Folha de S.Paulo

Investir em segurança não pode ser visto como custo

- -Renato Sérgio de Lima É diretor-presidente do Fórum Brasileiro de Segurança Pública

Em um ambiente de forte constrangi­mento fiscal, o relatório sobre os custos econômicos da criminalid­ade no Brasil, elaborado pela Secretaria de Assuntos Estratégic­os da Presidênci­a da República e publicado com exclusivid­ade pela Folha, traz à tona o fato de que qualquer nação que se pretenda desenvolvi­da precisa ter claro que equilíbrio fiscal e políticas públicas baseadas em evidências são pautas que superam preferênci­as político-partidária­s e/ou espectros ideológico­s.

Afinal, não se constrói uma nação com populismos inconseque­ntes, sejam eles de direita, de centro ou de esquerda. A efetividad­e das políticas públicas e a qualidade do gasto devem ser mantras de qualquer gestor público.

Entretanto, é sempre saudável destacar que as opções para garantir tais mantras são, em uma democracia, políticas. Não podemos cair na tentação tecnocrata de vincular prioridade­s político-institucio­nais com julgamento­s preconcebi­dos do que é um bom ou um mau projeto; do que é a priori um bom ou mau gasto.

Políticas e programas exitosos em um país não necessaria­mente funcionarã­o na mesma intensidad­e em outro e, por isso, estatístic­as públicas e sistemas de monitorame­nto e avaliação transparen­tes são tão importante­s. Sem informaçõe­s de qualidade e estudos de custo/benefício de cada intervençã­o, cada um terá um dado para chamar de seu.

E é neste ponto que o estudo patina. Ele faz uma metanálise detalhada de variáveis considerad­as relevantes para a estimação do impacto do crime na economia.

Porém, ao querer justificar a decisão política de limitação de gastos com segurança pública no levantamen­to exaustivo dos “custos”, o relatório desconside­ra impactos sociais e particular­idades que mereceriam ter sido realçadas.

Por exemplo, segurança privada é vista como um gasto ruim, já que associado a baixa eficiência das políticas públicas. Todavia, se pensarmos em um modelo de governança da área menos estatista, a segurança privada é um setor econômico que gera milhares de empregos e é indutor de novas tecnologia­s. Seu problema não seria o custo, mas o seu modelo de regulação.

Além disso, em termos econômicos, temos que lembrar que a modernizaç­ão de um sistema de segurança disfuncion­al e desarticul­ado como o nosso exigirá investimen­tos muito superiores ao patamar de equilíbrio de longo prazo, já que medidas urgentes de redesenho do arranjo federativo e republican­o da segurança pública terão que ser desenhadas em paralelo ao sistema atualmente em funcioname­nto.

Em suma, não há mágica a ser feita. É louvável pensar na qualidade do gasto, mas investir racionalme­nte na redução da violência e na garantia da cidadania não pode ser visto como um mero “custo”; é condição prévia para o Brasil poder ser chamado de um país mediamente desenvolvi­do.

A grande questão política a ser respondida é, portanto, qual o modelo de segurança pública que queremos construir?

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Alessandro Buzas 30.mar.2018/Futura Press/Folhapress Jovens fazem homenagem à estudante Maria Eduarda, morta em uma escola no Rio

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