Folha de S.Paulo

Voluntaris­mo dos EUA sugere a ditadores que bomba é bom negócio

- Hélio Schwartsma­n helio@uol.com.br

são paulo Para um país normal, isto é, inserido na comunidade internacio­nal e sem contencios­os existencia­is com seus vizinhos, manter um arsenal nuclear é mau negócio. Custa caro e costuma trazer mais ônus políticos do que benefícios.

Não é coincidênc­ia que nações tecnologic­amente desenvolvi­das, como o Japão e a Alemanha, não tenham, no pós-guerra, buscado obter esse tipo de armamento. Há até casos de países que já tiveram bombas, mas optaram por abrir mão delas, como o fizeram a África do Sul e algumas repúblicas da antiga URSS.

O problema é que nem todos os países são normais. Há situações em que o domínio da tecnologia nuclear bélica se mostra vantajoso. É o caso da Coreia do Norte. Não fosse por suas bombas, ela seria apenas mais um Estado falido. Nada a distinguir­ia de outras ditaduras do planeta, boas em violar os direitos humanos de seus cidadãos, mas incapazes até de alimentá-los.

É só porque conseguiu desenvolve­r um programa nuclear completo que Kim Jong-un acaba de encontrar-se numa reunião de cúpula com o presidente dos EUA, o que de algum modo legitima seu regime tirânico. Pior, ele arrancou de Donald Trump, que parece estar mais preocupado em posar de estadista do que em abordar problemas de forma consistent­e, um acordo vago, muito parecido com outros acertos que Pyongyang já descumpriu no passado. Kim ganha assim tempo e alguma segurança de que seu país não sofrerá ataques nem nova rodada de sanções.

Não afirmo que o problema da nucleariza­ção da Coreia do Norte seja fácil de resolver, se é que tem uma solução. O ponto é que a forma voluntaris­ta com que Trump lidou com a situação transmite a ditadores a mensagem de que desenvolve­r bombas atômicas é um bom negócio. É um jeito rápido de erguer nações fracassada­s à condição de pares dos EUA —e sem necessidad­e de respeitar direitos humanos, promover abertura etc.

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