Afundada em dívida, Santa Casa lança projeto para ‘adoção’ de kits cirúrgicos
Piloto começa nesta semana com 60 operações ginecológicas bancadas por grupo de taiwaneses
são paulo Sem dinheiro para pagar por insumos de cirurgias, como agulhas, fios de sutura, órteses e luvas, a Santa Casa de São Paulo resolveu lançar um projeto em que pessoas físicas e jurídicas vão poder doar kits cirúrgicos para atender pacientes que estão em filas no aguardo de procedimentos sem urgência e de diferentes complexidades.
Em uma iniciativa piloto, cerca de 20 taiwaneses bancaram kits para 60 cirurgias ginecológicas, investindo R$ 65 mil. As cirurgias começam nesta semana, e o grupo acompanhoudacompraatéa entrega dos insumos.
Atualmente, a Santa Casa administra uma dívida de cerca de R$ 700 milhões e paga umempréstimodeR$360milhões com a Caixa Econômica Federal, tendo déficit mensal de R$ 14 milhões. É a pior crise financeira já enfrentada pelo complexo hospitalar, que é filantrópico e privado.
A instituição já desligou nos últimos anos quase 30% de seus funcionários, deixou de administrar unidades de atendimento, vendeu imóveis, cortou custos, modernizou processos, mas, mesmo assim, continua em situação delicada em suas finanças.
Embora quase a totalidade de seus atendimentos seja em decorrência de convênios com o SUS e com o governo de São Paulo, a Santa Casa entende que oferecer os kits de cirurgias não transgride nenhum princípio legal e levanta sua missão filantrópica para defender o projeto.
“Temos a estrutura, temos os profissionais, mas enfrentamos dificuldades de estar em dia com os pagamentos a fornecedores, que atuam no limite para nos atender, mas que também têm seus compromissos com fabricantes. A saída que encontramos para enfrentar isso foi o projeto de parcerias para as cirurgias”, diz Paulo Motta, da direção da Santa Casa.
Quem adotar o kit não poderá escolher o paciente que será operado pela instituição nem terá ingerência nenhuma no procedimento, como escolher a data.
As cirurgias vão respeitar as filas e a urgência dos casos. No departamento de ginecologia, a espera vai de três meses, para procedimentos mais simples, a cinco anos, para casos de maior complexidade.
“É uma frustração enorme para um médico, sobretudo para os mais jovens, não poder realizar uma cirurgia por faltadeinsumos.Éumamistura de angústia com sofrimento e nem sempre o paciente entende que o profissional não tem culpa da situação”, afirma Paulo Ayroza Ribeiro, chefe do departamento de ginecologia e Obstetrícia.
Em média, um kit de operação ginecológica custa R$ 1.000, mas há cirurgias de outras áreas que demandam pormaismateriais—equepoderão chegar a R$ 30 mil o kit.
Em princípio, a meta é fazer com que grandes empresas ou instituições aceitem “adotar” grandes lotes de cirurgias, que vão avançar para áreas comocardiologia, neurológica e ortopedia neste ano.
“É complexo fazer um kit cirúrgico porque são fornecedores diferentes para cada insumo e porque, por exemplo, para alguns materiais, como anestésicos, os lotes são grandes e não individualizados. Por isso, por enquanto, vamos oferecer a adoção de pacotes maiores de procedimentos e vamos aperfeiçoando isso com o tempo”, declara Eliana Garcia Fernandes Figueiredo, diretora de assistência farmacêutica do hospital.
A Santa Casa de São Paulo afirma que todo o processo de “adoção” será totalmente transparente, podendo o doador ter acesso a 100% de rastreabilidade dos insumos que decidiu patrocinar.
Para conseguir fôlego, a administração da instituição fi- lantrópica ainda tenta negociar uma carência para o pagamento do empréstimo no valor de R$ 360 milhões contraído com a Caixa Econômica Federal, em 2016.
Temos a estrutura, temos os profissionais, mas enfrentamos dificuldades de estar em dia com os pagamentos a fornecedores. A saída que encontramos foi o projeto de parcerias Paulo Motta da direção da Santa Casa