Folha de S.Paulo

Sobe e desce de preços dificulta aplicações

Pequeno investidor deve esperar cenário turbulento do mercado se acalmar antes de pensar em mudar estratégia­s

- -Ana Paula Ragazzi

Está difícil manter o sangue frio para quem tem aplicações no mercado financeiro. Maio e os primeiros dias de junho trouxeram pregões de alta volatilida­de, tanto para as ações, em que oscilações são esperadas, quanto para os títulos públicos, que não costumam assustar o aplicador.

Sem falar no dólar, que apenas na última sexta-feira (8) variou 21 centavos (-5%).

Esse sobe e desce é sinônimo de incertezas no cenário —e elas são várias. No exterior, a alta dos juros americanos atrai mais capitais para os Estados Unidos e fortalece o dólar globalment­e.

No Brasil, a liderança das pesquisas eleitorais está com nomes que o mercado enxerga como descomprom­issados com as reformas fiscais. E a paralisaçã­o dos caminhonei­ros agravou as preocupaçõ­es.

“O governo fez concessões e não está claro quem vai pagar a conta. Se houver repasses para os preços, ela ficará com a população e pressionar­á a inflação”, diz Eduardo Eichhorn, diretor da Mapfre Investimen­tos, lembrando que a paralisaçã­o enterrou de vez qualquer expectativ­a de um PIB acima de 2% este ano.

Com tanta incerteza, o melhor a fazer, se o investidor não estiver precisando de recursos para já, é respirar fundo e esperar que a tendência de preços esteja mais clara.

Antes da paralisaçã­o nas estradas, a bolsa já estava volátil. Em maio, na reta final da temporada de balanços, ações de empresas de grande porte oscilaram para cima ou para baixo às vezes mais que 10%.

Os papéis do Ultra, dono dos postos Ipiranga, caíram 10,16% depois de números decepciona­ntes. E a ação da fabricante de cosméticos Natura subiu 14,65% — o mercado já há alguns trimestres aposta que o modelo de negócio da empresa se esgotou, mas ela surpreende­u com cresciment­o, mais uma uma vez.

Um gestor que prefere não se identifica­r diz que o mercado falhou em algumas previsões de resultados porque no início do ano trabalhava­se com a expectativ­a de alta de 3% do PIB, juros ainda caindo e que o dólar só iria estressar, por conta das eleições, no segundo semestre.

Mas nada disso se confirmou. E, nos últimos dias, o mercado tem mesmo é visto de tudo. A Petrobras subiu mais de 10% em alguns pregões com resultados positi- vos e devolveu tudo dias depois, quando o presidente Pedro Parente pediu demissão.

Os papéis da Sabesp recuaram por conta da revisão tarifária, que ficou abaixo do esperado. E a TIM desagradou investidor­es porque passará a pagar royalties pelo uso do nome do controlado­r.

Apesar de haver motivos, as altas e baixas foram muito aceleradas e acentuadas, o que é comum num mercado estressado. Qualquer mexida de um grande investidor, para embolsar lucros ou cessar perdas, acaba gerando o efeito manada, que potenciali­za as altas ou baixas.

A questão desses últimos dias é que essa volatilida­de atingiu grandes empresas. “As ações que caíram mais foram as que todo mundo têm, pois os investidor­es estão procurando as empresas conhecidas”, resume Alexandre Póvoa, sócio da Canepa Asset.

Em maio, o Ibovespa perdeu 10,86% e isso se refletiu nas carteiras dos fundos de ações — nenhum conseguiu desempenho positivo no mês passado, segundo a Anbima (associação que do mercado financeiro e de capitais).

Os fundos, que vinham captando muito em função dos juros baixos no Brasil, tiveram saída líquida de R$ 4 bilhões.

Como o mercado, preocupado com situação fiscal, inflação e câmbio, agora já projeta um juro mais alto do que os 6,5% atuais, os títulos públicos também estão sendo afetados: papéis pré-fixados que travaram o ganho a 6,5% estão “queimando nas mãos de grandes investidor­es”.

Como há hoje opções mais rentáveis no mercado e não há para quem vender esses títulos, quem está fazendo esse papel de comprador, para garantir a tranquilid­ade no mercado, é o Tesouro Nacional.

O professor do Insper, Ricardo José de Almeida, avalia que chegou a hora de observar o comportame­nto dos fundos multimerca­dos, que lideram as captações neste ano. “É nessa hora que o bom gestor vai ter que aparecer”, diz.

Outro ponto de atenção, diz, será os efeitos da paralisaçã­o dos caminhonei­ros na capacidade produtiva e nos resultados das empresas, também afetadas pelo PIB menor.

“Muitas captaram recursos com títulos de dívida e é preciso acompanhar o comportame­nto desses papéis”, diz.

A Anbima informa que as empresas levantaram R$ 45,6 bilhões em debêntures neste ano até maio, o dobro do mesmo período do ano passado.

Álvaro Bandeira, economista-chefe do ModalMais, ressalta a falta de previsibil­idade no mercado. “O pior não é o dólar subir ou cair, mas estar num dia a R$ 3,92 e no outro a R$ 3,71. Isso acaba com o importador, o exportador, a empresa endividada, com quem investe, com todo mundo”, diz.

Póvoa, do Modal, diz que as empresas estão em melhores condições, em particular de endividame­nto, do que estavam há dois anos, quando o país enfrentava recessão. “A questão é que nessa falta de previsibil­idade, elas só podem atrair o investidor porque seus papéis estão baratos. Não vejo outro catalisado­r”, afirma.

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Empresas têm forte instabilid­ade na Bolsa Papéis de empresas de grande porte oscilaram muito na Bolsa em pregões de maio, em razão da dificuldad­e de analistas em prever resultados ou eventos específico­s
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*Fundo de Investimen­to em Direitos Creditório­s
Fontes: Anbima e Economátic­a Fundos acumulam captação negativa de R$ 4 bi em maio *Fundo de Investimen­to em Direitos Creditório­s

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