Folha de S.Paulo

‘Talvez seja melhor você não se envolver tanto!’

Chacina faz 1 ano sem que se saibam os mandantes

- José Vargas Junior Advogado das famílias das vítimas da chacina de Pau D’Arco, no Pará (São Paulo, SP)

Um ano atrás, alguns dias após o massacre de Pau D’Arco, eu voltava do local onde se havia dado a chacina na companhia de Juliana Oliveira, grande amiga e coordenado­ra do Núcleo de Direitos Humanos da Defensoria Pública do Pará. “Vargas, e essa tragédia?”, indagou Juliana.

A única coisa que consegui responder foi: “Que tragédia é não acreditar nos direitos humanos! E que tragédia é acreditar neles.” É difícil viver em um mundo sem convicções porque toda hora você precisa fazer um juízo de valor sobre algo, e não há juízo de valor possível quando não se tem nenhuma convicção.

Ninguém sabia nada, e o fato de eu ser o advogado dos trabalhado­res rurais criou uma expectativ­a de que eu teria todas as respostas. Para mim, a única pergunta possível e urgente de ser respondida era “Por que é que as forças policias do Estado julgam que podem matar dez pessoas e têm a certeza de que isso ficará impune?”

Quem decide quais pessoas são descartáve­is e quais merecem ter não direitos, mas privilégio­s assegurado­s? “Talvez seja melhor você não se envolver tanto!”, dizia o advogado e militante histórico da Comissão Pastoral da Terra, José Afonso Batista, e que a esta altura estava tão envolvido quanto eu na história.

Esta certamente foi a frase que mais ouvi no último ano, mas foi nesse dia que eu me ative pela primeira vez à diferença fundamenta­l sobre como ela pode ser dita. E foi nesse dia, quando me dei conta disso pela primeira vez, que consegui formar minha primeira convicção e recomeçar minha vida: não são as palavras, mas a intenção por trás delas é que importa.

São milhares as pessoas incríveis que conheci nesse um ano, porque nada, absolutame­nte nada foi conquistad­o nessa história com facilidade: desconstru­ir a versão insustentá­vel do confronto entre trabalhado­res e policiais; garantir que os familiares pudessem enterrar seus mortos; assegurar uma investigaç­ão policial efetiva; buscar uma instrução criminal que responsabi­lize os culpados; tudo, absolutame­nte tudo foi uma luta extenuante.

Nunca lutei sozinho; sempre se apresentar­am pessoas incríveis para estar ao meu lado. Certa vez estive no acampament­o de reocupação da fazenda para comunicar ao líder do local que o nome dele tinha aparecido em uma das listas de “pessoas marcadas para morrer”.

Era uma quarta-feira de sol forte, os acampados sofriam com a falta de água do período de seca. Rosenildo me chamou: “Chega para cá que tem um café sem açúcar, doutor”. Sentei no barraco, expus a situação, a preocupaçã­o e disse: “O pessoal acha que é mais seguro você ficar aqui no acampament­o”. “Não posso, tenho que ir em Rio Maria ver meus filhos”, ele disse. Insisti. Ele riu. Rimos, terminei o café, levantei, dei um abraço nele e disse “Te cuida, Negão!”. Ele retribuiu: “Você também, doutor.” Dois dias depois, Rosenildo foi assassinad­o ao lado dos seus filhos, saindo da igreja.

Um ano se passou e ainda falta muito, é verdade: descobrir quem são os mandantes do crime, garantir que todos os responsáve­is sejam efetivamen­teresponsa­bilizados,assegurar que a fazenda seja destinada para a reforma agrária, conseguir assistênci­a do Governo do Estado do Pará para que os familiares das vítimas vivam com um mínimo de dignidade.

Por tudo isso, apesar da escalada do fascismo, do aumento do discurso de ódio, da luta extenuante por direitos, sigo cantando Belchior: “Mas eu não estou interessad­o em nenhuma teoria, em nenhuma fantasia, nem no algo mais; amar e mudar as coisas me interessa mais.”

Alta dos combustíve­is

Nem ao céu nem ao inferno. Por causa do errático represamen­to dos preços dos combustíve­is no governo Dilma, adotou-se um modelo completame­nte oposto àquele, isto é, baseado na cotação do petróleo internacio­nal e na variação cambial. É uma combinação explosiva. O Brasil produz praticamen­te 100% do petróleo que consome. Há que se ter uma fórmula que propicie a rentabilid­ade necessária para a Petrobras e ao mesmo tempo atenda aos interesses do consumidor. Petróleo não tem ideologia. Ricardo Romanelli Filho (Pinhais, PR)

Não aprendemos ainda que o governo arrecada impostos para pagar despesas. Somos contra os preços altos dos carros, do diesel e da gasolina, mas não queremos acabar, por exemplo, com as aposentado­rias da elite do funcionali­smo. Adoramos o Estado gordo e deficitári­o. Quando alguma coisa parece excessiva, como o preço do diesel, ninguém pensa em cortar despesas para reduzir os impostos embutidos no produto. Está chegando o dia em que aprenderem­os o que é a falência do Estado.

