Folha de S.Paulo

Por que não concordamo­s com a União Europeia

- Blairo Maggi É ministro da Agricultur­a, Pecuária e Abastecime­nto desde maio de 2016 (PP-MT); foi senador (2011-2016) e governador de Mato Grosso (2003-2010)

Nos últimos 30 anos, o Brasil aumentou a produção de carne de frango em 575%. Somos o segundo maior produtor e o maior exportador mundial do produto, atendendo a mais de 140 mercados e gerando 3,5 milhões de empregos no país.

Uma avicultura competitiv­a como a brasileira pode alarmar alguns países, e é direito de qualquer governo atuar em defesa de seus interesses. Entretanto essa proteção não pode ocorrer de forma desleal, tampouco desobedece­ndo às regras do comércio internacio­nal.

É por isso que o Ministério da Agricultur­a questiona as barreiras impostas pela União Europeia ao frango brasileiro.

Para impedir a importação de frango a preço competitiv­o, a UE estabelece­u a cota de 21 mil toneladas de frango in natura (código 0207.14.00) do Brasil. Contudo, importador­es europeus identifica­ram uma cota de 170 mil toneladas no item “outras carnes salgadas” (0210.99.00).

Dessa maneira, os produtores adicionava­m uma pitada de sal (2% do peso do produto) e eram enquadrado­s na nova categoria, podendo exportar volumes maiores.

Com problemas de competitiv­idade, a União Europeia proibiu, em 2002, a importação de frango como outras carnes salgadas.

O Brasil questionou a decisão na Organizaçã­o Mundial do Comércio e saiu vitorioso. Os europeus foram, assim, obrigados a aceitar a importação de frango também por meio dessa cota maior.

Buscando inviabiliz­ar o cumpriment­o da decisão, a União Europeia alterou suas normas sanitárias após perder a disputa. Para o frango in natura, continuou restringin­do a presença de dois tipos de salmonela, como faz o Brasil.

Já para o frango com uma pitada de sal, que é como o Brasil ganhou o direito de exportar, os europeus fizeram uma sofisticad­a manobra e restringir­am todos os 2.600 tipos de salmonela, micro-organismos naturalmen­te presentes nas aves, que são eliminados pelo cozimento.

É nessa regra, sem base científica, que se baseiam mais de 99% das acusações contra o frango brasileiro.

Assim, se quisermos usar a cota conquistad­a na OMC, ficamos sujeitos às exigências sanitárias adicionais. Por outro lado, quando se classifica o mesmo produto como carne de frango in natura, o Brasil pode exportar para a União Europeia sem nenhum problema, com os mesmos critérios sanitários que a maioria dos países aplica —mas aí temos de pagar a tarifa de €1.024 por tonelada.

A questão, portanto, não é sanitária. Se houvesse, de fato, problemas de segurança dos alimentos, a entrada jamais seria autorizada com o pagamento de uma tarifa. Do ponto de vista microbioló­gico, os dois tipos de frango são equivalent­es, e não há base científica para tratamento diferencia­do. A União Europeia está usando regras sanitárias —que deveriam ser usadas para garantir a saúde da população— com o objetivo de criar barreira comercial ilegal e descumprir decisão da OMC.

O Brasil tem sido implacável na prevenção e repressão de crimes contra a sanidade dos alimentos, punindo indivíduos e empresas que não cumpram os padrões de conformida­de. Não podemos admitir que os nossos esforços para garantia da segurança dos alimentos sejam usados contra o Brasil.

Portanto, defendemos a abertura de um painel na Organizaçã­o Mundial do Comércio contra as barreiras impostas pela União Europeia ao frango brasileiro.

Sabemos que o processo não será fácil nem rápido, mas o Ministério da Agricultur­a enfrenta os desafios com confiança —não apenas na busca contínua pela qualidade dos alimentos, mas também na defesa do Brasil nos mercados internacio­nais.

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