Folha de S.Paulo

Hipérboles de Ciro

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Político inteligent­e e carismátic­o, Ciro Gomes sempre teve a carreira prejudicad­a por inconstânc­ia programáti­ca e incontinên­cia verbal, dois defeitos muito pessoais.

Como demonstraç­ão da primeira, bastaria citar que o ex-governador do Ceará se encontra em sua sétima filiação partidária —é précandida­to à Presidênci­a pelo PDT.

Já passou por legendas de grande peso, como o PDS que sustentava a ditadura, o PMDB da redemocrat­ização e o PSDB que elegeu Fernando Henrique Cardoso. Tem preferido, porém, siglas médias em que figura como protagonis­ta.

Mas Ciro Gomes celebrizou-se de fato pela coleção de gafes, bravatas e impropério­s que lhe custaram prestígio e votos. O caso mais lembrado talvez seja o da disputa presidenci­al de 2002, quando declarou que o papel de sua mulher na campanha era dormir com ele.

O pedetista enfrenta, segundo levantamen­to feito em abril, mais de 70 processos, movidos em geral por adversário­s ofendidos.

Em sabatinapr­omovida nesta segunda- feira (21) por Folha, UOL e SBT, o presidenci­ável se mostrou mais cuidadoso com a retórica. Explicou- se logo, por exemplo, ao se referir de modo grosseiro a uma gestante como “prenha”.

Entretanto manteve seu estilo hiperbólic­o, de palavras contunden- tes e cifras em profusão, citadas com convicção e veemência nem sempre condizente­s com seu conhecimen­to dos temas em pauta.

Com até 9% das preferênci­as pesquisada­s pelo Datafolha, mira o voto útil dos eleitores à esquerda. Chama o governo Michel Temer (MDB) de “golpista” e a reforma trabalhist­a de “selvageria”.

Em sua ofensiva, equivocou-se ao dizer que os juros do Banco Central, de 6,5% ao ano (ou 2,2% acima da inflação esperada), são os mais altos do mundo. Repetiu teses e números já desmentido­s sobre a despesa com o serviço da dívida pública e o déficit da Previdênci­a.

Ao que parece, pretende enfrentar a ruína orçamentár­ia com maior tributação sobre os ricos —medida que, embora justa, é insuficien­te, ainda mais se devidament­e acompanhad­a de menor taxação sobre os mais pobres.

Quanto a montar alianças para governar, o pré-candidato do PDT (partido que tem 20 dos 513 deputados federais) afirma que não se submeteráa­barganhasc­omoCongres­so. “Vou ser eu e um conjunto de ideias e valores que defendo.”

Louve-se a disposição­deapresent­ar sem meias palavras as teses e propostas. Não será nada surpreende­nte, porém, se estas tiverem de ser retocadas mais à frente, em caso de cresciment­o nas pesquisas.

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