Folha de S.Paulo

Maduro venceu a eleição?

- Hélio Schwartsma­n

são paulo Nicolás Maduro conquistou seu segundo mandato? Ele diz quesim,com54%dosvotos.Masboa parte dos venezuelan­os e do mundo contesta.

Sob a administra­ção do chavista, o PIBvenezue­lanoexperi­mentouuma contração de 32%, e a inflação deste ano deve bater em 12.000%. Serviços essenciais entraram em colapso. Há desabastec­imento, regressão epidemioló­gica e fome. A violência está fora de controle. Legiões de venezuelan­os estão fugindo do país.

Seria inédito ver triunfar nas urnas um dirigente que produziu tamanha ruína econômica e social. É mais do que verossímil, portanto, que o processo eleitoral tenha sido fraudado. Mas por que Maduro, que já há algum tempo é mais bem descrito como ditador do que como líder legítimo, se deu ao trabalho de fazer toda essa encenação eleitoral?

Acho que estamos aqui diante de um fraco da espécie, que é nosso gosto por realidades imaginária­s. Quem desenvolve bem o conceito é o historiado­r israelense Yuval Ha- rari. Para ele, uma das maiores maravilhas da linguagem é sua capacidade de criar coisas que só existem nas nossas cabeças, mas que, como todos creem nelas, se tornam reais.

O exemplo mais concreto é o do dinheiro. Mais de 90% da moeda em circulação não passa de registros contábeis digitais. Nessa mesma categoria entram direitos humanos, pessoas jurídicas, religiões, a ideia de nação etc.

O poder dessas ficções intersubje­tivas de motivar pessoas e determinar-lhes as vidas é enorme, mas não ilimitado. A esquerda erra imaginando que elas podem tudo, inclusive gerar economias onde quanto mais se gasta mais se ganha e produzir vitórias eleitorais impossívei­s.

A direita se equivoca ao menospreza­r sua força, que, a seu ver, jamais poderia contrapor-se a uma natureza humana imutável. Ora, se instituiçõ­es nunca mudassem pessoas, os temíveis vikings jamais teriam virado os politicame­nte corretos escandinav­os.

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