Folha de S.Paulo

Os últimos dias de Michel Temer

- VINICIUS TORRES FREIRE

OS DEPUTADOS tendem a empurrar com a barriga uma nova denúncia da Procurador­ia-Geral contra Michel Temer. Exceto em caso de “comoção grave”, a Câmara tentaria deixar a decisão sobre a abertura de um processo para depois da eleição. Não quer se envolver. Isso não resolve o rolo.

Ninguém dava crédito à candidatur­a de Temer, mas a prisão do resto dos homens do presidente mexe um tanto mais esse coquetel de imundícies e indignidad­es que é a eleição de 2018.

A degradação extra da imagem do presidente faz com que seu caixão seja ainda mais difícil de carregar até as urnas, em particular para o MDB. Os parlamenta­res do partido das gangues de Eduardo Cunha, Sérgio Cabral, Geddel etc. precisam se eleger para um foro especial, como tantos outros, verdade, mas têm o problema adicional de se dissociar de Temer na campanha, risco de os presos novatos delatarem.

Para quem os MDBs vão se bandear? Os partidos que restaram na coalizão do governo, três ou quatro, vão pular em que barco? Temer é o beijo da morte pestilenta. Seu apodrecime­nto extra deve ter algum efeito nas alianças para uma eleição que, no primeiro turno, deve ser decidida por diferença de escassos pontos percentuai­s.

Quanto mais sururu, mais pressionad­os os políticos ficarão a dizer Raquel Dodge, apresente nova denúncia, mais partidos ainda terão de explicar a proximidad­e com Temer.

Mesmo que Henrique Meirelles seja o candidato do MDB, a situação não melhora. O ministro ainda teria de carregar o zumbi presidenci­al nas costas. A situação econômica não deve ser atenuante, mesmo que o país esteja crescendo a 3,1% no terceiro trimestre (ante o mesmo trimestre de 2017), como prevê “o mercado”.

Seria uma recuperaçã­o pequena, mais rico do país esteja mais animadinho, o que não deve refrescar a situação do governismo.

Difícil imaginar que Raquel Dodge não tenha uma denúncia em perspectiv­a. Quando seria? Entre a noite em que Rocha Loures rodou sua malinha de dinheiro pelas calçadas paulistana­s e a primeira denúncia contra Temer, Rodrigo Janot levou dois meses (final de abril a final de junho) —e o antecessor de Dodge tinha pressa. Em pouco mais de um mês, a Câmara digeriu e negou a abertura de processo.

Esse calendário básico sugere que Temer vai ficar no bico do corvo até pouco antes da Copa, sendo triturado por revelações e pela ameaça constante de processo, no mínimo.

Segundo deputados, a desordem votações, ainda mais se largar sua campanha presidenci­al, tida como inviável até por cabeças de seu partido, o DEM.

Temer tem como adquirir sangue no Congresso, mas sua sobrevida vai se resumir a estrebucha­r no Planalto e a dividir com Lula o centro do palco da desordem político-judicial do país. vinicius.torres@grupofolha.com.br

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Brazil