Conchavo de elite
Sobre novo teto salarial do funcionalismo paulista.
Enquanto o país enfrentava os transtornos provocados pela paralisação dos caminhoneiros, as corporações do serviço público tratavam com diligência de seus interesses. No estado e na capital de São Paulo, o funcionalismo conquistou novos e descabidos privilégios.
A Assembleia Legislativa aprovou em segundo turno uma emenda constitucional que eleva o teto de vencimentos dos servidores paulistas de R$ 21 mil para R$ 30 mil. Em vez do salário do governador, equipara-se o vencimento máximo ao dos desembargadores estaduais.
Calcula-se que o impacto da medida vá ser crescente, atingindo quase R$ 1 bilhão anual a partir do quarto ano de vigência. Beneficiase uma elite de 5.000 funcionários, de um total de 700 mil.
Dos 72 parlamentares presentes na votação, 67 foram favoráveis, numa mostra de amplo apoio partidário que abarcou também o PSDB —13 de seus 19 deputados votaram pelo aumento.
A votação da proposta estava travada desde o ano passado, por objeção do governo estadual. Desde que Marcio França (PSB) assumiu o Bandeirantes, contudo, as barreiras foram caindo. A votação em primeiro turno ocorreu em abril, mês da troca de guarda.
O outro caso nefasto foi a aprovação pela Câmara Municipal paulistana, por 32 votos a 8, de um generoso pacote de benefícios, ao custo de R$ 44 milhões ao ano.
São auxílios para alimentação (de R$ 573 mensais, em adição aos R$ 48 diários já pagos) e saúde (até R$ 1.079 mensais), além de bônus de até R$ 16 mil para os funcionários mais bem pagos.
O episódio se revestiu de aspectos ainda mais reprováveis quando vários parlamentares, alarmados pela repercussão negativa, declararam ter votado sem saber do que se tratava. Segundo o vereador Caio Miranda (PSB), crítico do projeto, essa prática faria parte da “cultura legislativa”.
Sabe-se que a ação predatória do corporativismo tem mais chance de sucesso em anos de eleição, quando os políticos buscam distribuir benesses mais visíveis.
Mais espantoso, contudo, é considerar que favorecer os setores mais privilegiados do funcionalismo possa se confundir com uma agenda verdadeiramente popular.