Folha de S.Paulo

Roma Encontro com o papa é ponto alto de peregrinaç­ão pela capital italiana

Multidão de turistas lota praça de São Pedro para ver Francisco em pessoa e de graça

- -Anna Virginia Balloussie­r

roma Quando alguém lhe oferece um Lamborghin­i customizad­o, que supera 300 km/h e tem valor de mercado estimado em US$ 200 mil (R$ 728 mil), como é que se diz?

Não, obrigado —as palavrinha­s mágicas esperadas se você for o papa Francisco, conhecido por adotar um estilo de vida menos luxuoso do que os antecessor­es. Exemplo: enquanto Francisco optou por sapatos mais surrados, Bento 16 carregava o apelido de Papa Prada, pelo mito de que seus calçados de couro vermelho pertenciam à grife.

Falso: eram feitos à mão por um sapateiro peruano, e rubros —como o de tantos detentores do cargo— para simbolizar o sangue dos mártires.

Pois em 2017 a marca italiana de carro presenteou o papa argentino com um modelo desenhado especialme­nte para ele, branco com detalhes dourados —as cores do Vaticano. O automóvel não saiu da garagem. Foi leiloado no último dia 12 por € 715 mil (cerca deR$ 3 milhões). O valor será usado em obras de caridade.

É por esse “papa povão” que vibram as caravanas internacio­nais de peregrinos, numa manhã de abril. Ele dá três voltas de Papamóvel (apelido dado aos carros papais), um modelo mais antigo mesmo.

Estamos na praça de São Pedro, em frente à Basílica de São Pedro, cartão-postal católico com quatro séculos de idade e os italianos Michelânge­lo e Rafael no time de arquitetos. Nas manhãs de quartasfei­ras, o pontífice comanda a chamada audiência papal — que não é uma missa, e sim um momento em que o líder da Igreja Católica discursa para as massas e concede uma bênção apostólica coletiva.

É a grande chance de ver o papa em pessoa —e de graça. Se é inverno ou o tempo está ruim, o encontro com Francisco ocorrerá num ambiente interno.

No verão e em parte da primavera (lembre-se que no hemisfério Norte essas estações vão de março a setembro), a audiência é na praça mesmo. E ela lota com peregrinos de todo o mundo —organizado­s tal qual caravanas para o programa do Silvio Santos, agitando gogós e bandeiras a cada menção a sua cidade.

No dia em que a Folha participou, teve um salve especial para turmas vindas de São José dos Campos (SP), Cascavel (PR) e Natal (RN).

O Papamóvel só entra em cena, claro, quando a audiência é a céu aberto. Seu passageiro beija crianças, dá tchauzinho, é enquadrado em centenas de selfies alheias.

Seria uma cena digna de político em campanha, se a estrela do dia não usasse uma batina com 33 botões (para representa­r a idade de Cristo). Fundada em 1798 e desde então a alfaiatari­a oficial dos papas, a casa Gammarelli não fica muito longe da praça São Pedro e tem uma famosa linha de meias ao alcance de qualquer um (€ 13, ou R$ 56).

Os pares vêm em cores temáticas para sua clientela preferenci­al, a religiosa: vermelhos (para cardeais), roxos (bispos) ou pretos (padres). Pontífices usam os brancos.

O tour automobilí­stico dura cerca de 20 minutos. Aí o Papamóvel para em frente à basílica, e seu principal ocupante salta sob escolta da Guarda Suíça Pontifícia. Esse exército papal era composto por mercenário­s quando foi criado, em 1506. Meio milênio depois, é atacado por flashes de turistas encantados com seu uniforme —parecem figuras de carta de baralho, com calça e blusa bufante, a estampa composta por largas listras verticais, amarelas e roxas.

No centro da praça há um toldo branco montado para Jorge Mario Bergoglio, rebatizado Francisco ao assumir o cargo renunciado, em 2013, pelo agora papa emérito Bento 16.

Às vezes com ajuda de tradutores, o pontífice discursa em várias línguas, em falas customizad­as para cada idioma. São eles: italiano, espanhol, português, inglês, alemão, francês, polonês e outros, a depender dos grupos visitantes.

Na quarta em que a Folha esteve na praça São Pedro, ele falou sobre uma “fé que não pode ser comprada” e criticou o fato de que há crianças que não sabem fazer direito o sinal da cruz —fazem rápido demais, ora essa, onde já se viu, os mais velhos precisam instrui-las melhor, disse.

“Francisco, I love you!”, esgoela-se uma peregrina protegida da fina garoa por um guarda-chuva com rostos de papas dos séculos 20 e 21 na estampa. Declaraçõe­s são ouvidas por todo lado. Turmas escolares são incentivad­as a duelar para ver quem grita mais alto pelo pontífice.

Atenção ao dresscode indicado no site papalaudie­nce. org. “Vestimenta­s casuais mas modestas são aceitas”, informa o texto. “As damas devem manter os ombros cobertos, sobretudo se as audiências forem realizadas em espaço fechado.” Para o verão na praça, um conselho: “Traga chapéu, filtro solar, água e se cubra o máximo que puder, para evitar queimadura­s de sol”.

 ?? Max Rossi - 16.mai.18/Reuters ?? Francisco acena para a multidão ao chegar à audiência papal na praça de São Pedro
Max Rossi - 16.mai.18/Reuters Francisco acena para a multidão ao chegar à audiência papal na praça de São Pedro
 ?? 1º.abr.18/ AFP ?? Papa Francisco se dirige ao público no domingo de Páscoa com a tradiciona­l mensagem “Urbi et Orbi” (“à cidade e ao mundo”), na Basílica de São Pedro
1º.abr.18/ AFP Papa Francisco se dirige ao público no domingo de Páscoa com a tradiciona­l mensagem “Urbi et Orbi” (“à cidade e ao mundo”), na Basílica de São Pedro

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