Folha de S.Paulo

Pretensão presidenci­al

Na falta de nomes dispostos a defender o governo, Temer e Meirelles se apresentam para a tarefa; reformas são obra em curso, não um legado

-

Em quase três décadas desde o restabelec­imento das eleições diretas para presidente, o PMDB, agora novamente MDB, só disputou duas delas com candidato próprio —as primeiras, de 1989 e 1994, com votação vexatória em ambas.

É o suficiente para recomendar ceticismo diante das intenções manifestad­as pelo presidente Michel Temer e por seu ministro da Fazenda, Henrique Meirelles (hoje no PSD), de representa­r o partido na corrida deste ano ao Planalto.

Pretensões ou especulaçõ­es do gênero já ocorreram em ocasiões anteriores. Nada, porém, capaz de fazer a sigla abandonar sua receita de sobrevivên­cia, baseada em expressiva­s votações para governos regionais e o Legislativ­o federal, que lhe permitiram negociar em condições privilegia­das seu apoio às gestões tucanas e petistas.

O cenário atual, decerto, mostra-se diferente —e nem tanto pelo fato de o MDB manejar a caneta presidenci­al, ativo consideráv­el que se soma a seu tempo de propaganda televisiva e sua estrutura invejável no interior do país.

Não parece prudente apostar que isso baste para reverter a vasta rejeição ao governo e ao mandatário. Ao final de janeiro, segundo o Datafolha, 87% dos eleitores des- cartavam a ideia de votar num candidato apoiado por Temer.

Acima das chances reais de vitória (e de preservaçã­o do foro especial), o impulso mais importante à candidatur­a é o esfarelame­nto do quadro partidário nacional.

Dominantes ao longo de duas décadas, PT e PSDB se viram atropelado­s pela Lava Jato —o primeiro mais que o segundo. Rompeuse, ademais, a aliança firmada entre tucanos e emedebista­s para o impeachmen­t de Dilma Rousseff.

Na ausência de outro postulante disposto a enaltecer os feitos governista­s em campanha, Temer e Meirelles se apresentam para a tarefa. Como nenhum nome do campo centrista se destaca nas pesquisas, reduz-se a pressa em definir as chapas e coligações.

Não há propriamen­te um legado, mas uma agenda a ser defendida. A urgência das reformas econômicas já havia sido reconhecid­a até pela petista deposta; a coalizão que a sucedeu conquistou avanços notáveis, como o teto para os gastos públicos, o redesenho da legislação trabalhist­a e o corte dos subsídios do BNDES.

Houve ainda ajustes imediatos que permitiram a queda da inflação e dos juros do Banco Central.

Tal programa, entretanto, já perdera prioridade após o flagrante da vergonhosa conversa entre Temer e o empresário Joesley Batista. O empenho do presidente em segurar-se no cargo e, agora, em buscar popularida­de ameaça ainda mais o trabalho em andamento. BRASÍLIA -

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Brazil