Banido do futebol pela Fifa, Marco Polo Del Nero mantém influência na CBF
Ao contrário de outros acusados de corrupção, presidente afastado da CBF emplacou subordinado como sucessor
rio de janeiro Ao contrário do que aconteceu com a Fifa e com a Conmebol (entidade que comanda o futebol na América do Sul), o maior escândalo de corrupção da história do futebol não abalou as estruturas vigentes na CBF.
Banido por toda a vida pela Fifa de atividades relacionadas ao futebol nesta sexta (27), o presidente afastado da CBF, Marco Polo Del Nero, conseguiu manter seu grupo político no poder da confederação.
Em abril, quando já estava banido provisoriamente pela entidade que comanda o futebol mundial, o dirigente conseguiu manter sua influência no cenário nacional ao eleger o paulista Rogério Caboclo para comandar a CBF até 2023.
Ele é diretor executivo de gestão da CBF e homem de confiança de Del Nero desde os tempos em que o dirigente comandava a FPF (Federação Paulista de Futebol).
Caboclo não se cansa de elogiar seu criador, mesmo com todas as acusações contra o dirigente, tanto na Fifa quanto no Justiça dos EUA.
O cenário é diferente do encontrado em outras grandes entidades do futebol mundial que tiveram dirigentes afastados por corrupção.
Na Fifa, o suíço Gianni Infantino colocou um ponto final na era Joseph Blatter, que estava no poder há quase duas décadas na entidade.
Ex-secretário geral da Uefa (entidade que controla o futebol na Europa), Infantino tenta dar mais transparência à Fifa, mas ainda é visto com desconfiança por causa de sua proximidade a Michel Platini.
Em 2015, o craque francês e Blatter foram banidos do futebol por oito anos. Platini havia recebido cerca de R$ 8 milhões do ex-presidente da Fifa em uma operação suspeita realizada em 2011 (ano de uma das reeleições de Blatter) por um trabalho supostamente realizado entre 1999 e 2000.
Já na Conmebol, o paraguaio Alejandro Domínguez foi eleito em janeiro de 2016 para comandar a entidade, que concentrou boa parte das acusações de corrupção no futebol feitas pela Justiça dos EUA.
A entidade sul-americana foi comandada por 26 anos por Nicolás Leoz, que cumpre prisão domiciliar desde que o escândalo de corrupção foi revelado, em maio de 2015.
Até o início da década, Leoz, o brasileiro Ricardo Teixeira e o argentino Julio Grondona eram os representantes da América do Sul no Comitê Executivo da Fifa, órgão máximo da entidade —renomeado como Conselho da Fifa.
Antes de assumir a confederação sul-americana, Domínguez denunciou que Leoz realizou depósitos suspeitos em bancos paraguaios.
Na Argentina, o grupo político de Grondona também perdeu poder. Ele morreu logo após a Copa de 2014, dando início a uma disputa política vencida por Claudio Tapia. Ao ser eleito, ele comandava um clube da terceira divisão.
Já na CBF, mesmo fustigado pelas acusações de corrupção e afastado provisoriamente pela Fifa, Del Nero conseguiu manobrar politicamente as federações estaduais e eleger o dirigente de seu interesse à presidência da entidade.
Apenas Corinthians, Flamengo e Atlético-PR deixa- ram de votar em Rogério Caboclo, que, com o apoio maciço das federações estaduais —graças à chancela de Del Nero à sua candidatura—, inviabilizou qualquer oposição.
A posse de Caboclo acontecerá somente em abril do próximo ano. Enquanto isso, a entidade será comandada pelo paraense Antonio Carlos Nunes, o coronel Nunes.
Ao ser denunciado pelo FBI em dezembro de 2015, o cartola paulista escolheu Nunes, então presidente da federação do Pará, para ser seu vice-presidente mais velho e assumir o poder na entidade nacional.
“Enquanto a maior entidade do futebol mundial o afasta de todas as atividades, o Del Nero segue por aqui manipulando a eleição da CBF. Infelizmente, cortou-se a árvore, mas ficaram as sementes”, lamentou o senador Romário (Podemos-RJ), que presidiu a CPI do Futebol, aberta em 2015 e encerrada um ano depois para investigar o envolvimento de brasileiros no escândalo de corrupção do futebol.
