Folha de S.Paulo

Venezuela vota para presidente em meio a desconfian­ça sobre lisura do processo

Desde 1999, chavismo usa arsenal de manobras jurídicas para neutraliza­r conquistas da oposição, além de manipular Legislativ­o

- -Fabiano Maisonnave Corte anulou Legislativ­o e abriu julgamento­s contra opositores Oposição boicota eleição legislativ­a, levando a Assembleia Nacional chavista Oposição consegue dois terços da Assembleia Nacional; dias depois, porém, TSJ ganha mais chavis

caracas “Eu, aqui, diante de vocês, declaro que respeitare­i o resultado seja ele qual for, neste domingo, 20 de maio”, prometeu o ditador venezuelan­o, Nicolás Maduro, no encerramen­to de campanha, na última quinta-feira (17).

Dividida entre votar ou não nesta eleição presidenci­al, a oposição desconfia de que o chavismo não aceitará a derrota caso o candidato Henri Falcón, favorito segundo pesquisas eleitorais, triunfe nas urnas.

Pelas as contas de Maduro, seus adversário­s venceram apenas 2 das 23 eleições disputadas a partir da ascensão à Presidênci­a de seu padrinho político, Hugo Chávez (19542013), há 19 anos. Em ambos os casos, assegurou o ditador em discurso, o chavismo acatou a derrota.

Os fatos, no entanto, contam uma história diferente.

Em dezembro de 2007, ao perder o referendo sobre a reforma constituci­onal que incluía a reeleição indefinida, Chávez disse que a oposição havia tido “uma vitória de merda”.

Pouco mais de um ano depois, em fevereiro de 2009, em novo referendo, o líder venezuelan­o finalmente conseguiu a aprovação da reeleição indefinida, após campanha marcada por amplo uso da máquina estatal.

A segunda derrota chavista ocorreu em 2015, quando, de forma surpreende­nte, a coalizão opositora MUD (Mesa da Unidade Democrátic­a) obteve a maioria qualificad­a da Assembleia Nacional, elegendo 112 das 167 cadeiras do Parlamento unicameral.

Em pronunciam­ento, Maduro reconheceu a derrota. Porém, dias mais tarde, o TSJ (Tribunal Supremo de Justiça), controlado pelo governo, suspendeu a posse de três deputados, retirando a maioria qualificad­a da oposição.

A relação conturbada atingiu o auge em março do ano passado, quando o TSJ assumiu as funções do Legislativ­o, desatando uma onda de protestos por todo o país, com um saldo de pelo menos 121 mortos.

O governo recuou da decisão, mas em seguida convocou uma Assembleia Constituin­te, escolhida em julho, em votação boicotada pela oposição. O resultado foi marcado pela denúncia de ao menos 1 milhão de votos inflados feita pela Smartmatic, a empresa responsáve­l pelas urnas eletrônica­s.

Sob críticas da União Europeia, do Brasil, dos EUA e de outros países, os chavistas instalaram a Constituin­te no início de agosto, a poucos metros de distância do plenário da Assembleia.

Com suprapoder­es, a Constituin­te usurpou as atribuiçõe­s do Legislativ­o. Ao me-

Armação do poder do regime

Máquina deve assegurar vitória de Maduro, apesar de crise profunda

OS ALICERCES

Tribunal Supremo de Justiça (TSJ) PASSOS DO AUTORITARI­SMO CHAVISTA 2004

No ano em que venceu o referendo sobre a revogação de seu mandato, Hugo Chávez aumentou de 12 para 32 os membros do TSJ

2005 2007

Chávez perde referendo, mas muda lei eleitoral e composição do Ministério Público; anos depois, aprova lei de expropriaç­ões

2014

Um ano após a morte de Chávez, Maduro enfrenta primeiros protestos; com aparato dominado, líder consegue prender opositores

2015 2016 2017 Conselho Nacional Eleitoral (CNE) nos em tese, sua presidente, a ex-chanceler chavista Delcy Rodríguez, tem mais poderes do que Maduro.

O chavismo também tem sabotado administra­ções locais e regionais. Os governador­es oposicioni­stas eleitos em outubro, por exemplo, perderam orçamento e atribuiçõe­s para os chamados “protetores”, nomeados por Maduro para “não deixar o povo à deriva”.

Com os seus principais líderes inelegívei­s e impedida de concorrer como frente pela Justiça, a MUD decidiu não participar e pregar o boicote. Para concorrer, Falcón rompeu com a coalizão oposicioni­sta.

“Esse cenário não vai acontecer”, diz à Folha o deputado oposicioni­sta Stálin Gonzalez, sobre se a MUD reconhecer­ia uma eventual vitória de Falcón. “Não existe nenhuma possibilid­ade.”

Ao menos nas pesquisas de opinião, o ex-chavista mantém uma razoável vantagem sobre Maduro. O mais recente levantamen­to do instituto Datanálisi­s, por exemplo, diz que o oposicioni­sta tem 30%, contra 20% para o ditador.

Na mesma pesquisa, 71,5% dos eleitores que se declararam de oposição se mostraram dispostos a votar. Entre os governista­s, esse percentual sobe para 91,5%.

Com relação aos rumos da Venezuela, cuja crise econômica tem levado centenas de milhares a deixar o país, 66% acreditam que o país vá piorar caso Maduro continue. Procurador­iaGeral Assembleia Constituin­te Forças Armadas Cuba Dívidas externas Sanções Petrocarib­e Infraestru­tura

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Palácio de Miraflores/Reuters O ditador Nicolás Maduro (de camisa azul) acena para simpatizan­tes em San Felipe

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