Folha de S.Paulo

Emprego informal tira força da retomada

Consumo fica abaixo do projetado e especialis­tas já atribuem o fenômeno às mudanças no mercado de trabalho

- FLAVIA LIMA

Consultori­a que avalia o tema diz que as famílias não têm segurança para gastar quando perdem a carteira assinada

A recuperaçã­o do mercado de trabalho puxada pelo emprego informal, sem carteira assinada, não dá segurança para as famílias voltarem a consumir com força e pode compromete­r a retomada.

Para especialis­tas, a conclusão se ancora no cruzamento de dados. Em 2017, foram criadas 1,8 milhão de vagas— todas no setor informal. Com carteira, 685 mil vagas foram perdidas.

Também conta a renda média dos sem carteira e de pequenos empreended­ores, metade da renda dos formais, já descontada a inflação.

“A propensão a consumir de um empregado formal, que tem mais segurança e acesso ao crédito, é maior do que a de um informal”, diz Marcelo Gazzano, economista da consultori­a AC Pastore.

Estudo da consultori­a de Affonso Celso Pastore, expresiden­te do Banco Central, busca entender por que projeções de consumo vinham negligenci­ando esse efeito.

A sugestão é que, envolvidos pelo cenário de juros mais baixos e melhora, ainda que incipiente, de salários e crédito, analistas menospreza­ram o peso da carteira de trabalho em decisões de consumo —o que também explicaria a trajetória surpreende­ntemente errática do varejo nos últimos meses.

A equipe de Pastore considera revisar a projeção de cresciment­o para 2018, ainda em 3%. A expectativ­a é que fique próxima de 2,5%.

“Não dá para dizer: não haverá recuperaçã­o econômica pelo consumo. Ela virá. Mas menos robusta do que se imaginava em razão da profunda alteração no mercado de trabalho”, diz Marcelo Gazzano, responsáve­l pelo estudo.

Um bom exercício, diz ele, é olhar para o consumo das famílias e para o mercado de trabalho num período maior.

O consumo atingiu o pico da série histórica, iniciada em 1996, entre 2011 e 2014. Nesse momento, a proporção de trabalhado­res com carteira assinada na população ocupada também esteve no teto histórico, ao redor de 45%.

Em apenas três anos, esse percentual foi para 42%, mas o consumo não teve o mesmo comportame­nto, em especial no ano passado. A trajetória positiva do varejo em 2017 tirou as atenções do mercado de trabalho nessa correlação.

E a oferta de vagas piorou muito. No fim de 2011, eram 39,9 milhões de trabalhado­res com carteira. No fim de 2017, 38,4 milhões. No mesmo período, o país saiu do pleno emprego para uma situação em que há 12,3 milhões de desemprega­dos, 26,4 milhões de subemprega­dos e 4,4 milhões que desistiram de buscar trabalho.

O melhor comportame­nto do varejo em 2017, avalia-se hoje, pode ter sido provocado pela liberação de R$ 44 bilhões do FGTS (Fundo de Garantia do Tempo de Serviço), pois parte foi para compras. ALERTA O sinal de alerta veio com o desempenho pífio do consumo das famílias nos últimos três meses de 2017. Com 65% do PIB (Produto Interno Bruto), o consumo determina o que ocorre na economia.

Após alta de 1% no segundo e terceiro trimestres de 2017, o consumo quase não se moveu entre outubro e dezembro. No período, as projeções da AC Pastore, pareciam muito otimistas e passaram a se descolar dos dados.

A equipe deu, então, um peso maior ao consumo dos formais para explicar vendas mais modestas e as previsões voltaram a aderir à realidade. AC Pastore

ELISA BETTY COSTA

Comerciant­e

 ?? Thiago Bernardes/ Folhapress ?? Elisa Betty Costa mostra os bolos de sua confeitari­a; sem a segurança da carteira assinada, ela diz que agora compra apenas quando tem dinheiro
Thiago Bernardes/ Folhapress Elisa Betty Costa mostra os bolos de sua confeitari­a; sem a segurança da carteira assinada, ela diz que agora compra apenas quando tem dinheiro

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