Folha de S.Paulo

A pele em jogo

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Nassim Taleb, rara combinação de filósofo, escritor, estatístic­o e investidor, acaba de lançar seu quinto livro, “Skin in the Game” (a pele em jogo), que, como os anteriores, gira em torno da incerteza, da aleatoried­ade e do risco.

Ler Taleb é sempre uma experiênci­a interessan­te. Embora tenda ao exagero e se perca em idiossincr­asias, nunca deixa de produzir insights valiosos. Inteligent­e, erudito e sem medo de entrar em polêmicas, Taleb é capaz de transitar de observaçõe­s sobre filologia semítica comparada à análise da natureza matemática do caos. No meio, sempre encontra um modo de xingar seus desafetos, que não são poucos. Em “Skin” os alvos preferenci­ais são Steven Pinker, a monarquia saudita e quase todos os acadêmicos, jornalista­s e políticos.

A ideia central de “Skin” é que, devido às assimetria­s de risco, devemos desconfiar de todos aqueles que não colocam sua pele em jogo. O político que determina uma intervençã­o militar, mas não vai à frente das tropas, e o banqueiro que recomenda ao cliente comprar uma ação, mas não a tem em seu portfólio pessoal, não devem ser levados a sério.

É uma tese complicada. Não há dúvida de que nossos sistemas de regulação ganhariam se responsabi­lizassem um pouco mais políticos, burocratas e agentes privados pelas decisões tecnicamen­te erradas que tomam que implicam prejuízos coletivos. Os chefões de Wall Street não pagaram o preço que deveriam pela crise que provocaram em 2008.

Não dá, porém, para levar muito longe o conceito proposto por Taleb. Num mundo de especializ­ação do trabalho, não faz sentido que presidente­s ou premiês comandem cargas de infantaria. Também não é exato afirmar que políticos, consultore­s e intelectua­is nunca arriscam nada. Danos reputacion­ais, afinal, existem e têm consequênc­ias.

“Skin”, embora seja uma leitura divertida, não é o melhor Taleb. helio@uol.com.br

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