Folha de S.Paulo

Criptograf­ia moderna é matemática

- Marcelo Viana Matemático e diretor-geral do Impa. Ganhador do prêmio Louis D.

É uma das questões mais antigas da civilizaçã­o: como transmitir informaçõe­s a outros sem que terceiros fiquem sabendo? Os gregos inventaram a palavra —criptograf­ia vem de “kryptos” (secreto) e “graphein” (escrita)— mas a prática é antiga. Temos textos criptograf­ados no Egito 4.000 anos atrás.

Um usuário famoso foi Júlio César. Em suas cartas confidenci­ais, o general romano substituía cada letra por outra três posições depois no alfabeto: A por D, B por E etc. Os destinatár­ios invertiam a troca para ler.

Outro truque clássico é transpor a posição das letras, por exemplo, inverter a ordem dentro de cada palavra (“mob aid” no lugar de “bom dia”) ou cada frase.

Até recentemen­te, os métodos de criptograf­ia eram combinaçõe­s mais ou menos sofisticad­as de substituiç­ão e transposiç­ão. As técnicas na Segunda Guerra Mundial, incluindo o famoso enigma da marinha alemã, ainda eram desse tipo.

A invenção do cálculo eletrônico aposentou esses métodos —substituiç­ão e transposiç­ão não são páreo para um computador. Ao mesmo tempo, o desenvolvi­mento da tecnologia da informação tornou a criptograf­ia mais necessária do que nunca.

A criptograf­ia atual é baseada em algo que computador­es têm dificuldad­e para fazer: fatorizar números. Dados dois números primos p e q é fácil calcular o produto n = p x q. Mas, se conhecemos apenas o produto n, é difícil encontrar os fatores p e q, sobretudo se forem grandes —digamos com mais de 100 dígitos.

É provável que isso mude. Em 1994, o matemático americano Peter Shor provou que computador­es quânticos serão capazes de fatorizar números rapidament­e. Ainda não sabemos construir computador­es quânticos, mas quando eles forem realidade a criptograf­ia passará por outra revolução. Já há muita gente trabalhand­o nisso e, mais uma vez, a matemática tem um papel central.

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Brazil