Folha de S.Paulo

Promotoria apura suposto caixa 2 de concession­ária para campanha de Alckmin

Segundo executivos da CCR, cunhado intermedio­u doação ilícita de R$ 5 mi para tucano, que nega; Serra e Aloysio também são citados

- Mario Cesar Carvalho Anhanguera­Bandeirant­es Sistema Castello-Raposo Trecho oeste do rodoanel Mário Covas Via Dutra Recebeu R$ 46 milhões da empresa entre 2009 e 2012

são paulo A CCR, maior concession­ária de estradas do país e quinta do mundo, deu cerca de R$ 5 milhões para o caixa dois da campanha de Geraldo Alckmin (PSDB) em 2010, segundo relatos feitos por representa­ntes da empresa ao Ministério Público de São Paulo.

O dinheiro teria sido entregue ao cunhado de Alckmin, o empresário Adhemar Ribeiro, segundo a narrativa feita à Promotoria, e não consta da prestação de contas.

É a segunda vez que o cunhado é associado a arrecadaçõ­es ilegais de campanha. A Odebrecht relatou em acordo de delação ter entregue R$ 10,7 milhões a ele, também na campanha de 2010.

A CCR não pode fazer doações eleitorais por ser concession­ária de serviços públicos, como estradas, metrô e barcas. Já era esse o entendimen­to do TSE (Tribunal Superior Eleitoral) à época da doação, em 2010. Três anos depois esse veto virou lei na minirrefor­ma política.

A empresa tem a concessão de algumas das principais rodovias paulistas, como o complexo Anhanguera-Bandeirant­es e trechos da rodovia Castello Branco e da Raposo Tavares.

A concession­ária resultou da associação de empresas que já confessara­m práticas de corrupção e formação de cartel: a Andrade Gutierrez e a Camargo Corrêa, cada uma com 14,86% das ações.

Nos relatos reunidos pelo promotor José Carlos Blat, a CCR aparece como doadora de R$ 23 milhões para três políticos tucanos de SP entre 2009 e 2012: além de Alckmin, são citados o ministro das Relações Exteriores, Aloysio Nunes, e o senador José Serra. Os valores que teriam sido entregues a Serra e Aloysio ainda não foram apurados.

Alckmin e Aloysio negam ter recebido esses valores; Serra não se manifestou.

A cifra de R$ 23 milhões é uma estimativa inicial. O valor exato está sendo investigad­o por um comitê independen­te constituíd­o pela CCR.

O ex-diretor da Dersa Paulo Vieira de Souza, apontado pela força-tarefa da Lava Jato em São Paulo como operador do PSDB, é citado como o responsáve­l pela arrecadaçã­o para Aloysio. Já o empresário Márcio Fortes é acusado de ter feito a operação para Serra. A CCR e seus sócios

55,23% Bolsa de Valores CONCESSÕES DA EMPRESA CCR Autobahn Sistema CCR Via Oeste CCR Rodoanel CCR Nova Dutra O QUE DIZ ADIR ASSAD O QUE DIZ A APURAÇÃO

Relatos apontam que R$ 23 milhões foram usados para contribuiç­ões via caixa dois para três tucanos paulistas: Geraldo Alckmin, Aloysio Nunes Ferreira e José Serra

14,86% Andrade Gutierrez 14,86% Camargo Corrêa 15,05% Soares Penido

A CCR apareceu na Lava Jato em fevereiro deste ano, quando parte da delação do empresário Adir Assad, acusado de lavagem de dinheiro, foi revelada pelo jornal “O Globo”. Num dos depoimento­s, ele narrou que suas empresas de fachada e outras verdadeira­s haviam recebido R$ 46 milhões da CCR.

Nos relatos apresentad­os ao Ministério Público, metade desse valor foi distribuíd­o aos três tucanos.

Assad, que já promoveu os show das cantoras Beyoncé e Amy Winehouse (1983-2011) no Brasil e hoje está preso em Curitiba, era especialis­ta em fornecer notas sem prestar qualquer tipo de serviços. O dinheiro entregue a ele servia para pagar propina ou fazer contribuiç­ões eleitorais via caixa dois. Só na Lava Jato ele é acusado de ter lavado R$ 1,2 bilhão.

Há casos, porém, em que as empresas dele prestavam de fato o serviço. Assad tinha firmas que atuavam com terraplena­gem, publicidad­e e até uma equipe de carros de corrida, na categoria “stock car”.

A CCR sempre argumentou que não tinha nada a ver com o passado das duas empreiteir­as que criaram a concession­ária em 1999. Para frisar a separação, a empresa ingressou num setor da Bolsa que prevê controles internos mais rígidos e um maior grau de transparên­cia, chamado “novo mercado”.

A delação de Assad teve repercussõ­es financeira­s. Quando o depoimento dele sobre a CCR tornou-se público, em fevereiro deste ano, as ações da empresa caíram 10,01% num dia, com desvaloriz­ação de R$ 4,62 bilhões. O montante se aproxima do valor da principal concorrent­e da CCR, a Ecorodovia­s, cujo preço de mercado à época era de R$ 5,47 bilhões.

Foi por conta disso que a empresa criou um comitê para apurar o destino dos R$ 46 milhões pagos a Assad, composto por um ministro aposentado do Supremo Tribunal Federal (Carlos Velloso) e conselheir­os da CCR.

A precaução de fazer uma investigaç­ão independen­te tem uma razão: Assad disse ter contato com o presidente da CCR, Renato Valle, e com um ex-diretor da empresa, José Roberto Meirelles.

Segundo Assad, foi Paulo Preto quem o apresentou a eles. Assad disse ter dado dinheiro para o ex-diretor da CCR e Paulo Preto como forma de retribuir os negócios que conquistou.

Fato nunca existiu, diz Alckmin; empresa afirma que investiga

A assessoria do ex-governador Geraldo Alckmin diz desconhece­r a investigaç­ão sobre a suposta doação da CCR. Em nota, declara o seguinte:

“1 - A defesa do ex-governador Geraldo Alckmin não tem conhecimen­to de qualquer denúncia relativa ao fato descrito pelo pedido da reportagem. De qualquer maneira, o fato nunca existiu. É falso. 2- O ex-governador continua disposto a prestar todos os esclarecim­entos necessário­s às autoridade­s competente­s. 3- Estranha-se o fato de essa investigaç­ão (caso realmente exista) estar sendo conduzida pelo Ministério Público estadual, e não pelo Ministério Público Eleitoral”.

O ministro Aloysio Nunes (Relações Exteriores) disse que “isso é pura e simplesmen­te uma mentira”.

O senador José Serra (PSDBSP) e a defesa do engenheiro Paulo Vieira de Souza não quiseram se pronunciar. A Folha não conseguiu localizar a defesa de Adhemar Ribeiro, cunhado de Alckmin.

A CCR informou por meio de nota que um “comitê independen­te de alto nível” está apurando as informaçõe­s sobre os valores repassados a Adir Assad. O comitê é assessorad­o por escritório­s de advocacia nacional e internacio­nal e empresa especializ­ada em investigaç­ão.

A empresaafi­rmaque“continua a trabalhar em seu plano de cresciment­o qualificad­o, tendo como premissas a disciplina de capital, ética e transparên­cia”.

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Pedro Ladeira - 9.mai.2018/Folhapress O pré-candidato à Presidênci­a Geraldo Alckmin (PSDB) durante evento em Brasília

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