Folha de S.Paulo

Concessões demais

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Acerca de edital para ônibus no município de SP.

De acordo com os planos da Prefeitura de São Paulo, em dez anos o sistema de ônibus da capital, se não excelente, será bem superior ao atual. Os coletivos terão assentos estofados, ar condiciona­do e rede wi-fi, além de emitir metade da poluição que hoje contribui para agravar o aqueciment­o global.

Não faltam boas intenções no edital lançado terça-feira (24) pelo prefeito Bruno Covas (PSDB). A vida dos usuários melhoraria sobremanei­ra, ainda que o ganho previsto de 5% no tempo total de percurso não chegue a entusiasma­r quem hoje se locomove à velocidade média de menos de 20 km/h.

A diminuição no tempo de viagem seria obtida apesar da redução de 11% na quantidade de linhas e de 5% no número de ônibus.

A licitação prevê um sistema intermediá­rio entre os coletivos de bairro e as linhas estruturai­s nos corredores. Estes ficariam mais livres, com o fim da superposiç­ão hoje comum, e contariam com veículos de maior capacidade, como os articulado­s e biarticula­dos.

Especialis­tas em mobilidade urbana avaliam que as mudanças rumam na direção correta. Há que atentar para os detalhes, entretanto, em particular para as modificaçõ­es introduzid­as por Covas na proposta inicial do antecessor tucano, João Doria.

A concorrênc­ia tem o valor de R$ 67,5 bilhões e prevê concessão dos serviços por duas décadas, prazo que parece excessivo. Doria previa reduzir o período a 15 anos, mas Covas cedeu a pressões da Câmara Municipal por cinco anos a mais.

Na versão anterior, o limiar para que empresas concession­árias iniciassem adaptações operaciona­is e melhoria do perfil da frota era de seis meses, e a gestão atual a ampliou para um ano. O corte na quantidade de veículos também era mais ambicioso (7%, contra 5%).

Fica patente que as alterações introduzid­as o foram para beneficiar as concession­árias, o que só reforça a preocupaçã­o de que o resultado final venha a favorecê-las mais que aos usuários.

Os passageiro­s terão de realizar 4% a mais de baldeações para alcançar seus destinos. Somente não ocorrerá piora, de seu ponto de vista, se o tempo de viagem de fato cair —algo longe de estar garantido, dado que Doria só construiu 3,3 km de corredores de ônibus, em lugar dos 72 km prometidos.

É louvável o empenho em racionaliz­ar o sistema e cortar seus custos operaciona­is. O subsídio despendido hoje para cobrir a diferença entre despesas e receitas, de R$ 3 bilhões anuais, precisa ser reduzido —mas sem prejudicar um serviço ainda distante do ideal.

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