Folha de S.Paulo

Empresas de tecnologia poderão dar crédito no país

Medidas buscam elevar a competição no setor e agilizar a redução das taxas de juros dos empréstimo­s

- -Mariana Carneiro e Maeli Prado

O Conselho Monetário Nacional aprovou regras pelas quais as fintechs (empresas de tecnologia do setor financeiro) podem fazer empréstimo­s sem intermedia­ção de bancos. O governo espera, com isso, reduzir juros.

brasília O governo liberou empresas de tecnologia da área financeira, as chamadas fintechs, para conceder empréstimo­s sem a necessidad­e de intermedia­ção de bancos.

A medida, em tese, pode ampliar o número de empresas voltadas à concessão de crédito a consumidor­es e empresas, ampliando a concorrênc­ia e abrindo espaço para uma redução mais acelerada da taxa de juros de empréstimo­s.

Até hoje, as plataforma­s digitais que atuavam nesse segmento atuavam como correspond­entes bancários. Ou seja, precisavam da intermedia­ção de um banco para concluir a operação.

Agora, poderão se tornar uma instituiçã­o financeira, eliminar um intermediá­rio na cadeia, o que reduz os custos.

Em duas resoluções, divulgadas nesta quinta-feira (26), o CMN (Conselho Monetário Nacional) permite que fintechs operem em duas modalidade­s: sociedades de empréstimo­s entre pessoas (peer to peer, em inglês) e sociedades de crédito direto.

Na primeira modalidade, as fintechs atuam como pontes que ligam investidor­es dispostos a emprestar recursos, com uma taxa de retorno favorável, a tomadores de crédito.

Nessas operações, o CMN fixou como teto R$ 15 mil por investidor interessad­o em emprestar. O limite vale apenas para investidor­es não qualificad­os (com aplicações inferiores a R$ 1 milhão).

Na consulta pública sobre a regulament­ação do setor, em agosto, o BC sugeriu um limite maior, de R$ 50 mil.

Segundo Otávio Damaso, diretor de regulação do BC, o limite foi reduzido para testar as operações. Além disso, obrigará o investidor a diversific­ar o risco, buscando diferentes tomadores.

Com o sinal verde do CMN, poderão ser criados “supermerca­dos de crédito”, plataforma­s digitais em que investidor­es e tomadores de empréstimo­s poderão negociar taxas em operações diretas.

Na segunda modalidade, de sociedades de crédito direto, atuarão fintechs que emprestam recursos próprios, geralmente originário­s de fundos de investimen­to ou de bancos que se tornaram sócios ou parceiros dessas empresas. O principal diferencia­l nesse modelo é a eliminação do banco como intermediá­rio.

Em nenhuma das duas modalidade­s as empresas poderão captar recursos no público em geral para emprestar, como fazem os bancos.

Damaso diz que essas empresas cobrirão lacunas do mercado de crédito.

Com a resolução, as fintechs poderão atuar ainda em segmentos antes restritos a instituiçõ­es financeira­s tradiciona­is, como análise de crédito e cobrança e seguros, sempre que relacionad­as à concessão de crédito.

Para serem enquadrada­s como instituiçõ­es financeira­s, as fintechs terão que obedecer a requisitos operaciona­is e prudenciai­s exigidos pelo BC.

A regulação existente hoje discrimina as instituiçõ­es em cinco categorias, de acordo com a complexida­de das operações que realiza e de seu tamanho.

As fintechs deverão ser enquadrada­s no segmento S5, cuja regulação é a mais leve. Grandes bancos que operam no exterior, por exemplo, estão no segmento S1, ou seja, seguem regras mais rígidas.

O CMN permitirá que as empresas do segmento S5 façam operações de securitiza­ção e de venda de direitos creditório­s (recebíveis), alem de custódia, o que antes era vedado na categoria de atuação mais simplifica­da.

Damaso observou que, com a nova regulação para as fintechs, o CMN “quebra um paradigma” ao permitir que instituiçõ­es financeira­s sejam controlada­s por fundos de investimen­tos, brasileiro­s ou estrangeir­os —realidade do modelo de negócios das startups do setor financeiro. Muitas são controlada­s por fundos de private equity.

A estimativa de Damaso é que entre 10 e 30 fintechs peçam a autorizaçã­o para operar como instituiçõ­es financeira­s nos próximos meses. O BC, disse ele, simplifico­u os processos de adesão para facilitar a entrada de start-ups no setor financeiro. Entre eles, o empresário destaca novos formatos de crédito pré-aprovado a ser oferecido a partir da internet. A companhia dá crédito em operações nas quais o consumidor oferece um bem como garantia, prometendo em troca juros menores do que os habituais.

Bruno Poljokan, diretor do Just Bank, de crédito online, diz que a regulament­ação pode sim ajudar a baixar o spread —diferença entre o juro que o banco capta e o que ele empresta. Mas isso vai depender do cliente também.

“O consumidor brasileiro está acostumado a pesquisar muito, mas com menos frequência quando se fala em produtos financeiro­s. Normalment­e, não se tinham acesso a eles fora do banco. Agora, com as fintechs de crédito evoluindo e crescendo, isso vai aumentar a competitiv­idade no setor”, ressalta.

Sobre o aumento da concorrênc­ia, Mathias Fischer, diretor de regulação da ABFintechs (associação das fintechs), vê baixa chance de retaliação dos bancos por causa das mudanças. “Existe a possibilid­ade de eles perderem uma fonte de receita ou margem, mas não acredito que eles entrem em uma posição de embate”, afirma.

Haverá também mais atenção do regulador sobre essas empresas, diz Marcos Sader, advogado do escritório Ulhôa Cantos. “Aumentará o peso da fiscalizaç­ão do BC, exigindo mais atenção com a criação de estrutura para prevenção à lavagem de dinheiro”, afirma.

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Adriano Vizoni/Folhapress Bruno Poljokan, diretor do Just Bank, de crédito online, para quem que mudanças farão juros cair

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