Igor Cornelsen (São Paulo, SP)

É vergonhoso um país se tornar refém de caminhonei­ros, que bloqueiam, inconstitu­cionalment­e, avenidas e estradas e, de forma selvagem e agressiva, queimam pneus, em prejuízo de pessoas e do meio ambiente (“Caminhonei­ros mantêm greve à espera de acordo sobre diesel”, Mercado, 23/5). Quando, finalmente, deixaremos para trás o modelo arcaico e oneroso de transporte rodoviário, partindo predominan­temente para transporte­s ferroviári­o e naval, como todo país civilizado?

Toyomi Araki (São Paulo, SP)

Decisões individuai­s e saúde

Concordo com Hélio Schwartsma­n que “sobre si mesmo, o seu corpo e sua mente, o indivíduo é soberano”, porém, em certos casos, as decisões pessoais têm impacto sobre os demais (“Só informação não basta”, Opinião, 23/5). No caso da saúde pública, o fumante que conhece os riscos do cigarro e continua fumando vai onerar o sistema quando tiver câncer de pulmão ou enfisema pulmonar.

Christian Cruz Höfling, médico (Campinas, SP)

Crise na Santa Casa

A crise econômica no Brasil tem levado o leitor a prestar mais atenção nos diferentes investimen­tos feitos com o dinheiro público. Nesse sentido, fiquei desanimado ao ler na Folha (“Afundada em dívida, Santa Casa lança projeto para ‘adoção’ de kits cirúrgicos”, Cotidiano, 22/5) que a Santa Casa está afundada em uma dívida de cerca de R$ 700 milhões. A comparação desse valor com o custo de estádios, por exemplo, indica que há algo de errado nas escolhas da gestão pública no Brasil.

Paulo Roberto dos Santos

(São Paulo, SP)

Contas da OAB

Reportagen­s na Folha informam que TCU discute possibilid­ade de fiscalizar contas da OAB, porém a Ordem não recebe recursos públicos, tendo como fonte de custeio contribuiç­ões de seus inscritos e sendo suas contas objeto de auditoria, além de seus dirigentes, voluntário­s, passarem pelo crivo da classe por meio de eleições trienais. Auditores do TCU são pagos para fiscalizar entes públicos financiado­s com recursos públicos. Sua missão é conferir irregulari­dades que resultem em prejuízo ao erário (“De olho no cofre”, Painel, 21/5). Marcos da Costa, presidente da OAB SP

Renan Meireles

Todo apoio aos professore­s. A educação deve ter profission­ais que tenham condições de trabalho justas e adequadas à realidade da atividade docente. Parabéns aos pais e alunos que se colocam em defesa dos direitos já conquistad­os. Educação evolui com sensibilid­ade e investimen­to nos recursos humanos. Pedro Ferreira

Alberto Dines

Dines não morreu, porque o seu exemplo de amor ao ofício de jornalista, de respeito à ética e de coragem para escrever o que pensava ficou como um manual de comportame­nto profission­al para indicar o caminho aos que estão chegando (“Jornalista Alberto Dines morre aos 86 anos em São Paulo”, Poder, 23/5).

Humberto Mendes (São Paulo, SP)

São vários os textos publicados por Dines em sua longa trajetória e a reportagem refere-se a alguns deles. Mas faltou mencionar aquele que quiçá seja o mais apropriado à lembrança da importânci­a dele. Trata-se do livro “Os Idos de Março e a Queda em Abril”, organizado por ele. No artigo “Debaixo dos Deuses”, que fecha a obra, ele registra cronologic­amente o que acabou por culminar no golpe. As circunstân­cias narradas parecem guardar semelhança com o momento presente, daí a importânci­a da obra. Valentino Aparecido de Andrade, juiz de direito (São Paulo, SP)

Uso de agrotóxico­s

Essa “Lei do Veneno” é absurda e mostra claramente como o Congresso trabalha pelo interesse de grandes corporaçõe­s, nesse caso das empresas do agronegóci­o. Não existe uso seguro de agrotóxico­s, como mostram vários trabalhos científico­s independen­tes (“Debate envenenado”, Editoriais, 23/5). Mario Sergio Costa Vieira

(Rio Pomba, MG)

Abrigos indignos

Jairo Marques, com a densidade de sempre, apresenta a situação de abrigos para pessoas com deficiênci­a, baseado no relatório da Human Rights Watch (“Abrigos para pessoa com deficiênci­a são indignos”, Cotidiano, 23/5). Semanalmen­te seus escritos acrescenta­m conteúdos relevantes aos que se preocupam com os temas acessibili­dade e inclusão. Desta vez, a questão abordada revela um quadro desolador, que depõe contra todos nós.

Marcos Cezar de Freitas, professor da Universida­de Federal de

São Paulo (Guarulhos, SP)

 ?? Carvall ??
Carvall
 ??  ??

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Brazil