Rompimentos de mineroduto MG-RJ da Anglo impactam água e empregos
Nas cidades atingidas, persiste o medo de desabastecimento e contaminação da água e de demissões após suspensão das atividades
minas gerais e rio “Ninguém sabe o que está por vir”, diz um trabalhador da mineradora Anglo American após participar de assembleia com o sindicato sobre férias coletivas.
O clima de incerteza que se espalhou do início ao fim dos trabalhos pelos 529 km do mineroduto Minas-Rio teve origem em dois pontos da tubulação, onde houve rompimentos em 12 e 29 de março. No total, 1.860 toneladas de minério de ferro vazaram em Santo Antônio do Grama (MG), a 230 km de Belo Horizonte.
Após o segundo rompimento, o Ibama determinou a suspensão das atividades até que uma inspeção comprove a segurança do sistema, o que, na estimativa da mineradora, vai levar 90 dias. Sindicalistas, porém, preveem mais de cinco meses até a retomada.
Em Conceição do Mato Dentro (MG), ponto de partida do mineroduto após extração e do minério, 766 dos 1.474 funcionários estão na pausa forçada de 30 dias desde o dia 17. A mineradora não descarta suspensão de contratos.
Em São João da Barra (RJ), onde o minério é escoado, metade dos 240 trabalhadores da Ferroport, joint venture entre a Anglo e a Prumo que opera as atividades no Porto do Açu, entraram em férias coletivas.
Além de inspecionar o duto, a mineradora é responsável por reparar os danos ambientais dos vazamentos até 31 de maio. Para isso, a Anglo diz ter mobilizado 300 trabalhadores e R$ 60 milhões.
Cerca de 26% do minério expelido foi para o córrego Santo Antônio. A maior parte atingiu uma barragem da Anglo e áreas de pasto. O trabalho é de retirar o minério grudado nas margens e no leito do rio.
Pelo córrego, o minério se espalhou por 11 km e a captação de água para o abastecimento da cidade foi interrompida. Por três dias, os moradores dependeram de caminhões-pipa da mineradora até que uma nova adutora fosse instalada no córrego Salgado.
Foi essa mudança que, no segundo rompimento, evitou que a falta de água se repetisse. Segundo órgãos ambientais, testes indicam que a qualidade da água voltou aos patamares exigidos por lei.
Ainda assim, o medo do desabastecimento e da contaminação da água persiste. “O córrego Salgado tem menos água e o medo é que ele não dê conta no período de se- ca. Tem gente que comprou caixa d’água maior, tem gente comprando água mineral. Não há confiança”, diz Gilvan de Assis, coordenador da Defesa Civil na cidade.
A Anglo ainda não sabe o que levou ao rompimento. A aposta é em um defeito de fabricação de dois dutos que pertenciam ao mesmo lote.
O presidente da Anglo no Brasil, Ruben Fernandes, não quis revelar o nome do fabricante dos tubos com defeito, mas disse à Folha que só 2% do mineroduto foi feito por essa empresa.
A Secretaria de Meio Ambiente de Minas determinou que a Anglo identifique onde estão instalados tubos do mesmo lote dos que se romperam.
A partir do mês que vem, uma máquina chamada PIG (medidor de integridade do duto, na sigla em inglês) vai percorrer a tubulação por dentro, enviando dados que apontam defeitos como corrosão ou perda de espessura.
“Voltamos a operar após o primeiro vazamento porque não havia indicação de que seria um problema maior. Mas, com o segundo, a situação ficou mais grave. Estamos passando o PIG para garantir a integridade do mineroduto”, afirma Fernandes.
A 320 km do rompimento, a cidade de Conceição do Mato Dentro foi a primeira a sentir as consequências da paralisação. Em reunião com o sindicato da região, a Anglo já rascunhou uma proposta de suspensão de contratos, mas ainda não há decisão.
“Nosso foco hoje é com a manutenção do emprego, porque é uma empresa que tem boa remuneração, o pessoal é qualificado e não há muitas vagas no setor depois do vazamento da Samarco”, diz o advogado do Sindicato dos Trabalhadores Portuários, Anderson Bruno.
A tragédia em Mariana (MG) matou 19 pessoas em 2005 com o despejo de cerca de 40 bilhões de litros de rejeitos minerais por 650 km.
Fernandes diz que a possibilidade de demissão é zero e que tentará realocar terceirizados. “A gente tem alternativas. A empresa garante que o empregado não vai ter perda”.
“Assustado todo mundo fica. Todo mundo tem família pra tratar. Mas a proporção nem se compara”, diz Célio Fonseca, 36, operador de máquinas.
“O importante é entender os impactos e mitigá-los”, diz Fernandes. “Temos que quebrar o paradigma de que mineração só destrói.”