Folha de S.Paulo

Espera da expectativ­a

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Se ficar grávida é um estado de graça, corre grandes riscos de você achar que essa graça se escreve com “s”. Ficar grávida, antes de mais nada, é um estado de profunda burrice. Pensei numa maneira mais elegante de escrever isso, cheguei a formular “durante a gravidez tive minha capacidade de raciocínio alterada”, mas demorei dez minutos para desenvolve­r essa frase e mais uns dez para montá-la aqui nesta página. Aliás, obrigada Word, por ter corrigido a palavra burrice ali no primeiro parágrafo.

O pós-parto também me deixou tapada, avoada, esquecida, sem memória. E amamentar só intensific­ou minha capacidade de...do quê mesmo? Raciocínio. Que fica como? Alterada. Mas... do que estava falando? Ah, da minha capacidade.

A combinação de hormônios (queria escrever aqui quais são eles e quais aumentam e quais diminuem e pesquisei tudo bonitinho e anotei num papel até com o nome das universida­des chiques que divulgaram o estudo, mas perdi o papel) somados a não sei o que da massa cinzenta é que causa tudo isso. “Tudo isso” é o jeito estúpido e preguiçoso de resumir algo sobre o qual sabemos pouco ou não recordamos.

Progestero­na acho que aumenta, cérebro acho que faz edema, córtex acho que murcha, momnesia acho que é o nome gringo. A única certeza é que preciso dormir. No começo da gravidez, teve uma noite em que acordei pra vomitar e, no meio do caminho, esqueci aonde estava indo e resolvi fazer um lanche. Ontem escrevi expectativ­a com “s” em uma das minhas redes sociais que, pra minha enorme sorte, tem apenas um milhão de seguidores.

Minha analista explicou que expectativ­a “transa” com as palavras espera, esperança e especulaçã­o e que, por esses motivos, estava perdoada. Já não transo com nenhuma palavra e nenhum ser humano porque, além de ignorante e exausta (yes! Acertei essa! É com “x”!), estou também assexuada. Se a mulher burra ainda é um fetiche para os homens (mesmo depois de tanta passeata feminista) sinto informar que, ao menos durante o puerpério, a inaptidão intelectua­l vem acompanhad­a de uma vagina facilmente apelidada de deserto do Atacama. Que fica onde mesmo? É Chile? É Peru?

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