Folha de S.Paulo

Endereço influencia a formação do preço final

Localizaçã­o pode aumentar muito os custos, mas também determinar o sucesso de um empreendim­ento

- -Cristine Gentil -Simone Tinti

brasília Antes de inaugurar seu primeiro restaurant­e em Brasília, nos anos 1980, a empresária Cristina Roberto Antunes consultou um astrólogo. Ele disse: “Abra à noite”.

Ela resistiu, o cardápio havia sido planejado para o almoço. Masseguiuo­conselhoei­mprovisou o menu com uma receita de panqueca. A iguaria ganhou fama, o Bom Demais virou referência em um dos lugares mais improvávei­s para um restaurant­e, o Setor de Oficinas da Asa Norte —onde viria a estrear Cássia Eller.

Deláparacá,Cristina,63,não parou. Meio sem querer, venceu uma concorrênc­ia para assumir o restaurant­e do CCBB (Centro Cultural Banco do Brasil). Na época, ela tinha um bufê, muitas vezes contratado pelo centro para eventos.

“Mas não era interessan­te do ponto de vista financeiro.” Isso foi em 2007. O CCBB ainda não tinha tanto movimento. Ainda assim, ela vendeu o bufê para se dedicar ao novo empreendim­ento, o Bistrô Bom Demais. Cinco anos depois, repetiu a dose em um espaço no Jardim Botânico de Brasília.

Ambos são contratos de concessão com pagamento de aluguel, condomínio e outras taxas, tempo determinad­o e regras a cumprir. Ela diz que hoje faria opções diferentes.

É um modelo desafiador de negócio. É impossível repassar para o preço dos produtos todos os custos. Há um alto investimen­to em reformas e equipament­os, que ultrapassa­ram R$ 200 mil em seu caso, além de problemas de sazonalida­de, como as chuvas no Jardim Botânico ou uma entressafr­a de exposições no CCBB.

“Hoje, o que falta em um espaço, compenso no outro.”

Para o diretor da Lucre Consultori­a, Roberto Assef, esse tipo de ponto comercial pode ser belo cartão de visita.

“É mais vantajoso para redes e para empresas com um nível razoável de capitaliza­ção porque os custos operaciona­is são muito grandes. Isso interfere no preço”, diz.

Há desafios também na escolha entre pontos em shopping ou no comércio de rua. Uma saída é praticar preços diferentes em cada local.

Foi a estratégia do empresário Victor Parucker, 31. Em 2012, ele levou de São Paulo para Brasília a Endossa, que aluga espaço para produtores locais e independen­tes venderem seus produtos.

Hoje, Parucker tem três unidades: duas no Plano Piloto e uma no shopping Casa Park. Um tipo de nicho que custa R$ 280 para alugar nas lojas de rua sai por R$ 340 no centro comercial.

“Além do metro quadrado ser mais caro, há os encargos condominia­is, taxa de propaganda e outras. Mas quem aluga o espaço entende a diferença. O shopping oferece vantagens como horário ampliado, estacionam­ento e segurança”, diz o empresário.

Já os consumidor­es finais podem não ser tão receptivos à diferença de preços em produtos semelhante­s, diz o professor de gestão estratégic­a de preços do MBA do IBMEC, Alberto Zicker.

Segundo ele, na hora de escolher o ponto, o empreended­or deve levar em conta o perfil da marca, a localizaçã­o, a conveniênc­ia e o status.

Marcos Hirai, sócio-diretor da GS&BGH, especialis­ta em pontos comerciais, diz que as empresas tendem a mexer no portfólio de mercadoria­s para evitar oscilação de preços em diferentes pontos. “No caso das grandes franquias, o lojista absorve a diferença de custo para não mexer no preço final, ou inclui produtos com maior margem de lucro para compensá-la”.

Parucker achou a solução ao aproveitar uma caracterís­tica do seu ponto comercial. Na Asa Sul, as construçõe­s têm três andares. No caso da Endossa, só era interessan­te usar o térreo. Ele aproveitou os outros andares para instalar o coworking CoPiloto.

“Foi um casamento com diversas vantagens econômicas. Além do aluguel, dividimos custos com segurança e limpeza. Além disso, as pessoas que frequentam o coworking acabam passando pela Endossa. E vice-versa.” são paulo Com expectativ­a de faturar R$ 782 milhões neste ano e crescer 8% em relação a 2017, os clubes de assinatura se equilibram entre a oferta de produtos de origem controlada e a cobrança de uma mensalidad­e amigável, capaz de cativar a clientela e dar escala ao negócio.

Para quem deseja se aventurar nesse nicho, o primeiro passo é entender o que motiva o assinante a pagar R$ 40 ou R$ 60 mensais para receber um pacote de café especial ou um queijo mineiro.

“O clube de assinatura é um grupo em que me conecto com interesses específico­s e passo a ter acesso a algo exclusivo que não é ofertado livremente no mercado. O que se valoriza são as experiênci­as, ter uma história para contar”, diz José Sarkis Arakelian, professor de Administra­ção da FAAP (Fundação Armando Álvares Penteado).

Esse diferencia­l de exclusivid­ade é o que faz o casal Jeferson Jess, 34, e Andréa Sígolo, 36, sair uma vez por mês de Curitiba (PR) em uma Kombi para percorrer o interior do país desde fevereiro de 2017.

Na bagagem, levam queijos, embutidos, doces, geleias, ervas e cereais, tudo feito artesanalm­ente por pequenos produtores. Os itens depois serão entregues em uma embalagem caprichada aos sócios da Caixa Colonial, seu clube de produtos regionais.

Para definir o valor da assinatura, os dois considerar­am embalagem, logística, papelaria e o tempo investido para a curadoria dos produtos.

Nessa equação, o lucro nem sempre é garantido. “Se visitarmos uma região e nos depararmos com um queijo especial, sacrificam­os um pouco nossa margem, que é de 25% a 30%, para ter o produto”, conta Jeferson.

Hoje o negócio está no azul, mas o faturament­o mensal, de R$ 20 mil ainda não deixa sobras para novos investimen­tos.

O professor Arakelian explica que, para ter sucesso, um clube de assinatura deve considerar a escala, que possibilit­a que o trabalho de curadoria seja diluído nos pacotes e que os produtos sejam adquiridos por grandes lotes.

“Nesse caso, os valores podem ser até menores do que os cobrados no varejo. Mas é comum que, até alguma escala ser atingida, o modelo funcione com déficit.”

A Naplee Chás Artesanais, serviço de assinatura de chás, tem clientes fiéis desde a sua inauguraçã­o, em 2016.

Natália Manchon, 32, idealizado­ra do negócio, atribui a fidelidade dos associados à apresentaç­ão frequente de novidades nas caixas e ao contato próximo com cada um deles.

“O trabalho de pesquisa, de seleção, de combinação dos conjuntos e sua consistênc­ia, mês a mês, sem a queda do nível, é que traz a saúde para os clubes de assinatura”, afirma Arakelian.

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Karime Xavier/Folhapress A empresária Natalia Manchon, monta os kits do Naplee Tea, seu clube de assinatura de chás
 ?? Pedro Ladeira/Folhapress ?? Cristina Roberto em seu bistrô em Brasília
Pedro Ladeira/Folhapress Cristina Roberto em seu bistrô em Brasília

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