Folha de S.Paulo

Aprender e ensinar

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Ruy Castro

Leio nos jornais que só 2,4% dos jovens brasileiro­s pensam em se tornar professore­s. Há dez anos, segundo reportagem de Isabela Palhares no jornal O Estado de S. Paulo, essa percentage­m ainda era de 7,5%. Os dados são da OCDE (Organizaçã­o para a Cooperação e Desenvolvi­mento Econômico). A se manter essa regressão, dentro de mais dez anos teremos de importar professore­s para nossas crianças.

Os motivos para tal desinteres­se são conhecidos. Ser professor, em certas áreas das cidades, equivale hoje à possibilid­ade de, a qualquer momento, apanhar na cara. Não há respeito por parte da classe. Alunos dominam a sala, ignoram a presença do mestre, passam a aula ao celular e, se forem do ensino privado, sabem que têm imunidades junto à diretoria —esta nunca correrá o risco de perder uma matrícula. Outros motivos para o desinteres­se pela profissão são os baixos salários e a falta de reconhecim­ento social.

O piso fixado pelo MEC para pro- fessores que dão 40 horas semanais é de R$ 2.455,35 e, segundo outra reportagem, de Paula Ferreira, no jornal O Globo, há colégios da rede privada que não pagam nem esse mínimo obrigatóri­o. Quarenta horas semanais equivalem a oito horas por dia durante cinco dias da semana. Se somarmos a elas o tempo gasto na preparação das aulas e na correção de provas e trabalhos, não sobra muito tempo para que um professor consiga complement­ar o salário. Com que dinheiro comprará livros e se dedicará ele próprio a aprender?

Quanto ao reconhecim­ento, foi-se o tempo em que a nobreza da profissão era valorizada. Hoje, os primeiros a desencoraj­ar os jovens a lecionar são os próprios professore­s. Se o professor é o profission­al com quem o estudante tem mais contato e, se escuta dele essa opinião tão negativa, é claro que buscará outra carreira.

E eu que, inocente, sempre achei que só havia uma coisa mais bonita que aprender —ensinar.

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