Por que morre um curso de pós-graduação?
USP, principal universidade do país, teve seis programas descredenciados na última avaliação nacional da área
docente, acomodação e do conhecimento estão
DE SÃO PAULO
Maior e mais reputada universidade pública brasileira, a USP colheu recentemente alguns resultados negativos —e, para muitos, talvez, inesperados— no que tange à sua pós-graduação.
Na última avaliação nacional da área, a Capes, órgão ligado ao Ministério da Educação (MEC), recomendou o descredenciamento de seis programas “stricto sensu” da instituição.
Na prática, isso significa que os doutorados em clínica cirúrgica, nutrição humana aplicada, literatura e cultura russa, estudos árabes e judaicos, estudos de tradução e história econômica deixarão de existir.
A avaliação conduzida pelo órgão do MEC busca aferir a qualidade tanto da produção acadêmica como da formação oferecida aos alunos por cada um dos mais de 4.000 programas de pós-graduação hoje existentes no país. Apesar de já contar mais de 40 anos, o exame adquiriu seu formato atual apenas em 1998.
“Como no passado havia poucos cursos de pós, o processo era mais artesanal e pouco estruturado. Com a rápida expansão da área, a partir dos anos 1990, ele se tornou informatizado, os critérios foram padronizados e introduziu-se uma análise qualitativa dos artigos publicados”, explica Rita Barata, diretora de avaliação da Capes.
O órgão do MEC classifica os cursos com notas que vão de 1 a 7. Para funcionarem, os programas de mestrado precisam receber, no mínimo, a nota 3 e os de doutorado, 4.
Segundo Barata, a avaliação busca garantir a manutenção da qualidade dos nossos programas de pós-graduação. “De um lado, serve de guia para o aluno, que pode conferir o status da pós que pretende cursar. De outro, constitui um retorno para as universidades de como está sendo o desempenho de seus programas na comparação com o de outras instituições”, diz.
No caso específico da USP, o retorno recebido na avaliação recém-concluída não foi dos melhores. O número de cursos descredenciados cresceu com relação às duas avaliações anteriores. Na de 2013, nenhum curso recebeu essa recomendação; na de 2010, apenas um. Entre as universidades estaduais paulistas, na última avaliação quadrienal, Unesp e Unicamp passaram incólumes.
“É claro que os descredenciamentos nos preocupam, mas, do ponto de vista estatístico, essa variação é relativamente pequena, sobretudo porque o número de cursos é grande e foi aumentando”, pondera Marcio de Castro Silva Filho, pró-reitor pro tempore de pós-graduação da USP.
De fato, os seis cursos descredenciados pela Capes representam uma gota no oceano de 270 programas oferecidos pela universidade, os quais contam com cerca de 30 mil alunos.
O resultado, no entanto, parece sinalizar certo esgotamento do modelo atual. Na visão do pró-reitor da USP, a pós-graduação da universidade atingiu um gigantismo que suscita discussões. “Estamos pensando em novos desenhos para alguns cursos, na fusão de outros em programas maiores e em torná-los mais interdisciplinares”, diz.
Correções de rota à parte, resta a pergunta: por que um programa de pós-graduação na principal universidade do país eventualmente morre? A resposta não é simples nem única.
Silva Filho, falando de forma geral, diz que “há casos em que um curso se desmembra em outro e, assim, o curso original acaba se enfraquecendo. A própria dinâmica do conhecimento em programas mais antigos pode perder densidade e os docentes podem acabar migrando para outra área”.
“Além disso, a reposição de docentes na universidade não vem ocorrendo na mesma velocidade das aposentadorias e alguns programas têm sofrido um processo de envelhecimento de seus quadros”.
A seguir, o leitor encontra a história de três desses cursos.