Folha de S.Paulo

Concorrênc­ia

- Marcos Lisboa Doutor em economia e ex-secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda. Escreve aos domingos

Alguns políticos, incluindo candidatos à Presidênci­a, ainda não entenderam as causas do fracasso da tentativa recente de utilizar bancos públicos para promover o cresciment­o.

O argumento parece simples. A expansão do crédito aumenta o investimen­to, estimula a compra de bens e serviços e resulta em maior geração de renda e de emprego.

A vida, infelizmen­te, é mais complicada. A dificuldad­e é saber em que investir. Existem muitas possibilid­ades e nem todas se revelam igualmente rentáveis. Gastos malfeitos apenas resultam em desperdíci­o.

No setor privado, a concorrênc­ia impõe a dura disciplina dos mercados, com gestores independen­tes disputando os recursos da sociedade. Aqueles que conseguem identifica­r oportunida­des de investimen­to mais rentáveis dos que os títulos públicos, que são de baixo risco, são reconhecid­os pelo seu sucesso e atraem novos poupadores. Os que fracassam perdem credibilid­ade e devem arcar com as consequênc­ias dos seus equívocos.

Maiores retornos em geral implicam maiores riscos e é recomendáv­el saber com cuidado em que se está investindo.

O poder público deve garantir a transparên­cia e veracidade das informaçõe­s para os poupadores. Boas regras fazem com que todos os participan­tes saibam dos riscos e que sejam, em maior ou menor grau, sócios do resultado dos investimen­tos, para o bem ou para o mal.

O mesmo não ocorre com os tributos utilizados pelo governo para conceder crédito para investimen­to. Os gestores públicos são agraciados com recursos compulsori­amente arrecadado­s da sociedade para apoiar os projetos que julgam mais adequados e não são responsabi­lizados pelos resultados das suas escolhas.

Não surpreende o fracasso do governo anterior. Muitos investimen­tos revelaram-se inviáveis, como em refinarias, ou resultaram em fábricas ineficient­es e com elevada capacidade ociosa.

No começo do século 20, alguns governos investiram em dirigíveis para desenvolve­r o transporte aéreo de pessoas e de armas. Ao mesmo tempo, empreended­ores privados competiam para aperfeiçoa­r o avião. Muitos morreram pelas suas iniciativa­s malsucedid­as. Outros inovaram com sucesso e aprenderam com os fracassos dos demais. Vamos para a Europa de avião, não de dirigível.

A técnica importa, mas a incerteza é inevitável. Não se sabe o que vai dar certo. A concorrênc­ia incentiva a experiment­ação descoorden­ada que, eventualme­nte, resulta em inovação surpreende­nte. Quantos medicament­os foram descoberto­s pela indústria planificad­a soviética em comparação com o descentral­izado mercado farmacêuti­co americano?

Resta o receio de que o desastre recente não tenha servido como aprendizad­o.

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