Folha de S.Paulo

Cresciment­o, desenvolvi­mento e emprego

- BENJAMIN STEINBRUCH COLUNISTAS DA SEMANA segunda: Marcia Dessen; terça: Benjamin Steinbruch; quarta: Alexandre Schwartsma­n; quinta: Laura Carvalho; sexta: Pedro Luiz Passos; sábado: Rodrigo Zeidan; domingo:

CINQUENTA ANOS atrás, em 27 de março de 1968, São Paulo comemorava a “Viagem do Adeus”. O último bonde da cidade, conduzido por Francisco Lourenço Ferreira, percorreu as avenidas Ibirapuera, Vereador José Diniz e Adolfo Pinheiro até Santo Amaro.

Uma reportagem da Folha de terça passada (27) conta que Francisco, na época o condutor mais antigo da capital, chorou durante a viagem. “Rendo-me ao Progresso”, diziam faixas pregadas nas janelas dos veículos elétricos cujas linhas chegaram a ter 700 quilômetro­s na cidade, mas se tornaram sinônimos do atraso. Atrapalhav­am o trânsito dos automóveis e provocavam acidentes.

O prefeito da época, Faria Lima, anunciava que a cidade partiria para a modernidad­e em matéria de transporte coletivo com a companhia do Metrô, criada um mês depois da aposentado­ria dos bondes.

Passados 50 anos, com as recentes inauguraçõ­es, o metrô de São Paulo tem cerca de cem quilômetro­s que substituiu o último trajeto dos bondes só foi inaugurada neste ano.

Esse é um exemplo que expõe, de forma dramática, a deficiênci­a dos investimen­tos em infraestru­tura no país. Sabemos todos que, sem a aplicação de recursos nessa área, na indústria e em outros setores essenciais e inovadores, nenhum país pode alcançar o desenvolvi­mento.

O que vemos no Brasil, entretanto, é o estímulo insistente ao setor financeiro e o abandono persistent­e dos setores produtivos. Uma compilação do jornal Valor Econômico 2014 a 2017, as cinco maiores instituiçõ­es financeira­s do país tiveram lucro somado de R$ 244 bilhões. Esse valor superou com folga os ganhos líquidos de R$ 56 bilhões das 307 companhias abertas não financeira­s no mesmo período.

Isso não é normal, e as causas da anormalida­de são conhecidas. O privilégio do setor financeiro está estampado nas tarifas e nos juros cobrados no mercado, com margens que não cedem nem quando a taxa de juro básica é reduzida, empréstimo­s a pessoas físicas subiram de 55,8% ao ano em janeiro para 57,7% ao ano em fevereiro. A taxa média geral também subiu de 26,1% para 26,3% no mesmo intervalo. Para o cheque especial, o juro médio está em 324% ao ano, praticamen­te o mesmo de um ano atrás, embora a Selic tenha caído de 12,25% para 6,5% no período.

O desprezo ao setor produtivo, exposto a taxas abusivas em todas as linhas de financiame­nto, levou o país a perder espaço que havia conquistad­o na produção e na exportação de produtos industrial­izados. No ano 2000, a participaç­ão dos industrial­izados na pauta de exportação brasileira era de 75%. No ano passado, foi de 51%. embora estejam sendo modernizad­os e retomados em alguns países. Mas o financiame­nto a projetos de infraestru­turaedemod­ernizaçãoi­ndustrial podem e devem ser reavivados. São a maneira mais rápida de o país retomar o caminho do cresciment­o, desenvolvi­mento e emprego. BENJAMIN STEINBRUCH, bvictoria@psi.com.br

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