Na última quinta (26), o STF (Supremo Tribunal Federal) enviou uma investigação sobre a cúpula da CBF oriunda do relatório paralelo da CPI para a Justiça Federal do Rio.
O inquérito apura suspeitas de crimes contra o sistema Banido do futebol pela Fifa, o dirigente de 77 anos chegou ao comando da CBF em 2015 após 12 anos à frente da Federação Paulista de Futebol
NA CBF
Eleição Del Nero é candidato único na eleição para presidente da CBF em abril de 2014. Ele assume o cargo em abril do ano seguinte
Prisão de Marin Em maio de 2015, vê seu antecessor, José Maria Marin, ser preso na Suíça por receber propina na negociação de direitos de transmissão. O presidente da CBF, que estava com Marin na Europa, volta às pressas para o Brasil e, desde então, não deixa mais o país
Acusado Em dezembro de 2015, Del Nero é indiciado nos EUA sob suspeita de participar do mesmo esquema de Marin. Antes, em depoimento à CPI do Futebol no Senado, disse que era inocente. Ele se licencia do cargo para se concentrar em sua defesa, mas reassume a posição em abril de 2016
Novo afastamento Fifa decide banir Del Nero do futebol provisoriamente por 90 dias em dezembro de 2017
Sucessor Nos bastidores, age para que Rogério Caboclo, seu escolhido, seja eleito o novo presidente da CBF. Em abril de 2018, dirigente vence eleição na confederação como candidato único financeiro, sonegação fiscal, lavagem de dinheiro, formação de quadrilha, estelionato e falsidade ideológica, entre outros, supostamente cometidos por Del Nero e os ex-presidentes da CBF Ricardo Teixeira e José Maria Marin. Os advogados de Del Nero criticaram a decisão da Fifa desta sexta e disseram que vão recorrer à Corte Arbitral do Esporte (CAS) para tentar retirar a punição ao dirigente.
“É com surpresa e indignação que o senhor Marco Polo Del Nero e seus advogados recebem a decisão proferida hoje [sexta] pela Fifa”, afirmou o escritório Bichara e Motta Advogados, responsável pela defesa do cartola, em nota.
O primeiro recurso será enviado à Câmara de Arbitragem da Fifa, que dificilmente mudará sua decisão de banir o dirigente brasileiro por toda a vida de qualquer atividade relacionada ao futebol.
Segundo o comunicado divulgado pela entidade que comanda o futebol mundial nesta sexta-feira, a Câmara de Arbitragem do Comitê de Ética considerou o dirigente brasileiro culpado de suborno, corrupção, oferecer e aceitar presentes e outros benefícios e conflito de interesse.
Os defensores de Del Nero, porém, afirmam em sua nota que “a Câmara de Investigação da entidade não foi capaz de produzir qualquer prova de envolvimento [do dirigente] em esquemas de corrupção”.
É a primeira vez que um presidente da CBF é punido com a pena máxima da Fifa.
Além do banimento, o cartola foi condenado a pagar multa de 1 milhão de francos suíços (cerca de R$ 3,5 milhões) para a entidade.
Após esgotar as opções de recurso na federação, os advogados de Del Nero prometem entrar com um pedido de anulação da condenação na CAS.
Com sede na Suíça, o tribunal internacional regula disputas entre partes que não estejam no mesmo país, como comitês olímpicos, federações esportivas, clubes e atletas.
A corte é um órgão independente das entidades de administração do esporte e é considerada a última instância dentro da Justiça desportiva.
“A defesa recorrerá e tem a convicção de que a punição de primeira instância será reformada mediante análise por tribunal independente e não sujeito a interferências externas”, acrescentam os advogados do dirigente.
Apesar do discursos dos defensores de Del Nero, as chances do cartola brasileiro reverter a punição são mínimas.
Del Nero já havia sido afastado pela Fifa em dezembro do ano passado, logo após a condenação do seu antecessor, José Maria Marin, na Justiça dos EUA, também acusado de corrupção.
Ambos os dirigentes, assim como o também ex-presidente da CBF Ricardo Teixeira, foram denunciados por supostamente terem participado de um esquema de recebimento de propina ao lado de outros cartolas da América do Sul na venda de direitos de torneios no Brasil e no exterior.
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