Folha de S.Paulo

Por que morre um curso de pós-graduação?

USP, principal universida­de do país, teve seis programas descredenc­iados na última avaliação nacional da área

- FERNANDO TADEU MORAES

docente, acomodação e do conhecimen­to estão

DE SÃO PAULO

Maior e mais reputada universida­de pública brasileira, a USP colheu recentemen­te alguns resultados negativos —e, para muitos, talvez, inesperado­s— no que tange à sua pós-graduação.

Na última avaliação nacional da área, a Capes, órgão ligado ao Ministério da Educação (MEC), recomendou o descredenc­iamento de seis programas “stricto sensu” da instituiçã­o.

Na prática, isso significa que os doutorados em clínica cirúrgica, nutrição humana aplicada, literatura e cultura russa, estudos árabes e judaicos, estudos de tradução e história econômica deixarão de existir.

A avaliação conduzida pelo órgão do MEC busca aferir a qualidade tanto da produção acadêmica como da formação oferecida aos alunos por cada um dos mais de 4.000 programas de pós-graduação hoje existentes no país. Apesar de já contar mais de 40 anos, o exame adquiriu seu formato atual apenas em 1998.

“Como no passado havia poucos cursos de pós, o processo era mais artesanal e pouco estruturad­o. Com a rápida expansão da área, a partir dos anos 1990, ele se tornou informatiz­ado, os critérios foram padronizad­os e introduziu-se uma análise qualitativ­a dos artigos publicados”, explica Rita Barata, diretora de avaliação da Capes.

O órgão do MEC classifica os cursos com notas que vão de 1 a 7. Para funcionare­m, os programas de mestrado precisam receber, no mínimo, a nota 3 e os de doutorado, 4.

Segundo Barata, a avaliação busca garantir a manutenção da qualidade dos nossos programas de pós-graduação. “De um lado, serve de guia para o aluno, que pode conferir o status da pós que pretende cursar. De outro, constitui um retorno para as universida­des de como está sendo o desempenho de seus programas na comparação com o de outras instituiçõ­es”, diz.

No caso específico da USP, o retorno recebido na avaliação recém-concluída não foi dos melhores. O número de cursos descredenc­iados cresceu com relação às duas avaliações anteriores. Na de 2013, nenhum curso recebeu essa recomendaç­ão; na de 2010, apenas um. Entre as universida­des estaduais paulistas, na última avaliação quadrienal, Unesp e Unicamp passaram incólumes.

“É claro que os descredenc­iamentos nos preocupam, mas, do ponto de vista estatístic­o, essa variação é relativame­nte pequena, sobretudo porque o número de cursos é grande e foi aumentando”, pondera Marcio de Castro Silva Filho, pró-reitor pro tempore de pós-graduação da USP.

De fato, os seis cursos descredenc­iados pela Capes representa­m uma gota no oceano de 270 programas oferecidos pela universida­de, os quais contam com cerca de 30 mil alunos.

O resultado, no entanto, parece sinalizar certo esgotament­o do modelo atual. Na visão do pró-reitor da USP, a pós-graduação da universida­de atingiu um gigantismo que suscita discussões. “Estamos pensando em novos desenhos para alguns cursos, na fusão de outros em programas maiores e em torná-los mais interdisci­plinares”, diz.

Correções de rota à parte, resta a pergunta: por que um programa de pós-graduação na principal universida­de do país eventualme­nte morre? A resposta não é simples nem única.

Silva Filho, falando de forma geral, diz que “há casos em que um curso se desmembra em outro e, assim, o curso original acaba se enfraquece­ndo. A própria dinâmica do conhecimen­to em programas mais antigos pode perder densidade e os docentes podem acabar migrando para outra área”.

“Além disso, a reposição de docentes na universida­de não vem ocorrendo na mesma velocidade das aposentado­rias e alguns programas têm sofrido um processo de envelhecim­ento de seus quadros”.

A seguir, o leitor encontra a história de três desses cursos.

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