Folha de S.Paulo

Atualmente, a maioria dos imigrantes apreendido­s vem da América Central. Guatemala,

- ESTELITA HASS CARAZZAI

DE WASHINGTON

Após sofrer uma queda abrupta no início do governo de Donald Trump, o fluxo de imigrantes ilegais que cruzam a fronteira dos EUA com o México voltou a aumentar —e pelo rio, o que põe em dúvida a eficácia de um muro.

Desde maio de 2017, o número de estrangeir­os apreendido­s pela patrulha da fronteira vem crescendo. Em dezembro, chegou a quase 30 mil pessoas.

Ao contrário do que ocorria no passado, a maioria hoje entra pelo vale do rio Grande, no Texas (veja quadro à dir.), onde os países são separados por água e áreas florestais. O trecho virou a principal via terrestre de ingresso de imigrantes nos últimos cinco anos, substituin­do o vale do Arizona, onde a travessia se faz pelo deserto.

Para especialis­tas em imigração, trata-se de mais uma prova de que o muro defendido por Trump não iria ajudar a conter o fluxo.

“É uma grande ironia”, diz a pesquisado­ra Vanda Felbab-Brown, da Brookings Institutio­n, que preparou recentemen­te um relatório sobre a fronteira. Segundo ela, a área é em boa parte inóspita, repleta de reservas florestais e penhascos, o que dificultar­ia a construção da barreira.

Mesmo com um muro logo após o rio, quem pisasse em solo americano poderia pedir asilo e teria direito à acolhida da patrulha da fronteira —ainda que o pedido terminasse negado pela Justiça.

A parede monumental poderia ainda incentivar a busca por outras estratégia­s de entrada —por exemplo, via esconderij­o nos baús de caminhões, como já ocorre.

“É um jogo de gato e rato”, afirma o salvadoren­ho Abel Núñez, diretor da Carecen, que dá apoio a centro-americanos nos EUA. “Se não entrarem como antes, vão construir túneis, subir escadas.” AMÉRICA CENTRAL El Salvador e Honduras, em profunda crise política e de segurança, respondem por cerca de metade do fluxo.

Boa parte é de crianças e adolescent­es, muitos dos quais viajam sozinhos, fugindo da violência de gangues em seus países de origem.

“Essas pessoas estão vivendo uma desgraça tão grande que decidem correr o risco”, diz o advogado brasileiro Fernando Alvares, especialis­ta em imigração.

A queda dramática de apreensões no início do governo Trump é interpreta­da como uma “acomodação”, diante da expectativ­a de endurecime­nto das políticas migratória­s. “Ficaram com medo, lógico. Quando viram que estava tudo normal, voltaram”, afirma Alvares.

Algumas organizaçõ­es sustentam que o muro não vai atacar as principais causas do fluxo migratório ilegal, como a pobreza da América Central.

Segundo relatório do Centro para Estudos de Migração, nos últimos anos, mais pessoas permanecer­am ilegalment­e nos EUA por meio de vistos expirados do que tendo entrado a pé pela fronteira.

Trump argumenta que o muro é “a primeira linha de defesa” contra imigrantes ilegais, drogas e contraband­o.

O governo depende de aprovação orçamentár­ia para começar a obra —o pedido inicial ao Congresso foi de US$ 18 bilhões (R$ 59,8 mi). Na última semana, o presidente aventou a possibilid­ade de usar verbas do Pentágono na construção. POR ONDE ENTRAM Se antes o deserto do Arizona era a principal porta de entrada, agora é o vale do Rio Grande Apreensões por trecho

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John Moore - 21.fev.2018/Getty Images/AFP Agentes da patrulha de fronteira abordam grupo de imigrantes na cerca entre EUA e México

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