Folha de S.Paulo

Alemanha repete fiasco de últimas campeãs

Atual vencedora da Copa caiu na fase de grupos pela 1ª vez e interrompe­u sequência de boas campanhas desde 2006

- -Eduardo Geraque

O roteiro da eliminação alemã começou a ser escrito antes da derrota por 2 a 0 para a Coreia do Sul, nesta quarta-feira (27). Ao ignorar as causas do mau futebol apresentad­o nos jogos anteriores e insistir no esquema que não deu certo desde o começo da Copa, o técnico campeão do mundo Joachim Löw passou a flertar com a tragédia.

Nomes que deram certo nos últimos anos, como Khedira, Özil e Thomas Müller, não chegaram nem perto do desempenho esperado. Por insistênci­a do técnico, porém, foram mantidos até o fim. Eram considerad­os fundamenta­is para o time voltar a jogar como no passado recente.

A Alemanha foi à Rússia com status de favorita. Desde 2006 com Löw no comando, chegou pelos menos entre os quatro primeiros em seis torneios, contando Mundiais e Eurocopas. Nas eliminatór­ias europeias, foram dez vitórias em dez jogos, fato inédito para o futebol alemão.

Em 21 edições de Copa do Mundo, ela chegou entre os quatro 13 vezes, um recorde. Mas 2018 não era 2014, e os problemas para os atuais campeões começaram cedo.

Amistosos contra a Áustria e a Arábia Saudita mostraram uma equipe lenta, sem criação e com pouco poder ofensivo, diferente do time de garotos que ganhou a Copa das Confederaç­ões em 2017.

Löw poderia ter mudado o curso da preparação, mas preferiu seguir firme com suas ideias. Recebeu críticas, por exemplo, por descartar o meia-atacante Leroy Sané, 22, do Manchester City (ING).

Logo na estreia, contra o México, os alemães tiveram um duro encontro com a realidade. Muita posse de bola (60%) e passes completos (524), mas nenhuma efetividad­e. O setor ofensivo finalizou contra o gol mexicano só no fim do jogo, quando tentava empatar de qualquer forma.

Até um problema novo surgiu. A linha de zagueiros, desprotegi­da, foi presa fácil para os contra-ataques. O setor de defesa do meio-campo, com Khedira e Kroos, também passou a perder demais a bola.

Mas nada parecia incomodar Löw. As saídas de Özil e Khedira contra a Suécia deixaram o futebol da Alemanha mais fluído. Mas mesmo a vitória no último minuto, com o time jogando um pouco melhor, não serviu para mudar a estratégia do técnico.

“Quando estávamos no centro de treinament­o, treinamos muito bem. Os dois jogos antes da Copa do Mundo não foram bons. Tentamos ajustar algumas coisas, mas não funcionou. Contra o México, se tivéssemos marcado um ponto, tudo teria sido diferente”, disse o treinador alemão.

Contra a Coreia do Sul, os veteranos voltaram, e os indicadore­s pioraram. No estádio, a sensação era que a Alemanha estava disputando um amistoso sem importânci­a. E parecia achar que ganharia a qualquer momento.

O final do jogo contribui para o roteiro do drama alemão. O primeiro gol, já nos acréscimos, foi marcado após consulta ao vídeo descartar impediment­o na jogada.

No segundo, até o goleiro Neuer estava no campo de ataque. O gol ficou livre para Son, destaque da Coreia, finalizar.

“Não merecíamos passar para as oitavas”, admitiu Löw. Como consequênc­ia, um dos maiores vexames do poderoso futebol alemão está agora escrito na história dos Mundiais.

As derrotas contra Coreia do Sul e México e os três pontos diante da Suécia deixaram os alemães com a última colocação do Grupo F.

A quarta posição vem carregada de simbolismo­s. Nunca a Alemanha havia caído na fase de grupos de uma Copa. Algo parecido só ocorreu em 1938, quando o Mundial já começava com partidas eliminatór­ias.

Com a eliminação precoce e muitas perguntas ainda sem respostas, o sonho de Löw de ser bicampeão do mundo como treinador ruiu.

Até hoje, apenas um outro europeu, o italiano Vittorio Pozzo, bicampeão com a Itália nas Copas do Mundo de 1934 e 1938, conseguiu tal feito.

Löw pode até comandar a Alemanha em outra Copa, porque tem contrato até 2022 —o que não o impede sua saída nos próximos dias—, mas dois títulos seguidos já não conseguirá mais.

“Não acho que sejam tempos negros para o futebol alemão”, afirmou após a eliminação. “Somos o time mais constante em termos de performanc­e. Nos últimos 12 anos, sempre estivemos entre os primeiros. Claro que a eliminação gera uma decepção, mas temos jovens jogadores muito talentosos. Isso já ocorreu com outros países antes. Temos que tirar as conclusões certas e jogar melhor daqui para a frente”, afirmou.

Talvez o técnico pudesse ter aceitado a ideia de colocar mais jovens jogadores na primeira fase da Copa do Mundo, assim como fizera na Copa das Confederaç­ões. No ano passado, os alemães ficaram com o título do torneio.

Mas, assim como parece ter virado uma tradição os últimos campeões mundiais caírem na primeira fase das Copas seguintes, vencer a Copa das Confederaç­ões também parece fazer com que os treinadore­s fiquem mais arraigados às suas ideias.

 ?? Benjamin Cremel/AFP ?? O meio-campista Toni Kroos ao fim do jogo contra a Coreia do Sul, que definiu a desclassif­icação da Alemanha na Copa do Mundo
Benjamin Cremel/AFP O meio-campista Toni Kroos ao fim do jogo contra a Coreia do Sul, que definiu a desclassif­icação da Alemanha na Copa do Mundo
 ?? Fotos Jewel Samad/AFP ?? À esq., Özil lamenta chance perdida pela Alemanha durante a partida; à dir., Kim Young-gwon celebra gol da Coreia do Sul, validado pelo VAR
Fotos Jewel Samad/AFP À esq., Özil lamenta chance perdida pela Alemanha durante a partida; à dir., Kim Young-gwon celebra gol da Coreia do Sul, validado pelo VAR
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