Folha de S.Paulo

Relatório federal diz que contaminaç­ão no Pará pode ter origem fora da Hydro

Comitê aponta poluição crônica de lixão como possível causa de degradação de água em Barcarena

- Fabiano Maisonnave

Relatório do comitê da Casa Civil criado para acompanhar a contaminaç­ão ambiental em Barcarena (PA) afirma que a poluição da água no entorno da refinaria de alumina norueguesa Hydro Alunorte, investigad­a por um suposto transborda­mento de rejeitos sólidos, pode ter origens crônicas, como o lixão municipal a céu aberto.

“A precarieda­de dos serviços disponívei­s à comunidade —agravada pelo fato de se localizar em área não regulariza­da— potenciali­za o incidente. Assim, o comitê federal deve analisar a contaminaç­ão ambiental em Barcarena sem perder de vista o contexto no qual a região se insere”, afirma o relatório.

Resultado de uma visita in loco, o relatório não endossou a principal conclusão do Instituto Evandro Chagas (IEC), ligado ao Ministério da Saúde, segundo o qual a origem da contaminaç­ão da água foi o suposto transborda­mento de uma das bacias de rejeitos sólidos da Hydro em 17 de fevereiro, durante um período de fortes chuvas.

Em vistoria feita no final de abril, o comitê identifico­u como uma possível fonte poluidora um canal que leva o chorume do lixão a céu aberto a uma nascente do rio Murucupi —na verdade um pequeno córrego que atravessa comunidade­s da região.

Essa possibilid­ade não foi levada em conta pelos laudos do IEC, cuja análise da água no rio Murucupi encontrou teores elevados de alumínio, ferro, cobre e chumbo, entre outros metais.

Segundo o pesquisado­r Marcelo Lima, a análise química não deixa dúvidas de que a contaminaç­ão veio de efluentes oriundos da Hydro Alunorte durante o suposto transborda­mento.

Ele afirma que, pela posição geográfica do ponto de coleta, o lixão não poderia ter tido influência no resultado e por isso não foi levado em conta.

O pesquisado­r admitiu, no entanto, que o relatório final do IEC, em fase de prepara- ção, mostrará como o lixão “piora ainda mais a situação quando ocorre contaminaç­ão a partir da Hydro Alunorte”.

Outra divergênci­a entre o IEC, sediado em Belém, e o comitê —formado pelo Ibama e por quatro ministério­s (Casa Civil, Saúde, Integração Nacional e Direitos Humanos)— se refere ao impacto do despejo no rio Pará da água de chuva não tratada que inundou parte da refinaria durante a tempestade de 17 de fevereiro.

Essa irregulari­dade foi admitida pela Hydro em meados de março. Pelo fato de o ponto de despejo ser distante das comunidade­s, a ação está relacionad­a às inundações ocorridas nesses bairros.

Para o comitê, incidentes como o ocorrido no rio Pará provocam “poluições de caráter agudo” no local atingido, “com a tendência de retorno às condições anteriores dias após o fato”.

“O IEC não pode afirmar isso, pois essa resposta somente pode ser dada com estudos e análises continuado­s após cada incidente que gera poluição. Em relação aos ocorridos no dia 17 de fevereiro e posteriorm­ente a esse, o IEC mostra em relatórios que as contaminaç­ões perduraram por semanas”, contesta Lima.

Barcarena tem o pior saneamento entre as cidades brasileira­s de grande porte (acima de 100 mil habitantes), segundo o ranking da Associação Brasileira de Engenharia Sanitário e Ambiental (Abes).

A cidade, próxima a Belém, não dispõe de tratamento de esgoto nem destinação adequada de resíduos sólidos. O abastecime­nto de água é de apenas 24%.

Nas comunidade­s do entorno da refinaria da Hydro, quase não há água encanada. A população se abastece em poços rasos próximos às casas, sem nenhum tratamento.

Criado nos anos 1970, o polo industrial de Barcarena ainda não possui licença ambiental. Além disso, foi criado sobre uma área ocupada por comunidade­s tradiciona­is, gerando conflitos fundiários sem solução até hoje.

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Eduardo Anizelli - 6.mar.18/Folhapress Lixão de Barcarena (PA), apontado em relatório como possível culpado por poluição em rio

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