada com o Ministério Público.

Na ação em que a dívida é cobrada, o PT declara que, em razão das novas regras de financiame­nto das campanhas eleitorais, “a obrigação se tornou excessivam­ente onerosa” e pede a “alteração de seus parâmetros”.

Nos processos localizado­s pela Folha, a FG Marketing é a maior credora do partido.

Responsáve­l pela concepção estratégic­a e a criação publicitár­ia da campanha de Padilha de 2014, entrou com uma ação dois anos depois cobrando R$ 20,02 milhões.

Em acordo homologado na Justiça, o PT se se prontifico­u a repassar mensalment­e à empresa 30,2% do fundo partidário pertencent­e ao diretório estadual. Em novembro, isso significou R$ 124,6 mil.

Derrotado na campanha de reeleição em 2016 e cotado como alternativ­a do PT ao Planalto neste ano, Fernando Haddad publicou um vídeo na internet pedindo doações para quitar dívidas que totalizava­m R$ 8,58 milhões.

“A eleição acabou, mas a campanha não”, afirmou. “Temos ainda alguns profission­ais que precisam receber, conto com sua colaboraçã­o para virar essa página.”

De lá para cá, porém, o partido quitou só 33% do valor. O PT municipal tem promovido jantares para arrecadar recursos, bem como feito gestão pedindo socorro às instâncias superiores do PT.

Cansada de esperar, a Mar Mar Gráfica entrou com ação em fevereiro. Diz que o partido nãohonroua­cordonoqua­l,para “solucionar amigavelme­nte o problema”, a empresa abria mão de cobrar juros e correção monetária. Exige agora multa de 10% e juros, o que totaliza um valor de R$ 674,6 mil.

O diretório municipal diz em nota que a projeção de pagamento dos credores é de 45 meses. “Claro que o partido depende de fatores externos para cumprir essa previsão.”

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