Inverno atrasa, e pernilongos avançam pela zona oeste de SP
Prefeitura diz que não recebeu mais queixas que em 2017, mas que morte de peixes em córrego pode ter contribuído
Nem a raquete sobreviveu. A matança de pernilongos fora de época, em pleno inverno, na casa do advogado Marcelo Campagnolo, 52, tem sido feita com as mãos mesmo. “Digo para meus filhos que sou ninja, consigo matar os pernilongos no ar.”
Tamanha habilidade tem sido praticada com mais intensidade há pelo menos duas semanas, desde que seu bairro, Alto de Pinheiros, na zona oeste de São Paulo, e entorno têm sofrido com uma infestação de pernilongos.
“Cheguei a matar 20 deles em uma noite”, diz o advogado, que passou a dormir debaixo do vento do ar condicionado na estação mais fria do ano para manter o zumbido e as picadas longe durante a noite.
A proximidade da residência com o rio Pinheiros ajuda na maior incidência dos insetos hematófagos (que se alimentam de sangue), já que suas águas são usadas como criadouros, mas o atraso da chegada do frio neste ano tem determinado a infestação, mais comum em épocas quentes.
A Prefeitura de São Paulo afirmou que não registrou aumento de pernilongos recentemente nas margens do rio Pinheiros e que determina ações químicas para combate ao inseto de acordo com a demanda dos moradores.
A administração informou que recebeu neste ano 1.200 solicitações a respeito de infestações de mosquitos e pernilongos em toda cidade, a metade do registrado no mesmo período no ano anterior.
Desde o início do inverno, há uma semana, a capital paulista tem registrado temperaturas máximas diárias perto dos 30ºC, o que é incomum para esta época do ano.
O entomologista urbano André Luís Fernandes explica que a temperatura do ambiente determina a velocidade de reprodução dos insetos: quanto mais quente, mais rápido o ciclo que transforma o ovo em adulto. Portanto, a reprodução não é interrompida no inverno, apenas se torna mais lenta.
A lógica, porém, se inverte quando o inverno tem mais cara de primavera, como tem acontecido. “Na época de outono e inverno, as superfícies dos canos onde o ‘culex quinquefasciatus’ [nome científico do pernilongo] coloca seus ovos, por exemplo, ficam mais frias, e isso produz mosquitos mais letárgicos e lentos”, diz.
Além do veranico neste início de inverno em São Paulo, há outra explicação para a infestação de pernilongos em bairros da zona oeste, como Vila Leopoldina, Pinheiros e Vila Madalena.
Agentes da vigilância ambiental da prefeitura identificaram um foco de criação de larvas de pernilongo na praça Dolores Ibarruri, conhecida como praça das Corujas, no Sumarezinho, famosa depois que passou a abrigar uma horta orgânica comunitária cuidada pela vizinhança.
Moradores afirmam que os peixes que habitavam o córrego e mantinham as larvas sob controle não foram mais vistos desde que uma obra próxima passou a dispensar de forma irregular produtos químicos nas águas por meio de um cano clandestino, matando, portanto, os predadores naturais do pernilongo na região.
A prefeitura disse que as reclamações dos moradores a fizeram intensificar o monitoramento de larvas de mosquitos nos córregos do entorno e que irá vistoriar o descarte de materiais na obra em questão. Está prevista para esta semana a aplicação de um tratamento químico no córrego das Corujas na tentativa de conter a proliferação de pernilongos no bairro.
No caso, a ação significa espalhar larvicidas biológicos nas águas dos córregos para conter a eclosão dos ovos. Por se tratar de um material biológico, bactérias que infectam as células embrionárias e as impedem de evoluir, é possível que sua eficácia seja afetada pela poluição das águas, o que poderia explicar a costumeira infestação de pernilongos em bairros no entorno do rio Pinheiros e seus afluentes.
“Mesmo assim, é a alternativa menor nociva ao meio ambiente”, diz Fernandes.