Folha de S.Paulo

Refazenda

Desempenho de Meirelles no ministério se deveu a agenda clara e respaldo do Planalto; seu substituto precisa contar com as mesmas condições

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No governo de um presidente em fim de mandato, cuja sobrevivên­cia política mais uma vez se encontra sob ameaça, inexiste a possibilid­ade de uma reforma ministeria­l concorrer para a melhora da administra­ção pública.

Nos próximos dias serão substituíd­os nomes do primeiro escalão que pretendem disputar cargos eletivos. Poucos terão deixado alguma marca meritória; quase nada se espera dos novos titulares das pastas além de preservar o apoio partidário a Michel Temer (MDB).

Nesse panorama, a única troca de guarda relevante para o país que existe fora de Brasília deve ocorrer na Fazenda.

O ministro que sai, Henrique Meirelles, realizou um trabalho competente ao longo de quase dois anos no posto —sua única excentrici­dade foi ambicionar uma candidatur­a presidenci­al.

Em quase todo governo, o comando da política econômica é cercado de atenção especial, dado que qualquer sinal de inépcia nessa seara provoca danos imediatos e de difícil reversão.

Sob Temer, o protagonis­mo da pasta se mostrou ainda mais evidente. Reparar os estragos produzidos pela gestão de Dilma Rousseff (PT), afinal, era na prática a razão de ser do governo que se seguiu ao impeachmen­t.

O feito principal, para o qual contribuiu decisivame­nte a articulaçã­o política do Planalto, foi inscrever na Constituiç­ão um teto, com vigência de até 20 anos, para as despesas federais.

A restauraçã­o da credibilid­ade, com boa ajuda da conjuntura internacio­nal, favoreceu a queda da inflação e dos juros. Deixou-se para trás a recessão brutal, embora a retomada seja modesta.

O retrospect­o deixa ver que o desempenho de Meirelles se deveu a uma agenda coerente, uma equipe qualificad­a e, em especial, ao respaldo recebido da Presidênci­a. Poucos no cargo desfrutara­m de tais condições desde o restabelec­imento da democracia.

Daí que suscite preocupaçõ­es a mudança na Fazenda —mesmo que o novo titular venha a ser o atual secretário-executivo da pasta, Eduardo Guardia.

Tal opção indica, em tese ao menos, que não se planeja alguma guinada na gestão da economia. Entretanto já não há a mesma clareza quanto à condução da agenda e ao amparo do Planalto.

As pretensões eleitorais de Temer e Meirelles, as investigaç­ões envolvendo o presidente e os desdobrame­ntos da intervençã­o no Rio turvam o cenário. A certeza é que qualquer inflexão na política de austeridad­e em ano eleitoral será aposta de alto risco. SÃO PAULO - BRASÍLIA -

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